Certa, dúvida. DTRL 20.

A luz estroboscópica atraía a população de abutres, que se reproduzia nos contornos do isolamento. Nem a fina chuva, que dava calafrios com seu hálito mentolado conseguiu enxotar o bando, ávido pela desgraça alheia. Olhou para o céu. A pequena esfera de luz solar refletida, tímida se escondia sob o véu encardido."Meu Deus, como preferia estar em casa agora". Devaneou a cama aquecida. Estaria deitado, ouvindo as gotículas explodindo, uma a uma, sob o chão impermeável. Protegido da chuva. Protegido do frio. Protegido da entropia que é a vida aqui fora. Estufou o peito num suspiro longo de lamúrias. "Melhor começar logo" - Concluiu.

A cozinha, que mais lembrava um corredor adaptado, possuía um minúsculo espaço de trânsito. "Com certeza a pessoa que mora aqui não é muito grande", intuiu. Na pia, duas taças de vinho, com seu par ordenado de talheres e pratos, o fizeram pensar num jantar à luz de velas. Pegou um garfo e o examinou. Possuía uma garra de prata lustradíssima, no entanto o que mais chamou sua atenção foi a parte talhada em algum tipo de osso. "Marfim?". Foi então que percebeu. Tudo parecia ter sido tirado duma coleção bem exótica. As taças possuíam uma base revestida com pele animal. E os pratos, cada um, apresentavam um formato irregular. A mão coçou. E já a esticava ao encontro da maçaneta da segunda gaveta ao lado, quando ouviu...

O som chiado, lembrava ao de um rádio imerso num mar de ondas sem polarização. Perdido, tentava encontrar sua frequência. Ao certo ainda olhava ao redor. "Tantas opções, para apenas uma escolha."

O tilintar da dúvida o perturbou. E a voz de sua mãe ecoou por todo seu vazio: "Menino deixe este radiozinho quieto". "Mas, mãe não gosto dessa!", dizia fazendo manha, com os olhos marejados de um gatuno esperto. "Pois, então trate de colocar numa que o agrade". "Gosto de muitas, quase todas!". "Escolha a que mais gosta então", a luz de paciência baixa já começava a piscar. "Do que adianta ficar mudando toda hora? Trate de ficar só com uma". "Se eu deixo em uma, a voz logo aguça minha curiosidade. Não consigo evitar", declara num tom baixo, que beira o deprimido. "Queria poder ouvir todas juntas". A mãe ri. "Se você pudesse ouvir todas juntas, seria um louco". "Ou um gênio", jogou o complete a frase. "Quanto mais frequências tentar ouvir, menos será sua atenção, querido. Não é a quantidade, e sim a qualidade o que mais importa.", discursou com a mão esquerda na cintura e o dedo indicador da mão direita levantado pontilhando rotas pelo ar. "Lembre-se disso, meu filho". "Ah! Mamãe, se ela soubesse. Ainda lembro... E como, de seus intermináveis conselhos." O simples relance é capaz de o fazer esboçar um sorriso.

A dúvida, seu carma, sempre o acompanharia. Nuvem negra, trovoaria nas horas mais inoportunas. "Sempre escolhi a opção errada!". Mal sabia ele. Não importava qual escolhesse. Seu destino já havia sido traçado. Agora... "Agora, não adianta chorar pelo leite derramado. Por mais, que eu sempre dramatize isso. Não choro, dou um belo chilique."

Farejou sem delongas o seu emissor. Caminhava embebido de excitação. O som o atraía como o feromônio exalado por uma cadela no cio. E ele era o cachorro insaciável. Tomado pelo chamado da natureza. Nem percebeu que ainda carregava um talher.

Olhou adiante. Um obstáculo. "Acho que deve ser um pinheiro." Observava, pensativo, a árvore congelada na imensidão. Se fizesse silêncio, poderia ouvir a seiva bruta encontrar o plano aveludado. Escorria. Como um riacho, filho do degelo montanhoso. No entanto, seus ouvidos estavam tomados pelo ritmo cardíaco. Apontou o feixe de luz e acompanhou o pequeno círculo que percorria a folhagem, agora, colorida. Sua voz interior se calou num dado instante. Um minuto de silêncio. " Parece uma árvore de natal."

Olhou a bola tingida em vermelho pendurada. Se esticou ao máximo. E encarou o pequeno círculo negro desbotado central.

Os ruídos se perdiam, num telefone sem fio, entre seus ouvidos e o cérebro. Em algum lugar pelo caminho, chocaram com um nervo qualquer. Seu corpo vibrou até entrar num estado de desconforto estremo. Alguma coisa estava muito errada. Não sabia o que era. Vazio? Solidão? Compaixão...

A esperança esvaía, aos poucos, por entre seus olhos vidrados no verde avermelhado natalino. A árvore, um dia viva e frondosa, agora, tornara-se num belo souvenir incompleto, recordação dum viajante que ousou fugir do inferno.

A estridente onda motora de baixa frequência, num dado momento, aumentou sua amplitude drasticamente. Seus tímpanos foram torturados, sem piedade. E, num arco reflexo protetivo, a dose de adrenalina o retirou de seu estado letárgico. No entanto, nem com as mãos pressionadas contra seus órgãos auriculares, a dor diminuíra. A sensação de um inseto se alimentando de seu pequeno tecido vibratório o aterrorizava.

Maldito o dia em que experimentei. A tensão, quase luxuriosa, tomava meu corpo. O coração a mil. Apenas ouvia o som ritmado num movimento acelerado rumo à inércia. Sem força externa dessa vez. Deixaria fluir. Sem as malditas convenções sociais em escassez. Deixaria fluir. Meus olhos enxergavam o cheiro podre exalado pela caixa se abrindo. Tesouro ordinário. Pense existir. Tesouro guardado. Deixe sair. Enterrado no mais íntimo de meu ser. Guardado. Trancafiado da consciência turva, estraga prazer. Fundo. Mais fundo. Até o extinguir da imensidão. Escondida, hibernava. Meu eu civilizado nunca ousaria. Pensar. Não. Não ouse. Perverso. Como posso? Céus infernais. Purificai minha alma. Não sou eu. Não pode ser. Mas, convenhamos. Todos desejamos algo indesejável. Julgado. Certo. Culpado. Antiético demais para o pior sodomita de gomorra. Imoral demais para uma promessa eleitoral. Pervertido demais para a puta da esquina.

Demônios. Nunca gostei de olhar nos olhos do próximo. Minha cortina de timidez sempre se fez necessária. Desculpas. Ser estranho. Deixe ser. Deixe temer.

Sim. Medo da alma exalada. Os demônios vivem. E por mais escondidos. Eles acenam. Irônicos. Para mim. Eu posso enxergá-los. Vejo os demônios de cada um. São os olhos que me confessam. Não gosto disso. Ninguém gostaria.

E em certos dias incomuns. Quando o Sol parece mais frio que o cotidiano monótono. Fujo dos espelhos. Me escondo. Corro para o lugar mais tumultuado. Barulhento. Ensandecido que consigo encontrar. Tudo isso para não ouvir. Não enxergar. Não obedecer o clamor. O clamor que corrói o peito e soca a boca do estômago. Que afeta o fluxo intestinal e esmaga meus testículos. Que dor. Dor de saber a verdade sobre si. Até onde é capaz de chegar. Fome. Sede. Necessidade. Respiração. Contudo, nem a explosão duma bomba de fusão ao meu lado, conseguiria aplacar e calar minha própria boca. Impossível não ouvir a si mesmo. É uma sensação horrível pedir silêncio ao próprio espírito prestes a transmutar. Ou não. Talvez eu seja esse ser que não quero ser. Sim. Talvez seja isso. E não o que sou. Confuso? Sim eu sou. Ou não. Talvez queira obstruir a verdade. De mim mesmo.

Aos poucos o volume foi diminuído, e a dor se esvaiu. Vislumbrou o corredor, e contornou o projeto da pequena pteridófita.

"Tinha uma árvore parcial no meio do caminho. No meio do caminho tinha uma arte inacabada fora do convencional. Um quebra-cabeças incompleto estava no meio do caminho...". Balbuciava a sua pequena paródia Drummondiana, enquanto seguia seu rumo.

Alguns minutos depois, via-se num grande galpão. O branco chegava a ofuscar quem olhasse seco, sem proteção. Deslumbrante. Embebia com sua claridade higiênica semelhante a um astro luminoso, que irradia luz. No teto, pendiam diversos lustres, cada um com sua singularidade. Contudo, todos eram feitos do mesmo material: Uma base em tecido epitelial com um desenho tatuado. Os tecidos eram bem miscigenados, com doses variadas de melanina. " Incrível ". Não se conteve e apanhou um, o que tinha três estrelas, ao lembrar dos biscoitos lúdicos, recém saídos do forno, de sua infância já distante.

Uma curta sinfonia antecipou a gravação em baixa qualidade, que se espalhava pelos alto falantes.

" Ele estava, mais ou menos, normal esses dias, doutor. Notei uma boa melhora. Meu coração já começava a ficar aliviado, sabe? Até ontem" - Fechou os olhos, deixando escapar uma fina lâmina, que cortou seu rosto. A garganta apertou." Pobre Ted ". Hesitou.

"O que houve ontem?" - Precisou indagar.

" Quando acordei o Sol já estava alto, caminhei em direção à sala. E lá estava ele. Com a faca ensanguentada na mão. Tentando encaixar o objeto pontiagudo na dura carne canina. Seus olhos ingênuos. Gargalhava com a brincadeira " - Disse em prantos. " Ele não sabia a gravidade. Criança. Não fez por mal sei disso. Não fez por maldade " - Seus olhos perseguiam a verdade, que como uma mosca, voava ao redor. Hora sumia, hora reaparecia zumbindo. Às vezes tão fraca. Que quem não olhasse a procurando, não encontraria nada.

" Você vê, contudo só enxerga o que lhe convém, entretanto não posso te culpar, mãe é mãe só muda de endereço." Realizou uma curta pausa para organizar suas ideias. "Ele continua afirmando falar com o irmão gêmeo? " E os alto falantes se calaram.

Um canivete caiu no chão à sua frente. Dobrou os joelhos e o guardou.

Num pilar, uma mesa cirúrgica repousava, de um lado, à espera de ser utilizada, do outro uma banheira flutuava de maneira a burlar as leis da física newtoniana. Não havia como não perceber. Focou seus olhos, e, no mesmo instante, começou a derreter. A imagem o fez lembrar dum quadro surrealista de Salvador Dali. "Aquele do relógio derretido", pensou. Quando percebeu, tornara -se apenas uma poça em meio ao chão tingido impecavelmente de vermelho. "Ácido sulfúrico". E uma cova rasa se abriu... No fundo, uma pá permanecia cravada. A desferiu com uma proeza que parecia estar destinada a ele.

" Estamos quase lá. Em alguns instantes chegaremos à causa de sua aflição. Quando contar até até três você irá inspirar e voltar um pouco no tempo. 1, 2, 3... Inspire."

" Ai meu santo Deus. Quantas vezes eu pedi para esse moleque arrumar o quarto. Não sou empregada de ninguém. Onde já se viu. Já está bem grandinho para ter responsabilidades " - A doce senhora, com seu rotineiro avental, abaixava e ciscava pelo quarto. Uma camiseta atrás da porta. Uma meia aqui. Outra ali. Uma cueca na cama.

O cômodo já perdia alguns aspectos suínos depois da passagem da vassoura. No entanto, a aparência desgrenhada da beliche e o amontoado de peças, semi fundidas, dentro do guarda roupa ainda dava o ar de habitat adolescente masculino. Não que o feminino fosse muito diferente.

" Pronto ". Respirava aliviada. Restava apenas trocar as roupas de cama e " voilà ". Terminaria. " Vai sobrar apenas..." Olhou de relance para a cômoda. Era o único lugar que não ousaria mexer. Nele seu querido filho guardava os brinquedos preferidos, os que ele mesmo montava. Fez o gesto da cruz e voltou ao trabalho.

Enfiou as mãos entre o colchão e a madeira do móvel inferior quando sentiu um asco gelado. Na hora pensou. Besteira." Adolescentes ".

Puxou com força para retirar de uma vez o lençol azul claro, manchado. Deu um sobressalto." Sangue ". Será que se machucara dormindo? Era normal dele aparecer com o nariz sangrando ou algo do tipo. Porém, olhando com mais atenção, constatou. O líquido estava fresco.

No estofado inflado, uma mão inerte pendia para fora. Um líquido escorria por entre seus dedos. E no local onde tocava o chão, deixava escapar um fino vapor.

Deu uma risada. Lembrou da bronca da mãe. Dos seus olhos piedosos. Em algum lugar de sua mente fora cúmplice. E agora, definitivamente era. Pobre coitada. Defenderia sua cria com unhas e dentes. Quase o perdeu ao nascer. Era o segundo gêmeo a contemplar o exterior. Menor e mais fraco, contraiu pneumonia assim que chorou. Seu caçula. Tornou-se o xodó da mamãe.

Percorrendo o local, logo percebeu uma porta ao fundo. Abriu... Por um segundo estranhou sua grossura. " Deve ser para combinar com a parede. A espuma ocupa muito espaço. Mas, é necessário. Para abafar o som ". Deu um leve sorriso sádico.

Estava no quintal. As árvores, como cordas vocais, cantarolavam ao passar do vento. Era uma noite de luar. Cheio, romântico, acolhedor. O mesmo luar que refletia no jardim o caos da morte. Ou melhor, da vida ceifada. A morte é o fim implacável. Tão natural, quanto dolorosa e inevitável. Não causa horror o morrer, mas sim a forma de morrer. De matar.

Uma cerca enorme servia de invólucro. Não como caixa acústica, mas sim como forma de evitar expectadores indesejados. Apenas ele e a voz, somente eles chegariam até ali. Era de madeira maciça, e seus olhos apurados conseguiram captar minúsculas gotículas de tinta. " É aqui que a mágica acontece."

O chiado voltou a incomodar. " Onde está? " Um monte de folhas secas tingidas de verde no canto direito chamou sua atenção.

Um jato de ar em forma de redemoinho surgiu dispersando a folhagem, que mais lembrava maços de cabelo esvoaçando. Negros, loiros, ruivos. Percebia-se diferentes tons por baixo da primeira demão do spray ainda húmido. " Ainda não está perfeito."

Uma chave dourada surgiu em meio às madeixas. Ficou surpreso. Olhando em suas mãos, parecia ter o ouro como composição. "Uma bela joia".

Retornou ao cômodo anterior. Havia um cofre embutido na parede. " Como não percebi isso antes? ". O pedaço de ferro fundido, lembrava a porta de um cofre pertencente a um banco muito rico. " Como será que se abre essa coisa? " Possuía uma alavanca no centro e seis orifícios. Pelos contornos, logo caiu sua ficha. Encaixou todos os pedaços de pães que encontrara pelo caminho. Contudo, nada aconteceu. "E agora?" Apoiou na superfície metálica sem querer e um monitor localizado na lateral direita acendeu. " Isso parece ". E intuitivamente colocou o dedão. Leu destravado no display que piscava uma luz verde. " Ha. Sabia ". Um silêncio tomou seu ser e compreendeu a situação.

Girou a alavanca. E na primeira fresta um som ensurdecedor tomou todo o recinto. Era como se estivesse abrindo a porta do inferno. Os gritos estridentes vinham de celas matematicamente ordenadas.

Em cada sela, uma recordação trancafiada chiava em seu íntimo. Demônio selado pela magia do inconsciente, podia reprimir a lembrança, mas não a dor que expelia, dor que nem um cofre guardado a sete chaves conseguiria conter.

O interior do cofre possuía paredes cromadas e um sistema de ventilação eficiente. Ao entrar sentiu um arrepio. " Que frio ". Esfregou os braços cruzados. Tinha a sensação de estar numa câmara fria de um matadouro qualquer. E, não diferia muito disso. Um corredor se seguia com a mesma largura da porta. Nas laterais haviam milhares de compartimentos de 5 por 5 metros. A iluminação era precária, apenas pequenos leds vermelhos demarcavam a área de passeio no chão. Entrou...

Por entre o vidro percebia as luzes dos aparatos médicos. Eram cápsulas de sobrevivência, praticamente uma unidade de tratamento intensivo particular. " Que macabro ". Os sons aumentavam, a cada passo, carregados de ódio e medo. O piso era de madeira.

Um estrondo ecoou pela casa. O piso, de madeira polida, emitia a marcha do rebanho. " Limpo", " Limpo". O som se aproximava. Parou. " Polícia, ponha as mãos onde eu possa ver ". " A senhora tem o direito de permanecer calada e a um advogado" disse escoltando a mulher algemada, que agora se debatia. " Meus filhos! Não podem me separar deles. Monstros! Com que permissão entram assim na minha casa! ". " Olha aqui ", mostrou o papel, " Temos uma ordem de prisão". Chorava. " Por favor. Deixe eu me despedir pelo menos!". " Senhora... pare de reagir. Terá muito tempo para despedidas depois, agora vamos, com calma".

A criança, retirada de seu mundo particular, já havia sido encaminhada ao conselho tutelar. A outra, apenas começava a desabrochar em seu íntimo estado inconsciente. Nada se cria, nada se perde.

Tudo se transforma. E assim, nasceu. Surrupiado de outro espírito. Adaptado pelo vazio existencial. Meio de sobrevida mental em meio à verdade dúbia e cruel.

" Pobre criança. Espero que consiga se recuperar " - Ambos afirmavam com a cabeça..." E o IML? Retornou alguma novidade? "

" Não senhor. Apenas identificaram o corpo. Você quer que eu peça para agilizarem o processo? "

" Não. Não será necessário. Vou esperar pelo laudo na delegacia."

Pressionou o acionador, e a porta se abriu. O quarto, aquele quarto. " Meu Deus!" Lembrou da beliche, da cômoda, do tapete de veludo azul. Dos brinquedos e roupas jogadas desordenadamente. Olhou para cima e vislumbrou maravilhado as estrelas que brilhavam no escuro. " Está tudo tão igual ". Disse encantado. " Você se lembra? Maninho. Como éramos felizes nesse quarto?" Falou da "beliche do segundo andar", como costumavam se referir a ela. " Então, enfim decidiu me visitar?." Disse contagiante enquanto descia da cama. Acendeu a luz e o horror em seu rosto pareceu contaminar todo seu espírito. A garganta apertou, ardeu e a cada passagem da saliva seus olhos se enchiam mais e mais, até um fino fio sair pelo ladrão.

A pequena criatura à sua frente, não possuía o olho esquerdo, o antebraço direito, seu couro cabeludo havia sido arrancado, restando apenas alguns fios perdidos no mar de carne viva. Sua pele, vermelha parecia ter sido queimada por algum tipo de ácido.

"Eu te esperei por todo esse tempo", e o abraçou. Segurava um pequeno rádio a pilha nas mãos. Era o mascote que sempre encontrava o caminho de casa.

Tomou o artefato receptor das pequenas mãos do irmão e saiu em disparada, trancando o cofre ao final.

Sabia que era apenas questão de tempo. Seus fantasmas voltariam a assombrá- lo a qualquer momento.

" Quando eu contar até três você irá acordar e se libertar das amarras do sofrimento, não se lembrará do que viu, nem do trauma do passado. 1,2,3."

Desligou e uma avalanche de paz tomou seu corpo à medida que a ilusão negra tomava o lugar. Não enxergava nada. Era a sua droga, refúgio temporário da triste realidade.

Acordou num pulo. O terapeuta o fitava incrédulo. "Estou bem melhor doutor, obrigado pela consulta. Você tirou um peso enorme das minhas costas." Percebendo o estado de choque do profissional, estendeu a mão e o puxou abraçando-o. "Espero que não se esqueça do contrato de confidencialidade" disse ao pé do ouvido. O homem conseguiu apenas dar um afirmativo com a cabeça, engolindo em seco logo em seguida. "Então, já vou indo, ainda tenho que visitar minha mãe na prisão." Deixou o cheque sobre a mesa e saiu risonho.

Tema: hipnose.

Rako
Enviado por Rako em 21/01/2015
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