O POÇO

17 de Março de 1805

– Eu devia tê-la resgatado... me desculpe, não queria que tivesse caído no poço.

O POÇO

Alguma coisa invadiu nosso quarto a noite... eram em torno de duas horas da madrugada, eu ouvi um barulho na maçaneta, como se tentassem abri-la, logo em seguida um vulto negro subiu pelas paredes... virei a cabeça para o lado, e estendi minha mão na direção do abajur, mas nessa hora... Dois olhos vermelhos enormes apareceram... Pode-se ouvir de longe, os gritos de socorro... eles ecoaram até a estrada...

“Quando você olha para dentro da escuridão do poço, a escuridão olha para você”

Cruzei o quarto onde ela havia entrado e cheguei no sótão, um lugar mórbido, manchado de lembranças, quase vazio se não fosse uma grande estante na parede perto da janela. Dentro de uma gaveta oculta, encontrei centenas de fotos, algumas novas tiradas a pouco tempo e outras bem antigas, quase não conseguia enxergar suas imagens, mas todas retratavam a mesma coisa... crianças de todas as idades possíveis, adolescentes e até mesmo adultos. A princípio não havia identificado o significado delas, foi então que encontrei a foto de Elisabeth[...]

Gabriel Felipe de Oliveira – Desaparecido em;

21 de Outubro de 1987

– Fique parado por favor, queremos que essa foto saia muito bem não é mesmo...

O cadáver parecia estar vivo, Elisabeth não poupou esforços para preparar esse corpo, passou pó no rosto para tirar a palidez e até conseguiu faze-lo ficar de olhos abertos, acho que somente o cheiro de podridão ela não conseguiu esconder, afinal só iria tirar uma foto mesmo.

– Prontinho. – Disse Elisabeth.

– Agora é hora do jantar... O poço sempre tem fome... – Sussurrou Elisabeth no ouvido do defunto.

Ela enrolou o corpo num pano branco...

As vozes não paravam...

– Traga mais. – Eu quero mais. – Venha para mim.

– Calma caramba, não é fácil matar alguém hoje em dia... Suspirou enquanto carregava-o para a boca do poço.

Ela sempre soube... Nunca olhe para dentro da escuridão...

Então empurrou ele buraco a baixo... o corpo não fez nenhum barulho... Elisabeth voltou as costas e seguiu pela estrada olhando para a foto;

– Está ficou perfeita!

O poço não era lá muito grande, tinha mais ou menos um metro e meio de largura, construído a base de pedras bem resistentes, aparentava ter no mínimo uns trezentos anos... Entretanto, notava-se algo... não havia sequer um sinal de vida ao redor dele, nenhuma planta, nenhum inseto, apenas terra morta...

Nos dias Atuais

– Querido, acho que estamos perdidos? – Perguntou Rebeca.

– Não! Eu sei muito bem para onde estamos indo, olhe para o GPS, ele está dizendo para seguirmos em frente. – Respondeu Marcelo.

– Ei papai! Tinha uma mulher lá fora...

– Que mulher filha, não tem ninguém. – Observou Marcelo pelo retrovisor.

– Nossa! – Disse Marcelo após olhar para o medidor de Gasolina.

– O que foi? – Perguntou Rebeca.

– Enchi o tanque a menos de meia hora e o carro já está sem gasolina. É impossível, eu não estou acreditando nisso. – Gritou Marcelo nervoso.

Marcelo parou o carro no encostamento da estrada, mas antes de desligar o motor, por um breve momento olhou pela janela meio embasada e viu um homem parado no meio da estrada... foi só ele piscar, e do nada a figura repentina desapareceu...

O homem confuso esfregou os olhos e abriu a porta do carro.

[Pousada Velhos Sonhos, subindo a colina]

Rebeca encontrou uma placa, parecia sobre algum tipo de pousada subindo a colina...

Sarah, estava com frio e insistiu para seus pais a levarem para a pousada.

A noite era fria, uma das mais frias do ano, nem mesmo as quatro blusas que vestiam conseguiam esquenta-los.

...

Passos fortes e cansados...

Uma respiração ofegante, cuspindo ar frio da boca...

Uma porta se abrindo...

Um sino tocando...

– Tem alguém? – Perguntou Marcelo.

Elisabeth apareceu no balcão da pousada...

– Sejam bem vindos, meu nome é Elisabeth...

– Por favor, queremos um quarto para passar a noite, como nosso carro acabou a gasolina no meio da estrada. – Explicou Rebeca.

– Venham comigo!

– Mas, não temos que pagar primeiro? – Perguntou Marcelo.

– Creio que o pagamento será feito no momento certo!

Elisabeth mostrou um quarto para Rebeca e Marcelo e deixou Sarah separada num outro no final do corredor.

...

Marcelo e Rebeca acompanharam aquela mulher até um quarto...

A porta era totalmente preta, a maçaneta parecia dourada, se não fosse os pingos de tinta caídos ao lado da porta.

– Aqui está o quarto de vocês! – Exclamou Elisabeth.

Rebeca girou a maçaneta e abriu a porta, um cheiro de mofo ecoou para fora...

– Nossa, meu deus... Não tem um quarto melhor? – Perguntou Rebeca.

–...

– Afinal de contas, onde ela está... – Disse Marcelo.

Elisabeth desapareceu... Marcelo foi até o final do corredor tentar alcança-la, entretanto ela não estava lá.

– Papai? – O que foi? – Perguntou Sarah.

– Nada filha, agora vá dormir!

Marcelo sem alternativa voltou a o quarto com Rebeca e tiveram que passar a noite lá...

As duas horas da madrugada... Sarah ouviu gritos, pareciam de seus pais... – Socorro, corra Rebeca... – Não, ele está atrás de você amor! – Gritava Rebeca.

Levada por um medo fulminante, a menina saltou de sua cama e foi até a porta, vagarosamente ela a abriu... naquele instante, a garota viu Elisabeth entrando em um quarto. O corredor estava machado de sangue como se houvessem arrastado alguém por ali a alguns minutos...

Sarah foi na direção da mulher, depois que entrou naquele quarto, ela a seguiu...

[...]Era a mais velha de todas, mais ainda assim conseguia reconhecer aquele rosto, acho que na foto ela deveria ter uns quatro anos de idade... havia uma inscrição no verso da fotografia... querida Elisabeth, amada por todos, desaparecida em 1805; nunca foi encontrada. Olhei nitidamente para a foto, procurando alguma coisa, mesmo não sabendo o porquê, foi ai que visualizei algo... ao fundo da imagem HAVIA UM POÇO, e o mais estranho era que eu reconhecia ele... conforme fui aproximando meu olhar para aquela construção, notei uma mão saindo dele...

Larguei ela na mesma hora e sem querer, movida por um medo momentâneo, bati na estante e derrubei todas as fotos no chão...

– Traga-me mais. – Eu quero mais... Uma voz ecoou pela janela, vinda de não muito longe do outro lado do jardim.

Vi Elisabeth carregando dois sacos pretos, um de cada vez ela ateou dentro do poço...

– Querida, fuja ela tem uma irmã gêmea. – Sussurrou uma voz no ouvido de Sarah, muito semelhante a de seu pai.

Sarah ouvindo aquela voz tentou correr, mas algo a pegou antes mesmo que ela conseguisse se virar...

E novamente, tudo ficou escuro...

Alguns minutos depois

– Ei, e se as pessoas pararem de vir...

– Continue, as pessoas são sempre gananciosas, e sempre caem aqui, espere e verá... Amanhã chegaram mais...

“Uma vez dentro, suas almas ficaram presas aqui para a

eternidade, servas da fome do poço”

Vinícius N Neto
Enviado por Vinícius N Neto em 27/06/2015
Reeditado em 27/06/2015
Código do texto: T5291438
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