Alice e o sorriso do gato - DTRL 23 - #LUTO#

Alice, como toda criança, sempre teve medo das histórias de terror e assombrações que lhes contavam. Fantasmas, monstros, bruxas. Porém, por mais medo que tivesse... Sua curiosidade era maior. A frustração da duvida a obrigava continuar para logo após arrepender-se. O medo possuía seu corpo e sua mente. Cada canto escuro era morada de bestas ferozes, todos os sons eram de monstros rastejando para pega-la. No breu de seu quarto era impossível ver quais criaturas a observava. Mas pior do que não ver... É ver. Quando a madrugada já não é de total escuridão, as sombras ganham vida e os medos ganham forma.

Para o alivio de Alice, seu gato a vela todas as noites, protegendo-a de seus pesadelos. Pelo menos é isso que acreditava. Sua insônia e as noites interrompidas por gritos haviam diminuído desde a chegada de Stive, o gato que seus pais adotaram para fazer-lhe companhia e tentar distrai-la.

Cansada de ser a menina medrosa da qual os familiares riem nas reuniões de família, Alice decide confrontar seus temores. Acompanhada de Stive seu fiel escudeiro, assim como Dom Quixote acompanhado de Sancho Pança. Navegando na internet encontra centenas de contos de terror. Mas nenhum a agrada... Já conhece a maioria. Alice quer algo novo, algo que a faça ter medo, mas que não crie monstros em sua cabeça.

- Esse site parece ser legal, o que você acha? – pergunta esperando uma resposta de seu gato – Recanto das Letras – estala os dedos como alguém se preparando para um combate.

Depois de um bom tempo procurando, Alice encontrou contos do qual gostou. Um tal de Will-alguma-coisa... Apesar de um conto com Alice no titulo ser o mais lido, outros eram melhores em sua opinião. Diálogo com a morte, Lembranças de Natal, Portas abertas para a loucura... Mais profundos, melancólicos e psicodélicos. Um terror peculiar, sem monstros... Só o homem.

Contudo uma sigla chamou sua atenção. DTRL. Uma rápida pesquisada e bingo, um desafio, vigésima terceira edição. Logo de inicio sua curiosidade foi grande, muitos contos tinham “gatos” no titulo.

- O que esse pessoal tem contra gatos? – desabafa a menina após ler alguns contos onde os gatos eram os vilões – gatos malvados, gatos possuídos, gatos diabólicos... Cruz credo – já desligando o notebook para ir dormir antes que o medo a dominasse de vez.

A noite não foi das melhores. Sua mente foi perturbada por um novo medo: gatos. Os dias que se seguiram foram piorando. Seus sonhos que começaram apenas com uma fuga de gatos... Tornou-se mais ameaçador. Os gatos com seus olhos vermelhos e pelos imundos a atacavam, arranhavam sua pele e a mordiam até ficar coberta de sangue. Acordava assustada... E lá estava, Stive, rondando a cama ou sobre ela, encarando-a, com os pelos eriçados num balé sobre as patas que só os gatos sabem fazer. O próprio gato a assustava mais que seus pesadelos. Aquele não parecia mais ser Stive.

A menina estava cada vez mais desconfiada de que seu gato estava possuído e a queria morta. Mas antes que ele conseguisse... Alice o mataria primeiro.

Pegou o primeiro pedaço de pau que encontrou na garagem e levou seu amigo felino para um passeio no quintal, lá, onde ninguém ouviria o miado de qualquer gato desgraçado.

Prendeu Stive em uma pequena corda, fechou os olhos e deu a primeira pancada no indefeso animal que foi seu mais fiel amigo. Um miado. Mas Alice não estava satisfeita, dessa vez não fechou os olhos... Queria ver o gato agonizar e ter certeza de que estava morto. A cada paulada os frágeis ossos eram quebrados, o sangue vertia do que agora era um amontado de pelos em meio à lama em um quintal. A menina só parou quando os olhos de Stive saltaram das orbitas. Seu trabalho estava terminado. Nenhum gato do capeta iria tirar suas noites de sono. Naquela noite Alice dormiu como nunca, sua ameaça agora estava morta e enterrada.

Mas as coisas não foram como planejou. Algo se arrastava sob sua cama, algo úmido e sujo. Stive. Ela pôde reconhecer seus contornos, seus olhos pendidos e seu cheiro. Ele vinha em sua direção... Com seu miado de quando um gato encara um cachorro. Antes que Alice pudesse dar um chute no infeliz, algo arranhou suas costas... podia sentir o sangue escorrendo. Não conseguia ver o que lhe atacava, mas tinha certeza que era uma das bestas de seus pesadelos. Como um predador que estraçalha sua presa por diversão, a besta resga sua carne e expões suas vísceras misturadas com sangue.

Nesse momento os olhos de Alice encontraram os de Stive... Uma lagrima singela rola por sua face.

- Desculpa, meu amigo.

O corpo da menina foi encontrado no chão do quarto onde o gato, ou o que sobrou dele, lambia a face coberta de sangue de sua dona.

Em repulsa ao corpo desfigurado do animal... A mãe de Alice, a primeira a encontrar a filha, o chuta para longe. O pobre gatinho que se esforçou tanto para proteger sua amiga... Agora é chutado e descartado como algo sem importância.

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Tema: Animais possuídos.

BruuhNara
Enviado por BruuhNara em 25/07/2015
Reeditado em 25/07/2015
Código do texto: T5323484
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