A Solução dos Problemas do Mundo
 
Uma abdução alienígena estava em andamento. Isabel, garota esperta, tinha planos para alcançar fama e fortuna, mas estava diante de ET's que não eram os que ela conhecia e eles tinham um plano bizarro para salvar a humanidade.

Isabel viajava de carro por uma estrada de terra que estava escura, esburacada, poeirenta e maltratava a suspensão do carro. Enxergava-se só até onde os faróis iluminavam. As margens das estradas eram cobertas de capim alto e, para além delas, a escuridão escondia lavouras e pastos circundados por cercas ainda mais feias que a estrada. Num certo momento, o sistema elétrico do carro simplesmente parou de funcionar. Faróis, rádio e luzes do painel desligaram-se sozinhos. O motor também falhou inexplicavelmente e o carro foi parando devagarinho. Isabel deu um soco no painel do carro e disse um palavrão. Ela não sabia concertar o carro e estava sozinha sem ninguém que a ajudasse. Ficar presa ali, a noite toda, no meio do nada, faria com que ela se atrasasse ao trabalho no dia seguinte e perdesse o emprego. A garota estava furiosa, mas, de repente, algo mudou seu estado de espírito. No céu surgiu uma luz muito forte acompanhada de um som alto e metálico. Isabel pode ver claramente uma estrutura gigantesca, em forma de disco, flutuando acima dela. Aquilo era um disco voador indubitavelmente. Ela sabia que ia ser abduzida e isso lhe deixava muito contente por que, com certeza, ela escreveria um livro sobre suas aventuras, daria palestras sobre ufologia, apareceria na televisão, nas revistas, jornais e teria um site na internet. Depois do primeiro livro viriam outros e também um filme e séries na TV. Tudo isso a deixaria muito rica, pois todos sabem que há muito dinheiro nessas histórias de disco voador e ET's. Em um momento de sorte ela deixaria a pobreza e saltaria a riqueza, seria uma celebridade e também milionária. O que mais uma garota poderia querer? Um cheiro forte e sufocante, que ela não conseguia identificar, empesteou o ambiente a sua volta, ela sentiu muito sono e sua visão foi se desfazendo em imagens borradas, como num quadro expressionista, e ela desmaiou.

Quando Isabel acordou, estava bem amarrada a uma cama que se assemelhava a uma cama de hospital. Ela estava sozinha em uma sala feia, de aspecto sinistro, com paredes escuras e uma luz vinda do teto incidia sobre ela. Suas roupas haviam sido trocadas por um bata comprida e branca. Ela percebia que uma substância viscosa havia sido posta em algumas partes de seu corpo. Tudo estava de acordo com uma abdução normal. Tudo corria como o esperado e ela estava ansiosa por conhecer seus sequestradores. Isabel esperava que, a qualquer momento, entrassem no recinto os homenzinhos verdes ou cinzas, baixinhos, cabeçudos, carecas, de olhos grandes, braços e pernas fininhos, de aspecto frágil e afeminado por que essa é a espécie mais comum de ET's e sabe-se que são pacíficos. De repente, ela ouviu uns passos rápidos e barulhentos no corredor, passos que mais pareciam um trote rápido como se fossem de um cavalo ou pônei, e eis que entra um monstro que era, literalmente, um inseto gigante de aspecto repulsivo como uma barata, apesar de se parecer mais com uma formiga. A garota tremeu de medo e começou a gritar, a plenos pulmões, esperando que os homenzinhos verdes viessem salvá-la. A criatura também se assustou com aquele grito e foi correndo avisar ao seu superior que a “hospede” havia acordado. Entrou na sala outro “formigão” maior e de aparência mais exótica do que o primeiro. Isabel começou a gritar de novo e, em pânico, contorcia seu corpo na vã esperança de libertar-se das amarras. A coisa tentou falar com ela para acalmá-la. O “formigão” falava português com um sotaque esquisito, ele não pronunciava bem as preposições e conjunções e isso era um pouco engraçado. Demorou uns trinta minutos até que Isabel ficasse calma, parasse de gritar e estivesse em condições de conversar.

Acalmada e consciente de que os “formigões” não a devorariam ou esquartejariam, ela começou a pensar. A garota ainda se lembrava de um pouco de biologia que aprendera na escola e observou que seus algozes, ao contrário dos insetos do planeta Terra que têm três pares de patas para a locomoção, tinham o primeiro par de patas modificado em “braços” cujas pontas funcionavam bem como mãos possuindo, cada uma delas, quatro prolongamentos ou “dedos”. Eles andavam em quatro patas (o que explicava o barulho de trote que ela ouvira antes) e tinham dois braços que não se pareciam com membros humanos pois, possuíam mais articulações e eram bem fortes. Isabel não conteve sua curiosidade e pergunto: “Vocês têm pulmões?”, ao que o inseto alienígena respondeu: “Sim, nós temos e vejo que você é uma garota inteligente, pois é a primeira prisioneira que faz essa pergunta. Na verdade são os nossos pulmões que nos permitem ser tão grandes e inteligentes. Os insetos da terra não têm pulmões e por isso são pequenos e nada inteligentes.” O diálogo prosseguiu:
Isabel: “Oba! Eu sou inteligente. Já haviam me dito isso, mas vindo de um ET, que viajou através da galáxia, soa ainda melhor. E por falar em ET's, cadê os outros?”
Inseto gigante: “Que outros?”
Isabel: “Os verdinhos, baixinhos, afeminadinhos.”
Inseto gigante: “Nós pertencemos a uma espécie diferente, de outro planeta, sabemos da existência desses outros, mas já faz um bom tempo que não temos notícias deles.”
Isabel: “E seu nome qual é?”
O “formigão” emitiu uns ruídos que Isabel não conseguiu imitar e, por fim, pediu que ela o chamasse apenas de Valdo por que esse era um nome humano que ele havia escolhido para facilitar a sua comunicação com pessoas. E a conversa prossegue:
Isabel: “Muito bem sr. Valdo, já terminou sua pesquisa? Já posso ir? Me desamarre logo que esses grilhões me incomodam. Onde está meu celular? Eu gostaria de tirar umas fotos de vocês alienígenas para colocar no livro e no site. Imagine o sucesso que isso vai fazer na rede social? Não sei se o senhor sabe, mas eu vou ficar muito rica por causa dessa abdução, vou escrever um livro, dar entrevistas para TV e não deve demorar que façam um filme e uma série para a TV.”
Inseto girante: “Sinto muito informar, mas isso não vai acontecer.”
Isabel: “Por que não?”
Inseto gigante: “Isso é uma história longa. Nós conversaremos mais tarde.”
Isabel: “Oh não! De jeito nenhum! Vá falando logo. Não quero esperar.”
Inseto gigante: “Minha cara, Isabel …”
Isabel: “Como sabe o meu nome?”
Inseto gigante: “Lemos teus documentos enquanto estavas desacordada. Nós sabemos falar e ler em português. Como eu ia dizendo, somos uma espécie muito adiantada de insetos coloniais. Por milhões de anos evoluímos de insetos primitivos semelhantes às formigas da Terra. Você deve conhecer a vida dos insetos coloniais de seu planeta como abelhas, formigas, cupins e vespas. Você já deve ter observado que a sociedade deles é perfeita. Todos são filhos e filhas de uma única rainha-mãe que põe dúzias de ovos todos os dias. Esta sociedade é perfeita por que todos são irmãos e irmãs, literalmente da mesma família. Uma sociedade sem criminosos, sem injustiça social, sem desigualdade social e sem conflitos políticos. Tudo sempre em paz e em ordem. Nossa sociedade é assim e estamos tão bem que decidimos compartilhar esse bem com vocês humanos. Viemos do outro lado da galáxia até aqui para ajudá-los a ter uma civilização tão pacífica e próspera quanto a nossa.”
Isabel: “E como vão fazer isso?”
Inseto gigante: “Vamos transformá-los a nossa imagem e semelhança. Vamos fazer de seu planeta um imenso formigueiro humano.”
Isabel: “Continuo não entendendo.”
Inseto gigante: “Vamos fazer com que os humanos das futuras gerações sejam todos irmãos biológicos.”
Isabel: “Mas isso é impossível, uma mulher jamais poderia parir milhares de filhos como uma formiga rainha.”
Inseto gigante: “Por enquanto não.”
Isabel: “Como assim? Não estou entendendo nada.”
Inseto gigante: “Ora, minha cara, a nossa ciência é avançadíssima. Temos tecnologia genética, nanorrobótica, farmacológica e cirúrgica que vocês nem poderiam sonhar. Nós vamos, pouco a pouco, geração após geração, transformando algumas mulheres até desenvolvermos uma nova espécie cujas fêmeas sejam capazes de parir às centenas, como fazem as nossas rainhas mães formigas. Isso parece impossível, mas nós já conseguimos avanços impressionantes que nos fazem acreditar que nos próximos cem anos a nova espécie já estará pronta para povoar a Terra. Nós já conseguimos reduzir, consideravelmente, o tempo de gestação e também conseguimos que as mães tivessem sêxtuplos a cada gravidez. Apenas algumas horas depois do parto nós já fecundamos novamente a mãe para que ela engravide de novo. Uma de nossas garotas até bateu um recorde parindo setenta e dois bebês saldáveis em apenas um ano. Com você pretendemos chegar a noventa e seis por ano. Você é jovem, bonita, bem saudável, uma bela reprodutora. Você deve durar uns bons cinco anos antes que seu corpo exausto chegue a óbito, mas não se preocupe, até lá você terá centenas de filhos dos quais se orgulhar.”

Isabel finalmente entendeu o destino que a aguardava e reagiu com uma fúria que ela nunca tivera antes. Ela gritava, contorcia seu corpo furiosamente querendo se libertar, agitava energicamente a cama e espumava pela boca como um cão raivoso, nesse estado ela deve ter ficado uns dez ou quinze minutos só xingando e gritando. Valdo esperou, pacientemente, que ela se acalmasse e lhe ofereceu uma bebida que era adocicada e morna e foi servida em um copo com canudinho por que as mãos dela estavam amarradas. E o bicho voltou a falar: “Eu entendo que esteja furiosa agora, mas você é fêmea e eu tenho fé que os seus instintos maternos farão você muito feliz e desejosa de parir cada vez mais.” Essa frase infeliz deflagrou outro ataque de fúria ainda pior do que o primeiro e foi necessário ainda mais tempo para que ela se acalmasse de novo. Valdo encolheu todas as seis patas envergonhado com a gafe que dera. Outro inseto, que era de outra casta e de tamanho menor, entrou nesse momento. Ele veio perguntar se deveria ministrar uma dose de sonífero ou ansiolítico à “paciente” para acalmá-la. Valdo disse que não seria necessário e dispensou seu ajudante. A garota estava desesperançada e também exausta, mais por causa choque psicológico do que o esforço físico. Ela estava naquele estado, em que não havendo mais o que fazer diante de tamanho desespero, fica-se apático, calado com olhar distante. O inseto tinha dificuldade de entender as expressões faciais humanas e as emoções que elas representam por que os invertebrados não as tinham. Valdo ficou ali pensando se deveria falar mais alguma coisa. Não queria tratá-la mal, apesar de já tê-lo feito várias vezes. Ele ia dizer a Isabel que ela deveria se orgulhar de ser uma das pioneiras que sacrificaram suas vidas para um bem futuro da humanidade mas achou melhor calar-se. Ela falou com voz fraquinha: “Eu não vou colaborar com nada disso, eu não sou disso, vocês vão ter que me soltar” ao que o inseto respondeu: “Não podemos soltá-la por que esse negócio de abdução é muito complicado, temos que aproveitar bem os que capturamos. Além disso, temos inúmeras maneiras de convencê-la ou forçá-la a colaborar. Podemos tentar técnicas psicológicas ou drogá-la, torturá-la, fazer lavagem cerebral, lobotomia etc… E se tudo isso falhar podemos remover cirurgicamente uma grande parte de seu cérebro deixando-a incapaz de reagir.” Nesse momento o inseto se debruça sobre ela e diz, ameaçadoramente: “Não reaja, não reaja por que há muito sofrimento para as que reagem.” Depois disso Valdo chamou seu subalterno e ordenou-o que levasse a garota para os laboratórios. E ela foi levada, amarada à cama que flutuava no ar enquanto era empurrada por um inseto, para cumprir a missão reprodutiva que cruelmente lhe impuseram.
Duarte Cosaque
Enviado por Duarte Cosaque em 12/06/2016
Reeditado em 12/06/2016
Código do texto: T5664688
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