Milena – Gênesis (Capítulo X - O Internato)

Quando minha mãe chegou, eu não sabia como explicar o estado do meu quarto, e tanto sangue pelo corredor e escada. Mesmo com Erick brigando comigo, resolvi contar a verdade, tentei explicar a ela toda a história, desde o começo, quando conheci Milena, até quando aceitei participar do jogo de um demônio para salvar meu irmão.

Ela simplesmente enlouqueceu, falava que eu não iria me livrar de minhas responsabilidades com mentiras, fiquei semanas dizendo a verdade, mas ela não acreditava.

- Se arruma Rogério, vou te levar no hospital - dizia ela entrando no meu quarto - Quero meu filho de volta, acho que você esta enlouquecendo.

- Mamãe, pela milésima vez, eu não estou enlouquecendo, tenho o livro de Mazus pra provar para a senhora e...

- Livro de Mazus? - disse ela parando - O irmão da sua avó se matou graças a esse livro, ele ficou tão louco que dizia que tinha monstros o perseguindo, então ele se afogou no rio.

- Ele se afogou? - perguntei - Se ele se afogou, ele não se matou.

- Tanto faz, não quero que meu filho tenha este fim, agora toma banho que estou te esperando lá em baixo.

Fui pro banheiro, eu estava muito cansado, mas não era cansaço físico, e sim um cansaço psicológico e emocional.

- Sei como a fazer acreditar em você Benjo - disse Milena entrando no box do banheiro.

- Como?

- Se eu aparecer pra ela, ela vai acreditar... É o único jeito.

- Você consegue fazer isso?

- Nunca tentei, mas até onde eu sei, exige muito esforço.

- Obrigado Mi, agora cai fora porque preciso tomar banho.

- Que tem ai que eu já não tenha visto Benjo? - disse ela sorrindo.

- Milena some daqui - disse gritando.

- Ok, Vou lá ver o Jhol, nos encontramos quando você tiver saindo.

Esperei ela sair e sentei no chão do banheiro, com a água caindo sobre meu corpo.

Eu estava completamente encrencado, e não sabia o que fazer, não devia ter dito nada a minha mãe, mas como iria explicar a destruição do meu quarto?

No carro a caminho do consultório médico Milena tentava fazer de tudo para chamar a atenção de mamãe, derrubava coisas, tocava em sua pele, dando calafrios, mas nada funcionava; para tudo mamãe dava uma explicação totalmente cabível.

Entramos no consultório, que era enorme, a secretária nos mandou sentar que logo o doutor Gustavo iria nos atender.

- Rogério Henrique? - chamou o médico psiquiatra, mamãe se levantou para entrar comigo - Mãe, espere aqui um segundo, preciso falar com o paciente sozinho - Ela ficou decepcionada, mas entendeu - Deite-se, por favor - disse ele apontando para uma espécie de sofá que havia no consultório, me deitei como foi mandado, ele pegou uma prancheta com alguns blocos de papel e começou a escrever me olhando por cima dos óculos - Seu nome?

- Rogério Henrique dos Santos.

- Idade.

- Quinze.

- Tem irmãos?

- Sim, Dois.

- Moram com você?

- Sim, moramos em sete pessoas em casa.

- Me diga o nome das sete pessoas.

- Sandra, Rogério, Luís, Luana, Ane, Jhonatan e Milena.

- Sua mãe me contou que moram apenas seis pessoas na sua casa, quem é Ane?

- Ane é minha prima, Luís e Luana sãos meus irmãos, Jhonatan é meu primo, pra que essas perguntas idiotas que não vai nos levar a lugar algum?

- Milena?

- Milena é uma amiga.

- É a menina morta?

- Sim, ela esta morta, já disse um milhão de vezes - aquele papo estava realmente me irritando, estava a ponto de demonstrar o meu lado Bonbenjo - Se não for muito incomodo eu quero ir para casa.

- Sinto lhe informar, que preciso falar com sua mãe antes, por favor, espere lá fora.

Ele me levou de volta para a sala de espera, e minha mãe entrou no consultório.

- Como foi? - disse Milena colocando sua mão em meu rosto que estava abaixado.

- Eu acho que piorei tudo - disse sentindo um aperto no coração - Porque é tão difícil as pessoas acreditar em mim?

- As pessoas só acreditam em coisas que podem ver e tocar - disse Milena.

- E Deus? - disse bravo - Não podemos tocar nem ver, mas sabemos que esta aqui.

Mamãe saiu do consultório com uma cara de quem iria chorar a qualquer momento, ela fez sinal para irmos embora. Quando chegamos a casa, ela entrou no meu quarto e começou a tirar minha roupa do guarda-roupa, sentei na cama e fiquei observando.

- O que está fazendo mamãe? - perguntou Luís entrando no quarto.

- Seu irmão vai viajar por uns tempos - disse ela se sentando ao meu lado - Benjo - dizia ela passando as mãos em minhas costas - Me perdoa filho, prometo que vai ser só por um tempo, vai lhe fazer bem ficar longe desta casa, você sofreu muito aqui, o abandono de seu pai, a perda do Alison, a morte da Aline... - me levantei e desci as escadas pisando pesado, meu coração estava muito apertado - sinto muito - ouvi-a dizendo.

Se passaram algumas horas, estavam todos na sala, inclusive Erick, todos me olhavam com cara de velório.

- Pessoal, eu não morri - disse sorrindo, não queria que ninguém sofresse por mim.

- Maninho, não quero ficar longe de você - disse Lua me abraçando.

- Veja pelo lado bom, vocês vão ficar com meu vídeo game e meus jogos, que não foram destruídos, pra vocês - completei.

- Não tenta tornar mais fácil primo - disse Jhonatan chegando perto - Vou te visitar todo fim de semana.

- Vou ficar de olho em você - disse Erick.

Mamãe desceu com minhas malas, Luís estava a ajudando, colocou no carro e disse:

- Já se despediram?

- Não quero despedida - estava com tremenda raiva de minha mãe, eu era seu filho mais velho, ela devia acreditar em mim, sabia que era difícil acreditar em coisas assim, mas afinal, nunca havia mentido pra ela.

A Viajem demorou muito, era longe da cidade, longe de tudo...

Quando estávamos chegando avistei o nome do lugar aonde ela iria me internar:

Instituto Salvatoriano Católico.

- Um seminário? - disse encarando mamãe.

- Sim, o reitor é meu amigo, e vai cuidar bem de você.

- Quem esta louca é a senhora mamãe... - disse me virando para o lado.

A casa era muito linda, parecia um palácio, rodeada por árvores e plantações, muito verde e uma fonte enorme no pátio.

- Que lugar lindo Benjo - me assustei com Milena.

- Mi! Você veio - disse sussurrando.

- Não, eu estou lá em casa, não esta vendo?

- Engraçadinha - Na fonte havia um homem de colarinho branco e ao seu redor sete meninos, que ficavam me encarando.

- Benção, padre Itamar - Disse mamãe beijando a mão do padre - Este é meu filho Rogério - disse me empurrando para frente.

O padre ia pegar na minha mão, mas me afastei, então ele colocou a mão em minha cabeça e sussurrou algo que não havia entendido.

- Me deixe apresentá-los - disse o padre - Estes são os seminaristas desse ano, Cézar, Leonardo, Leandro, Lucas, Bruno, Roberto e Toninho - Toninho era o mais velho da turma, os outros todos eram mais ou menos da minha idade - Leo, pode levar o garoto Rogério para o quarto?

- Bonbenjo - disse resmungando.

- Como? - perguntou o padre.

- Eu me chamo Bonbenjo, é assim que todos me chamam, e quero que me chamem assim também.

Os meninos riram e se dispersou, cada um foi para um lado, não estava gostando nada daquilo.

No quarto Leo colocou minhas malas ao lado da cama e se sentou; o quarto não era grande, mas era uma suíte com banheira.

- Sou Leonardo - disse ele.

- Estou sabendo - resmunguei.

- Você esta aqui contra a vontade não é? Da pra perceber só de olhar para você, que foi que aprontou pra sua mãe te jogar aqui?

- Eu não fiz nada...

- Se você diz, acredito em você... - ele se levantou e ia saindo quando olhou de volta para mim e disse - Quem é esta garota ai? Sabe que aqui não é permitida a entrada de garotas não é?

- Que? - disse arregalando os olhos, Leonardo estava vendo Milena.

- Bom, a manda voltar com sua mãe, vou para a cozinha, se precisar de mim estou por lá.

- Então qual é o plano? - disse Milena se sentando ao me lado.

- Não tem Plano - disse emburrado.

- Então vai ficar aqui sentado de braços cruzados? Sério Benjo, você tem o coração puro, gosto muito de você, mas esta na hora de deixar de ser ingênuo.

- Está bom - disse zangado - Que você quer que eu faça? Coloque fogo na capela pra me expulsarem?

- Boa ideia - disse ela sorrindo.

- Não Mi - gritei - Nem a pau irei botar fogo em alguma coisa, se minha mãe quer que eu fique aqui, vou obedece-la.

- Vai obedecer a mamãe Benjo?

- E para de querer me irritar - Milena não parava de rir.

- Tudo bem Bonbenjo, vamos começar então - disse as ultimas palavras e sumiu atravessando a parede.

Aquele lugar tinha horário para tudo, para comer, para assistir televisão e o pior de tudo, passávamos o dia todo em silêncio ou rezando, eu odeio silêncio, Milena tinha sumido desde aquela hora e não havia voltado, estava até com medo do que ela poderia estar planejando.

Por volta das dez horas da noite senti algo estranho, e resolvi sair do meu quarto, não aguentava aquele ar de presídio, dormimos cedo e acordávamos antes do sol.

Algo me chamou a atenção, uma fumaça saindo de uma salinha de madeira, e um forte cheiro de queimado.

Corri até o fogo, ela não podia ter feito isso, abri a porta fazendo muita força e meu medo era real, Milena dançava em volta do fogo.

- Viu Benjo, prontinho, agora é só você ficar aqui pra levar a culpa - o fogo estava ficando cada vez mais alto, a capela de madeira estava sendo reduzida a cinzas, enquanto Milena ria, pra ela era tudo diversão, corri para a fonte, não havia nenhum balde ou recipiente que eu pudesse pegar água, a esta altura todos já haviam acordado graças a fumaça.

Sentei na escada que levava a capela, e coloquei as mãos na cabeça enquanto o padre chegava correndo seguido de perto pelos outros.

- Santo Deus - disse o padre colocando as mãos na cabeça - O que você fez garoto?

- Eu não fiz nada - disse balançando a cabeça negativamente.

Os outros garotos faziam o que podia para apagar o fogo, pegaram mangueiras, baldes, vasilhas e tudo o que achavam, o medo era que o fogo se alastrasse até a casa.

O fogo foi controlado depois de breves minutos que para mim parecia horas, logo eu estava no centro da sala-de-estar numa espécie de Júri, o reitor Padre Itamar me olhava com fúria nos olhos, atrás dele estava os dois padres residentes, em volta deles os garotos que me olhavam com medo.

- Veja pelo lado bom Benjo, se você não é querido, seja temido - dizia Milena ao meu lado, o ódio passava pelas minhas mãos, percorria minhas veias, chegava no meu coração e contaminava meu cérebro.

- Some daqui - disse entredentes.

- Porque Rogério? - começou o padre andando de um lado para o outro - Só quero saber o porquê você fez isto? Um lugar santo, botar fogo em um altar, porque alguém faria isso?

- Mas não fui eu - disse tentando me explicar.

- Silêncio - gritou o segundo padre.

- Só fale quando eles mandarem - disse Leo sussurrando no meu ouvido - Sei que não foi você, mas se você falar será pior, ninguém vai acreditar que podemos ver gente morta.

- Qual a punição mais apropriada? - Perguntou o terceiro.

- Expulsão - respondeu o segundo cuspindo ódio em suas palavras.

- Não - disse Padre Itamar ainda andando de um lado ao outro – Seria fácil demais e é isso o que ele quer, quer ser expulso, mas não vai conseguir, três dias trancado, sem comer, isso vai dar uma lição nele.

- Não - gritei.

- Três dias é pouco - disse o segundo - eu digo que sete darão o resultado esperado

Os garotos começaram a murmurar algo que eu não entendia.

- Três dias é o bastante, ele não morrerá em três dias - disse o terceiro.

- Então combinado, essa será sua punição, Leo, leve-o para a sala de penitência - ordenou Itamar.

Leo me levou até um quarto escuro, onde mal dava para respirar.

- Você ficará bem? - perguntou a mim.

- Acho que sim - respondi - pode me chamar de Benjo.

- Ok Benjo, me chame de Leo, futuro padre Leo.

- Você esta aqui por vontade própria? - perguntei a ele.

- Ah, sim. Meu sonho é um dia ser um bom padre e levar o nome de Deus em muitas vidas.

- Mas acima de tudo é um paranormal.

- É, coisa de família - minha tia também vê - é muito raro encontrar pessoas paranormais que não são charlatões.

- Verdade, mas isto esta virando uma constante em minha vida, aonde vou esbarro com algo sobrenatural.

- Você não fica com medo? Digo; você esta em um castigo terrível porque um espírito fez uma travessura horrível.

- Você se acostuma - disse sorrindo, mas na verdade estava me sentindo muito mal. Minha barriga começou a fazer barulho - Acho que estou com fome - disse sorrindo.

- Vou trazer algo para você comer - disse ele, se virando para sair.

- Não, pode lhe trazer problemas.

- Único problema que vejo aqui é uma injustiça, odeio injustiças, já volto.

Ao mesmo tempo em que Leo saiu, Milena entrou, a cara dela não era muito melhor que a minha.

- Obrigado - disse a ela emburrado.

- Benjo me perdoe, não queria que isso tivesse acontecido, apenas queria ajudar.

- Ótimo, me ajudou muito, me ajudou a ficar preso.

Ficamos alguns segundo em silêncio até Léo retornar com uma bandeja de pães e um copo de Leite.

- Vocês são amigos? - perguntou ele depois de um breve momento de silêncio.

- Sim, somos - disse Milena.

- Não sei - respondi.

- Vai ficar com raiva de mim Benjo? - ela fazia aquela carinha que cortava meu coração.

- Não adianta fazer biquinho Mi, você só me ferrou.

- Leo fala pra ele que não fiz por mal - disse ela apelando.

- Ela não fez por mal Benjo - disse ele.

- Não defenda ela – falei, aquele discussão parecia que não acabava mais, então resolvi ceder - Ok Milena, Mas se você fizer qualquer coisa que eu não tenha aprovado, eu coloco sal nos quatro cantos do meu quarto.

Os dias se passavam. Leo não havia me abandonado e me levava comida sempre que conseguia, Milena era minha única distração apesar de eu ainda estar emburrado com ela.

Quando finalmente pude sair do castigo, me jogaram em outro...

- Bom pessoal - dizia o reitor com pilhas de bíblias - vamos entrar em um retiro espiritual de sete dias, o que é um retiro espiritual? Basicamente é silêncio e reflexão.

- Eu deveria ao menos ter trazido meu game-boy - disse sorrindo.

Os dias eram muito chatos, não tinha nada pra fazer, ficava sentado na árvore, era meu cantinho de paz.

- O incendiário - gritou Roberto - Vamos rezar uma missa, hoje às cinco da tarde, com a população, o padre Itamar disse que era bom você não se atrasar.

- Não estou com saco pra isso - respondi descendo da árvore.

- Você que sabe, quer ficar de castigo de novo?~

- Manda esse menino ir... - disse Milena.

- Cala boca Milena - Disse antes que ela terminasse a frase.

Depois da Missa, fui direto pro meu quarto tomar banho, estava fedendo a incenso.

- Estou cansado disso aqui Milena - disse tirando minha roupa e jogando sobre a cama - Vou dar um jeito de sair daqui.

- Quer ajuda? - disse ela.

- Pelo amor de Deus, não.

- Então o que pretende fazer?

- Não acha as regras deles muito rígidas? - perguntei.

- Sim, Isso aqui é um Seminário e não um bordel, que você queria? - disse ela.

- Haha, engraçadinha, vou começar por ai.

No outro dia, me levantei muito cedo, tinha que achar um jeito de sair escapar dali, andei pelo corredor que levava a cantina, e entrei na cozinha, onde ficava o botão de abrir o portão, as cozinheiras nem perceberam a minha presença, abri o portão e sai correndo, quando estava quase chegando na rua ouço alguém me chamar?

- Aonde vai Benjo? - era Leo, que estava sentado no banco tomando café-da-manhã.

- Vou ao mercado - disse.

- Se Itamar descobrir ele...

- Ele só vai descobrir se você contar - o carro do Padre Itamar entra pelo portão neste momento, pego o braço do Leo, e o puxo para longe da vista do Padre.

Esperamos o padre entrar.

- Quem deixou o portão aberto? - o ouvi gritar com as cozinheiras.

O portão começou a fechar, deixando Leo desesperado porque estava do lado de fora comigo.

- Meu Deus, meu Deus, meu Deus - dizia ele enquanto o portão se fechava, não dava mais tempo dele entrar.

- Leo, calma, aproveita que estamos aqui e vamos ao mercado - ele me olhou com desconfiança - Prometo que não vamos demorar.

- Você não está possuído pelo espírito da menina não né Benjo?

- Não, não - disse sorrindo - Vamos logo antes que alguém apareça.

O puxei pelo braço até o mercado, ele não parava de rezar, aquilo me divertia, o mal em mim queria sair a todo custo. Chegando ao mercado fomos para a seção de bolachas e salgadinhos.

- Isso faz mal - disse Leo.

- Você não viu nada ainda - fui até a seção de bebidas e peguei todo tipo de bebida alcoólica que achei, Vodca, Uísque, 51, dentre outras.

- Que você está fazendo? - perguntou Leo.

- O que devia ter feito desde quando cheguei aqui, vou me divertir essa noite.

- Festinha Benjo? - disse Milena aparecendo atrás de mim.

- Sim Mi, vai ser a melhor festa que esses meninos já tiveram.

- Adoro festinhas, como não tive essa ideia antes? - disse Milena, sorrindo - mas só bebidas não vai animar um monte de meninos na adolescência.

- Alguma sugestão? - perguntei levantando a sobrancelha.

- Esses cartazes aqui! Acho que resolve - disse Milena apontando para enormes cartazes que ficavam na porta do mercado.

- Não - disse Leo nervoso - Você não vai levar a "Tailândia Erótica" e a "Casa Games" para dentro do seminário, Deus vai nos castigar pra valer Benjo.

- Tenha calma, Leonardo, eu assumo a responsabilidade por tudo, mas precisamos de dinheiro, e o que eu tinha gastei com as pingas.

- E sua conta no banco? - disse Milena - Aquela que seu pai deixou pra cada um de vocês?

- Milena, que deu em você hoje? Baixo o espírito de Athenas em você - falei sorrindo - Athenas é a Deusa da sabedoria não é?

- Se isso era pra ser uma piada não deu certo Benjo - Quando ela fazia uma piada podia ser a pior de todas, eu ria pelo menos pra deixar ela feliz, mas quando eu faço a piada ela me ignora?

- Da pra vocês parar? - falou Leo puxando os próprios cabelos - Benjo cai na real, cadê aquele menino que chegou aqui a uma semana atrás?

- Ele ainda esta naquele quarto escuro passando fome – retruquei – ou deve estar em baixo de uma árvore lendo um monte de livros toscos.

- Esse é meu menino - apoiou Milena.

- Agora vamos ao trabalho disse indo para o banco.

Tudo estava dando certo como o esperado, contratei os serviços de jogos e de estripes. Coincidência ou não, os padres iriam a uma conferência na mesma noite, o que nos dava tempo para agitarmos a festa.

Os meninos estavam todos com medo, mas adoraram a ideia, via nos olhos deles quando as dançarinas chegaram, várias máquinas de fliperama, jogos e brincadeiras foram instaladas por todo o seminário, abrimos as portas para a comunidade entrar.

Um grupo de garotos desconhecidos começou a derrubar obras de artes da casa, quebraram vasos, estátuas, até mesmo a televisão.

- Benjo faz alguma coisa, para isso agora - gritava Leo, tentando salvar um vaso que era de uma Santa que não fazia ideia o nome, pra mim santos são todos iguais, eu apenas ria de toda a situação, parecia que minha consciência realmente havia ficado no quarto escuro.

- É - começou a falar Milena - Esta um pouquinho fora do controle isto aqui.

- Um pouquinho? Eles vão destruir a casa. - gritava Leo.

- Leo relaxa ai e curte a festa.

Acenderam uma fogueira com galhos secos das árvores.

- Não - gritou Leo - Fogo de novo não.

- Ele esta mesmo muito mal Benjo - disse Milena - vai acabar tendo um infarto.

- Vou levá-lo para dentro - peguei no braço do Leo e o puxei para os quartos - Leo você está bem?

- Eu estou. Quem não esta bem é a casa.

- Porque se preocupa tanto com este lugar? Eles são padres hipócritas você vê como eles nos tratam.

- Benjo, meu sonho é estar aqui, e agora esta indo por água abaixo, Padre Itamar vai expulsar todos nós.

- Já disse que vou me responsabilizar por tudo.

Neste momento ouço as pessoas gritando lá fora, e corro para ver, o pesadelo estava se tornando real novamente, fogo... O fogo estava altíssimo, pegava na fiação elétrica, mulheres semi-nuas corriam para a rua enquanto a caixa de força estourava com barulhos tremendos.

- Desliguem a chave de força - gritei para os seminaristas que estavam próximo a sala, não podia deixar o fogo chegar a casa, não dessa vez.

Estava um caos completo, ambulâncias, bombeiros apagando o fogo, eu não sabia o que fazer, então me sentei e apenas fiquei olhando tudo aquilo.

- Você se superou dessa vez Benjo - disse Milena se sentando ao meu lado.

- Não me enche Mi.

Nesse momento levo um tremendo susto, uma mão aperta meu ombro.

- Ai - digo me desvencilhando - Padre Itamar?

- Quem é o responsável por tudo isto? - pergunta ele cuspindo raiva.

- Em minha defesa - digo me afastando com passos lentos - Ira é um dos sete pecados capitais, mantenha a calma.

- Calma? - gritou ele - e você ainda me pede calma depois de transformar nossa casa nisso - Olhei para os lados, onde ainda havia as dançarinas semi-nuas, e os garotos dançando, apesar de todo o caos o som ainda estava alto e eles nem havia percebido a presença dos padres.

- Eu avisei pra expulsá-lo - gritou o segundo.

O Padre foi até a caixa de som e puxou o fio que a ligava.

Ouve um Ahhhhh coletivo enquanto os meninos saiam de fininho, o padre me olhou com cara de ódio e gritou:

- Para o seu quarto, espero que não saia de lá, até eu mandar.

Fui para meu quarto antes que acabasse piorando as coisas, eu estava com um talento muito bom para arranjar encrenca nos últimos meses.

Quando deitei em minha cama tudo havia passado na minha cabeça muito rápido, depois da dose de adrenalina vem a dose de consciência.

Contratei dançarinas de Estripe e uma casa de jogos em um seminário? Tudo bem que eles mereciam uma lição, mas quem sou eu para dar lição em alguém?

- Bonbenjo? - falou Milena em meu ouvido - Esta dormindo Benjo?

- Não Mi - disse me virando - Não consigo dormir.

- Quer ajuda?

- Que você pode fazer pra eu dormir?

- Posso cantar.

- Benjo esta dormindo? - dessa vez era Leo batendo na porta, me levantei e abri a porta.

- Porque as pessoas acordam as outras para perguntar se esta dormindo? - disse Mi pensativa.

- Ah, cala boca Mi - retruquei - Oi Leo.

- Que os padres fizeram com você? - perguntou ele.

- Ainda nada - respondi.

- Ok, cuidado esta noite, vou dormir.

No dia seguinte acordo com alguém batendo em minha porta, as batidas eram muito intensas, parecia que estava martelando minha porta.

- Já vou - disse esfregando os olhos, eu ainda estava com muito sono.

- Anda Logo moleque insolente - o segundo padre pegou no colarinho da minha camisa e saiu me arrastando pelo pátio.

- Calma ai velhote - disse fazendo força para sair de suas mãos.

- Velhote? - disse ele me soltando e me empurrando na parede - Você não tem um pingo de respeito seu moleque endemoniado - Ele levantou sua mão para me bater quando algo o faz parar.

- Não toque nele - gritou Milena, as janelas atrás do padre começaram a quebrar uma por uma.

- O que é isto? - disse ele sem entender - Você esta possuído por alguma entidade, precisamos te tirar daqui o mais rápido que pudermos.

Aproveitei o momento de fraqueza do padre e dei um passo à frente gritando.

- É o que eu quero, a única coisa que quero é ficar livre deste presídio e livre de vocês.

- Padre, Itamar mandou vir ver o porquê esta demorando tanto - Cézar e Lucas estavam com enormes olheiras, parecia que não tinham dormido a noite toda.

- Já estou quase chegando - disse o segundo me puxando de volta.

A sala-de-estar estava como no dia que me julgaram, os padres no mesmo lugar e os meninos atrás deles, Leo e Milena ao meu lado.

Houve um breve momento de silêncio até que o padre Itamar me encarou.

- Santo seminário vira bordel e casa de jogos - ele me jogou um jornal que pude ler a manchete - Isso é o cumulo, você realmente passou dos limites.

- Posso me explicar? - disse levantando a mão - Pra começar eu estou de saco cheio dessa sua cara de cão velho, quando foi que você viu uma mulher semi-nua pela última vez? Você estava com uma cara de taradão. E você - apontei para o segundo - Sei que você é apaixonado pelo Leandro, todo mundo aqui já percebeu as suas trocas de olhares larga o orgulho de lado e agarra ele - Milena ria ao meu lado, Leo estava com cara de assustado e os outros com olhos arregalados de surpresa - Agora se me dão licença, vou arrumar minhas coisas, Ligue para minha mãe vir me buscar.

- Você ficará bem Leo? - perguntei me despedindo de meu amigo, mamãe estava me esperando no carro, o reitor ligou para ela e contou tudo o que havia acontecido, inclusive deu um dos jornais do dia para ela, onde o seminário estava na primeira página graças a mim, pelo menos estavam famosos.

- Acho que sim - respondeu ele - você levou toda a culpa mesmo, você ficará bem Benjo?

- Vou sim, sei me cuidar.

- Não se meta em encrencas Milena - disse olhando para nossa amiga.

- Pode deixar - respondeu ela sorrindo.

Me despedi de todos, e seguimos viajem, mamãe não falou comigo nenhum segundo.

- Acho que ela está com raiva de mim - sussurrei para Milena.

- Não fale sozinho como se estivesse alguém aqui conosco - gritou ela no volante, o carro deslizou pela pista, mas ela conseguiu o controle novamente, achei melhor não contrariá-la neste momento.

Chegando a casa fui recepcionado por todo meu pessoal, Jhonatan, Lua, Luís, Erick, Tawan, Jack, Ane e principalmente Débora que nesses últimos dias não parava de pensar nela, eu estava tremendamente apaixonado.

- Que bom que voltou - disse ela me abraçando.

- Como foi botar fogo na igreja? - disse Jhonatan sorrindo - Queria estar lá pra te ajudar.

- Você é doido - disse Lua empurrando Jhol - também estava com saudades irmãozinho, sinto muito porque não vou ter mais um PS2 pra jogar.

Ficamos horas conversando, contei tudo o que havia acontecido lá, mamãe não disse nada para mim, ela apenas se fechou no próprio quarto, depois de horas conversando resolvi ir para meu quarto descansar, estava morrendo de saudades do meu cantinho.

- Benjo, vou fazer o que havíamos combinado antes de irmos para a casa de padres - disse Milena se afastando?

- Vai o que? - perguntei, mas era tarde de mais, ela já havia sumido.

Adormeço após algum tempo, mas logo desperto com gritos, eram os gritos de mamãe, corro até seu quarto, mamãe estava enrolada na toalha, acabará de sair do banho, estava pálida com a boca seca, e parecia muito amedrontada, apontava para o vidro do box, onde podia se ler claras palavras entre o vapor, as letras foram escritas por dedos, dizia:

VOCÊ ESTÁ ERRADA

EU EXISTO

MILENA

Olhei novamente para mamãe que ainda fixava os olhos no vidro.

- Eu a vi - disse ela caindo de joelhos, eu a segurei antes que tocasse o chão - filho, me perdoe. Eu sabia que estava errada, mas não conseguia admitir a hipótese que você estivesse falando a verdade. Quando era criança, um menino, todas as noites - ela se levantou e sentou na cama - todas as noites ele vinha e ficava ajoelhado em minha cama, não dizia nada, apenas ficava lá.

- Mamãe? Porque nunca me contou?

- Eu tinha medo, e sua avó dizia que era coisa maligna, me perdoe por te mandar para aquele lugar.

- Como uma simples mensagem no espelho te convenceu? Podia ter sido eu que a escrevi.

- Eu a vi - os olhos de mamãe brilhavam - por um breve momento pude ver seu sorriso.

Quando voltei para meu quarto, Milena estava deitada no chão, ao lado da minha cama.

- Estou exausta Benjo - dizia ela - ao menos deu certo?

- Se deu certo? Você é um gênio - falei sorrindo.

- Sei que sou - ela se levantou, mas parecia muito cansada, cambaleou e sentou na cama.

- Esta bem? - perguntei.

- Precisa de muita energia vital para aparecer para uma pessoa que não tem um mínimo de poder espiritual, e muito menos fé, sua mãe e tão cabeça dura quanto você.

Rimos juntos, e meu telefone tocou.

- Benjo, vamos sair? - era Débora.

- Só se Milena puder ir junto.

- Então Liga para todo mundo - disse ela - vamos jantar fora hoje...

Bonbenjo
Enviado por Bonbenjo em 20/10/2014
Código do texto: T5005508
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