Noite Macabra

Na gaveta da cômoda, um velho Orient marcava duas e meia da madrugada. A corda vagarosamente forçava os ponteiros a avançarem madrugada afora.

Ela acordou de repente. Muita dificuldade em respirar.

Como se alguém tentasse asfixia-la!

-Maldição! - praguejou! Aquele maldito cheiro de mofo estava acabando com seu nariz e com seu sono!

Em cima de uma caixa de sapato vazia, ao lado da cama, junto ao smartphone e um molho de chaves, encontrou o descongestionante nasal, ainda com o lacre. Não precisou acender a luz, abriu e pingou três gotinhas do soro em cada lado e forçou uma respiração.

Quando ajeitou o travesseiro debaixo da cabeça, pôde jurar que viu um rosto sorrindo no canto do quarto. A primeira reação foi retribuir!

Mas levou a mão à boca e fechou os olhos, enquanto puxava o cobertor e cobria a cabeça. O coração a mil! Prendeu a respiração e ficou imóvel! Abriu os olhos devagar e ficou esperando o pior! Silêncio. Nada. De repente o quarto pareceu menor e mais frio! O cheiro de mofo estava agora mais para enxofre! Os pés estavam congelados!

O frio subia lentamente pelas pernas.

Ouviu passos lentos e silenciosos saindo em direção à sala e respirou mais aliviada. A camiseta de seda, ensopada de suor, modelava seu corpo esguio. Fechou os olhos para ouvir melhor e se deu conta do pior! Alguma coisa estava respirando ao lado da cama.

Soltou um grito de pavor!

Deu um pulo e correu sem olhar pra criatura!

Alcançou a tempo a porta que dava para a rua!

A dois passos da saída estacou e começou a chorar!

Um vizinho acordou com o grito.

Sonolento, remexeu na cama, abraçou sua mulher e voltou a dormir.

Logo pela manhã, comentou com a mulher sobre a noite anterior. Após o café, o homem a convenceu a verificarem se a vizinha estava bem.

-Como é mesmo o nome dela?

-Lúcia! Luciana. Alguma coisa assim! – respondeu a mulher sem muito interesse.

Ao chegarem na casa, bateram à porta mas ninguém atendeu.

-Não disse! Não aconteceu nada! Aposto que ela saiu bem cedo ou ainda está dormindo! – ao pronunciar a última palavra sentiu um arrepio. -Anda, vamos embora!

O homem meio contrariado a acompanhou de volta ao lar.

Chegando a noite e não tendo visto nenhuma movimentação na casa ao lado, preocupado, decidiu voltar. A mulher insistiu que não havia nada de errado, e se quisesse, teria de ir sozinho!

Voltando, a mulher o esperava no sofá. Ela vendo a expressão confusa em seu rosto e já imaginando o fracasso, insistiu que a moça devia ter viajado! Ele conferiu as portas, guardou os óculos e foi para a cama sem dizer palavra.

Passadas duas semanas inteiras sem qualquer sinal da moça e sem conseguir dormir direito, decidiu solucionar aquele impasse. Só assim teria paz! Desde aquela noite, vinha sonhando com o grito da mulher e acordava suando frio. Nesta noite ele não sonhou. Ficou acordado, a cabeça maquinando. Esperou a mulher dormir e foi até a cozinha, o relógio na parede marcava duas e meia, foi até o armário puxou uma gaveta, pegou uma faca e voltou ao quarto na ponta dos pés. A mulher dormia num sono profundo. Um riso sinistro surgiu em seu rosto. O velho se conteve, apanhou as chaves ao lado da cama e saiu para a noite.

De frente à porta de Luciana, forçou a maçaneta e entrou segurando a faca à frente do corpo. A menos de um metro, junto à parede, encontrou o interruptor, acionou, mas a lâmpada não acendeu. O ar cheirava mal. Retirou um lenço do bolso e usou para respirar. No fim do corredor encontrou uma porta entreaberta, chegou mais perto e a empurrou com a ponta da faca. Lá estava, em cima da cama, o corpo da jovem! Era como se estivesse apenas dormindo, mas não havia vida em seu rosto! A pele estava branquíssima, como se nunca houvesse corrido sangue ali!

Parado na porta, sem óculos, forçou as vistas e viu! Tinha alguma coisa ao lado corpo! Chegou um pouco mais perto, sentiu um arrepio e deixou cair a faca! A coisa olhou dentro de seus olhos e sorriu.

Respiração ofegante! Alarmado, tentou correr, mas lhe faltava ar! Arfando, alcançou o corredor, a poucos passos da saída tropeçou nos próprios pés e caiu! Sentiu uma forte dor no peito, soltou um chiado e tentou se levantar, mas o mostro em forma de criança o alcançou! Fechou os olhos e esperou pela dor! Nada. Sentiu apenas frio. Muito frio! Tremendo, saiu pela porta e voltou pra casa. Conferiu as portas e janelas e sem fazer barulho voltou pra cama. Logo embaixo, a criatura o esperava dormir! Carregava no rosto um sorriso macabro e a faca do velho nas mãos!

Geovani Rodrigues e Raissa Lins
Enviado por Geovani Rodrigues em 01/07/2015
Reeditado em 25/04/2016
Código do texto: T5296089
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