Reencontro Sinistro - História Real I
 

Não é a primeira vez que me vem esse garoto.
Na casa dos seis anos, não mais que isso e talvez um tanto menos. Dessa vez, apareceu-me entrando pela janela da sala de TV enquanto me recobrava do sono vespertino, na sexta sagrada do feriado bendito.
Encabulado, de olhar baixo, cabelo liso de um castanho escuro, cortado em forma de cuia na pequena cabeça, passou pela minha frente e sentou-se no sofá ao lado da poltrona em que me estirava. Surpreso, mas não tanto quanto das outras vezes, saudei-o:
- Olá, Campeão. Posso te ajudar, meu amigo?
Ficou mudo, como quase sempre, ainda cabisbaixo. Esticou suas pequenas pernas sujas pelo encanto das ruas e recostou-se como se quisesse um amparo.
- Andas brincando com os meninos da rua?
Não me respondeu.
- Quer que te ajude? Conheço amigos que podem te levar para um local melhor...
Senti que sua alma chorava. Tentei acamá-lo passando as mãos por seus cabelos, mas elas atravessaram, como se atravessa o lugar nenhum. Não posso lhe dar um abraço, nem limpar-lhe a sujeira ou curar-lhe as feridas. Ficou ali algum tempo, até que a grita dos meninos na rua o atraiu de novo. E lá se foi o meu pequeno fantasma a continuar vivendo sua vida de assombro sem medo...