Histórias para não dormir - Nana neném.

Eu tenho algo à contar para você. Uma história muito antiga e há tempos camuflada e escondida, mas real. Preste atenção nas palavras que direi e nunca esqueça do que vive nas sombras que você não vê.

A felicidade agraciou Catarina e seu marido, Joaquim, com a vida da pequena Estela. Após anos de dificuldades para engravidar, incluindo um aborto espontâneo e muita tristeza, o casal transbordava alegria com a chegada do bebê de grandes olhos castanhos.

Viviam no interior de Minas Gerais, em uma casa de telhas de madeira, cercada por uma humilde plantação de milho. Catarina cuidava dos afazeres domésticos e também do milharal, enquanto Joaquim trabalhava em outro plantio, muito maior, no outro canto da cidade. A vida era simples.

Um bonito gato preto de olhos esverdeados aparecia, vez ou outra, pedindo por comida. O miado estridente era substituído pelo ronronar agradecido após uns poucos pedaços de carne e afagos na orelha.

Após uma longa tarde de trabalho, Catarina esticou-se ao lado do berço do bebê, que choramingava, e passou a cantarolar uma cantiga de ninar que sua avó lhe ensinou quando era menina.

Nana neném que a cuca vem pegar.

Papai foi pra roça, mamãe foi trabalhar.

Desce gatinho, de cima do telhado, pra ver se a criança dorme um sono sossegado.

Nunca examinou de fato aquilo que a canção dizia, mas gostava do ritmo.

Cantarolou até que Estela acalmou-se e dormiu. A feição angelical da criança era um deleite para os olhos da mãe, que ficou algum tempo admirando a filha dormir.

O sol ainda brilhava, embora muito fraco, no horizonte. Joaquim ainda estava trabalhando e voltaria para casa quando o sol sumisse. Catarina caminhou até a janela do quarto e viu, pintado pelos dourados raios de sol, o milharal que jazia completamente destruído. Arregalou os olhos e correu para fora, tremendo dos pés à cabeça. Os pés de milho encontravam-se revirados, quebrados e espalhados por todos os cantos como se uma grande maquina ou muito forte vento por ali tivesse passado, mas ela havia conferido as plantas poucos minutos antes e estavam crescendo fortes. Realmente dariam uma boa colheita.

Ajoelhou-se frente à plantação devastada e chorou. Catou alguns milhos que ainda estavam inteiros enquanto tentava entender o que havia acontecido. Quem poderia ser o autor de tamanha crueldade?

Assustada, pensou em correr até a casa mais próxima e pedir ajuda, mas Joaquim chegaria logo e ela deveria estar presente para lhe contar o que sabia: nada. Havia entrado em casa, após cuidar da plantação como de costume, e de repente tudo estava revirado. Nenhum barulho, vento ou agitação fora do normal.

O gato apareceu e miou alto. Estava sentado na janela do quarto e olhava para dentro do cômodo. Catarina ouviu o bichano. Carregando consigo os milhos que recolheu e tentando controlar o desespero, pôs-se a caminhar para a casa. No caminho, ouviu o gato assoprando, como eles fazem quando estão assustados, e observou o animal esticar as patas e arrepiar-se. Correu e adentrou a casa, jogando os milhos pelo chão da sala e parando bruscamente frente ao berço da criança.

Gritou até a garganta rasgar e os pulmões esvaziarem. Não havia nada no berço.

Jogou os panos para cima, olhou embaixo da cama, rodou os olhos pelo chão, pelo teto, pelas paredes e chamou o nome de Estela. Levou as mãos até a cabeça e puxou os próprios cabelos, chorando exaltadamente. Correu para a sala, afastou o sofá e atirou as almofadas longe. Foi até a cozinha e abriu todos os armários, olhou em todos os lugares, mas não encontrou a filha recém nascida. Voltou para o quarto, as pernas moles como num sonho… O gato continuava na janela, mas se curvava para o lado de fora da casa, ainda arrepiado e hostil.

Ela foi até a janela e testemunhou, parada entre o milharal, uma estranha criatura de corpo atarracado e corcunda, com o rosto esticado como de um réptil, segurar a criança no colo.

Catarina gritou, descrente do que via, mas esticou os braços e inclinou o corpo para frente, quase saindo pela janela, na esperança de alcançar a filha, quando a criatura demoníaca soltou uma gargalhada grotesca. Sua voz rouca soava inumana e aterrorizante. O bebê começou a chorar e, junto com o sol que desaparecia por completo, a criatura também desapareceu, rodopiando rapidamente e destruindo mais ainda a plantação.

Catarina quase enlouqueceu. Cavou o chão da roça até as mãos calejarem e sangrarem, mas nunca encontrou Estela. Ainda ouvia o choro da criança, ao longe… Joaquim não acreditou na história da mulher, tampouco a policia.

Algumas pessoas jogaram pedras em sua casa. Alguns se apiedaram dela, acreditando que a criança tinha sido levada por alguém e a pobre mulher perdido a razão, outros a chamaram de assassina, mas o fato é que a criança nunca foi encontrada.

Eu não sei qual foi o destino da pobre Catarina, mas quem acreditaria na história de uma mãe que teve o filho levado pela Cuca?

Fernanda Oz
Enviado por Fernanda Oz em 16/11/2014
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