O Segredo da Família Calixto

Suzana ficou viúva há apenas dois meses. Reside com sua mãe (Tereza) e suas duas filhas numa casa modesta na periferia. Por não possuir o nível de escolaridade completo, nunca conseguiu arrumar um emprego fixo, vive de bicos como diarista. A magra aposentadoria de Dona Tereza banca as contas todos os meses, e o trabalho de Suzana como diarista é essencial para a alimentação da família. Passando por tempos difíceis, pois não está conseguindo arrumar serviço, a família já chegou a passar fome. Mas esse destino está prestes a mudar com a notícia que sua amiga lhe trouxe nesta tarde...

-... quando abri o jornal nos classificados, essa propaganda me chamou a atenção. Queria ver o serviço pra mim, mas me lembrei do quanto você está precisando... Daí resolvi te contar.

-Posso dar uma olhada? -Perguntou Suzana.

-Claro. É pra isso que vim.

Suzana apanhou o jornal e leu a oferta de emprego circulada com caneta hidrográfica:

"NECESSITA-SE DE EMPREGADAS DOMÉSTICAS

PARA TRABALHAR EM TEMPO INTEGRAL.

ÓTIMO SALÁRIO.

CONTATO: 3400-6969"

Depois de se despedir de sua amiga, Suzana pegou o celular e sem perder tempo, digitou o número para obter informações sobre o serviço. Somente na terceira chamada foi atendida por um senhor de voz rouca:

-Residência da família Calixto, pois não?

-Alô. Por gentileza, meu nome é Suzana e nesta tarde eu vi uma oferta de emprego de empregada doméstica. Gostaria de mais informações.

-Creio que sim. Aceite minhas sinceras desculpas pela demora ao atendê-la, senhorita Suzana, mas a casa é tão grande que necessitaria de uma motocicleta para atender o telefone no primeiro toque.

-Imagine. -Suzana deu risos pela brincadeira e até por estar impressionada.

-Antes mesmo que disse-se que está interessada no serviço, eu já sabia, -afirmava o senhor para impressioná-la ainda mais, -pois este é o número que atende apenas isso. Antes de qualquer coisa, devo me apresentar: Meu nome é Rogério, sou mordomo da família Calixto e serei seu futuro chefe. Sem mais delongas, vamos ao que interessa: o trabalho é de segunda a sábado, com descanso aos domingos para voltar para casa, já que a doméstica terá aposentos aqui na mansão. O horário é das seis as seis com intervalos para as refeições. Oferecemos férias, registro em carteira e, agora o salário, que é de RS 10.000,00 por mês...

-MEU DEUS!-Suzana não se conteve.

-Algum problema?

-Não, nenhum.

-Que ótimo. Esteja aqui a manhã as nove da manhã, na rua Dr. Félix Calixto, número 1363, para a entrevista. Até amanhã, senhorita Suzana.

-Até amanhã...

Suzana desligou o celular emocionada. "Esse emprego caiu do céu!" Pensou.

No dia seguinte, Suzana já estava no ponto de ônibus as 07:53. Decidiu sair de casa bem cedo porque desconhecia o endereço que Rogério lhe passou, e precisaria de ajuda para encontrá-lo.

O ônibus parou no ponto. Antes de subir, ela foi logo perguntar ao motorista:

-Por favor, moço. Você conhece a rua Dr. Félix Calixto, número 1363?

-A rua eu conheço sim, mas... o que você quer desse endereço?

-É uma entrevista de emprego, por que moço?

-Estranho. Sempre achei que não existia alguma construção naquela rua, ela é cheia de árvores e mato, nem sei se o carteiro passa por lá. O ônibus pára lá perto, se você quiser posso te avisar quando estiver chegando.

-Se você puder, obrigada. -Disse Suzana subindo no ônibus.

Suzana olhava pela janela enquanto o ônibus percorria o caminho. Estava ressabiada com a descoberta, poderia ter sido enganada num trote?

Num ponto isolado, o ônibus parou e o motorista se voltou para Suzana:

-Moça, aqui é perto da rua.

-Mais uma vez, obrigada. -Agradeceu descendo do ônibus.

O motorista olhou para ela parecendo estar preocupado.

-Cuide-se, viu moça, -e tocou o veículo embora.

Com os olhos arregalados, Suzana caminhava solitariamente pela rua, só vendo árvores após árvores, procurando por uma residência de número 1363.

De repente algo gigantesco, magnífico e luxuoso surgiu entre as árvores -é a mansão da família Calixto!

-Você deve ser a senhorita Suzana. -Disse o mordomo Rogério olhando o horário no seu celular. -Chegou cedo, já está ganhando crédito com o dono da casa. O senhor Félix Calixto lhe aguarda em seu escritório.

-Desculpe, senhor Félix Calixto?

-Sim. Queira entrar, por favor.

A entrevista foi um sucesso. Naquela mesma semana Suzana estava empregada. Durante um mês ela trabalhou para os Calixtos.

Num domingo, Suzana estava em casa colocando os assuntos em dia com sua amiga, quando aproveitou para lhe contar tudo o que se passou com ela nesse mês...

-... O s Calixtos são muito legais comigo. Já estou até me encontrando no meio de tanto luxo. -Brincou. -Só existem algumas coisas que são estranhíssimas lá, começando pelo nome da rua, que foi batizada em homenagem ao dono da mansão. Mas ele não devia ter feito algo há muito tempo atrás pra isso?

-Acho que não. Ele é rico e isso já deve importar. -Respondeu a amiga. -Mas é só isso? Vamos, me conte tudo.

-Um dia desses, eu arrumava o quarto da filha deles e encontrei uma foto de um rapaz, deve ser seu namorado, porque tinha uns corações desenhados em volta de seu rosto.

-Ah, isso é muito estranho. -Debochou.

-Sim, é estranho. A foto é de 1952!

-Credo!

-Num outro dia, tentei abrir uma porta, acho que levava para o porão ou para um andar abaixo, mas não consegui, ela estava trancada. Quando me virei, o dono da casa estava atrás de mim. Levei um susto enorme. Ele me repreendeu e disse para nunca abrir aquela porta.

-O que será que há atrás dela?

-Não sei. Talvez um segredo de família.

-E nesta semana, você volta a trabalhar?

-Sim, eles vão tirar férias. Vão para o Caribe. A casa ficará só para os empregados.

-Então essa é a sua chance de saber o que há atrás daquela porta. E me conte tudo a semana que vem.

Na quarta-feira, Suzana encontrou a chave que abria aquela porta, depois de ter passado os três dias vasculhando cada cômodo e móvel da casa em sua procura.

Durante a noite, ela andou pé por pé até a porta, passou a chave devagar para fazer nenhum barulho e a abriu, se deparando com um cenário escuro...

***

Este conto faz parte do livro "Contos do Satã", de Rafael Augusto, já disponível à venda nos sites: www.livrariacultura.com.br e www.editoramultifoco.com.br

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Rafael Contos
Enviado por Rafael Contos em 05/12/2014
Reeditado em 05/12/2014
Código do texto: T5059628
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