A JOIA
 
I
 
            Quando tudo começou? Foi certamente bem antes daquela exposição no museu da cidade, o evento magnífico no museu atraíra um grande número de turistas, muitos eram pessoas comuns encontradas no dia a dia desta cidade Londrina, enquanto outras em menor número, eram tipos estranhos ligados de alguma forma a secretas e obscuras seitas ocultas.
            Entre as numerosas pessoas ainda estavam uns poucos arqueólogos profissionais e abastados colecionadores de artefatos antigos, porém notava-se que a maioria dos visitantes no museu tratava-se de curiosos vindos de todos os cantos do mundo.
Aquela multidão queria ver a joia rara, descoberta há séculos numa escavação nas ruínas de uma das cidades mais antigas do mundo.
            A fabulosa pedra exposta estava protegida por uma redoma de vidro a prova de balas, o objeto reluzia e pulsava na pequena caixa de chumbo aberta, acompanhada do pergaminho de papiro milenar emoldurado ao seu lado.
            De certo modo o homem alto do oriente médio próximo da fascinante pedra lembra como se fosse ontem, seu semblante sisudo e olhar soturno e frio contemplam as pessoas passarem e olharem com espanto e admiração.
A turba que passava para ver tal pedra fosforescente simplesmente ignorava o pequeno aviso ao lado da redoma.
Não toque! Era o aviso. Mas muitos visitantes simplesmente não resistiam e tentavam tocar a joia cercada pela impenetrável cúpula.
Mas se eles soubessem a verdade… ficariam, com certeza, bem longe daquela gema maldita.
 
Os fatos estranhos começaram há alguns meses, antes dessa tão aguardada exposição.
            Tudo corria bem até aquele incidente no hotel.
Ninguém sabe como começara, sem dúvida foram muitos os hóspedes de quartos vizinhos que ouviram os gritos apavorantes vindos do quarto 320 do luxuoso resort próximo ao museu.
Foram alguns minutos de barulheira, quebrando a monotonia daquela noite sem lua. Os sons ruidosos de forma misteriosa duraram pouco tempo, logo cessando e tudo ficara silencioso no quarto.
Apesar de breves os instantes que se passaram entre aqueles acontecimentos macabros, logo fora chamada a ambulância do socorro médico para atender aquele chamado urgente.
            A noite estava estranha, não havia chuva apesar dos esporádicos relâmpagos coruscantes, acompanhados de sonoros estrondos de trovões ribombarem na alta atmosfera do céu escurecido.
             A mulher cujo nome excêntrico chamara a atenção do recepcionista: Gertrudes Piedade Zimmer era de nacionalidade portuguesa e se hospedaria por duas semanas.
            O rapaz do plantão noturno era identificado por um crachá, destacando apenas seu primeiro nome de origem alemã.
 Siegfried tinha mais ou menos vinte seis anos, era um homem alto, cabelos pretos, rosto quadrado e olhos azuis e, trajava roupas de trabalho na ocasião, calça azul, colete da mesma cor e uma camisa branca, fora ele o responsável pelo chamado, depois de ouvir uma ligação nervosa e apavorada vinda do quarto vizinho onde aconteceram aqueles fatos.
            Até mesmo os dois incautos bombeiros ficaram assombrados quando retiraram o corpo, nunca tinham presenciado cena tão horrenda.
            Daquele momento em diante o quarto da vítima ficara isolado por fitas pela polícia, lacrado até os técnicos periciarem o local na manhã seguinte.
Fora talvez, o ruído das estridentes sirenes e as luzes ofuscantes da ambulância e de uma viatura policial que causaram certo pânico em um bêbado e duas prostitutas que passavam em frente ao hotel naquele momento inoportuno.
Foi possível notar disse uma das moças que a mulher na maca estava desfigurada, e parecia mais um esqueleto humano.
Assustadoramente a vítima era pele, cabelo e ossos sendo levado debaixo daquele lençol branco.
            — Que crime pavoroso! — Dissera a outra moça.
            Naquela mesma noite, o recepcionista não se conteve, e fora investigar o quarto.
Pedira sigilo antes de incumbir o mensageiro para que tomasse conta por um instante da recepção, enquanto subiria ao terceiro andar usando o elevador de serviço, indo até o quarto, de onde os bombeiros haviam retirado à vítima totalmente desfigurada.
Que horrores terríveis ele encontraria?
            O delegado com certeza o chamaria para depor na manhã seguinte, pensou Siegfried enquanto subia pelo elevador, era óbvio que teria de dar explicações sobre a mulher e sobre os fatos assombrosos ocorridos naquele quarto fúnebre.
            O luxuoso quarto no terceiro andar ficara daquele momento em diante fechado para afastar curiosos, o andar inteiro fora isolado e os hóspedes movidos de lá.
            Mas o que acontecera naquela madrugada?
            No momento em que a hóspede chegara tudo parecera normal, a mulher fez o seu check-in, os mensageiros levaram as malas e acompanharam a bela Gertrudes até seus aposentos e logo em seguida voltaram, não havia nada de estranho nos seus modos, a moça era morena de cabelos encaracolados, rosto redondo e olhos negros, trajava um conjunto preto calçando salto alto, estava muito elegante.
Só uma coisa chamara a atenção, foi o sotaque – falava um português arcaico, parecendo ser de outra época.
            O apartamento no terceiro andar, com uma suíte e mais dois quartos fora isolado pelas autoridades, porém o cartão magnético que ficara na recepção estava agora nas mãos do curioso recepcionista.
Após sair do elevador, Siegfried caminhou furtivamente alguns passos e logo se deteve diante da porta do quarto, aparentemente estava tudo normal por fora – um pouco temeroso adentrou o recinto escurecido acendendo uma das luminárias. Notando rapidamente que o luxuoso quarto de hotel estava uma bagunça, com móveis quebrados, lustres destruídos e roupas espalhadas.
            Em seguida observou uma curiosa iluminação que brotava da suíte, a estranha luminescência parecia diminuir e aumentar a claridade. Siegfried respirou fundo e tomando coragem avançou, se desviando dos destroços espalhados de alguns moveis e estilhaço de vidros quebrados, assombrado com o estado do quarto chegou vagarosamente à porta da suíte entreaberta, sentiu um asco ao ver aquela coisa gosmenta que escorria pela porta parecendo ser um líquido escuro e viscoso.
            Diante de tudo aquilo que observara nada se comparou o que seu olfato apurado sentira, da suíte emanava um odor intenso e fétido, o cheiro fora do comum forçou o rapaz a usar um lenço para tapar o nariz.
            De repente aquele mau cheiro mudou, se tornara ainda mais intenso quase lhe provocando vômito, ele se conteve, seu diafragma se contorcia na ânsia, aguentou firme, cerrando os olhos se manteve imóvel alguns segundos tentando manter o autocontrole. Em seguida com passos calculados adentrou a porta da suíte na direção da estranha claridade, defendendo os sapatos da gosma que se propagava no piso brilhoso.
            Aquele cheiro de morte se dissipara de repente, aquilo o fez se livrar do lenço percebendo que não havia mais nenhum odor dentro do quarto.
De onde estava via as malas da mulher sobre a cama abertas e vazias, e as roupas da vítima todas espalhadas pelo chão, inclusive peças íntimas que de algum modo chamou sua atenção.
            Logo sua atenção se voltou para a parede branca com figuras e marcas estranhas. Ele teve um sobressalto quando viu o borrão escuro que mudava de forma constantemente, talvez devido aquela frouxa claridade no canto do quarto. De algum modo à fraca fosforescência carmim refletia a mancha escura, fazendo que a mesma assumisse uma forma estranhamente esfumaçada dando a impressão de ser projetada por aquela estranha e pulsante luz avermelhada.
            Aproximando-se com certa cautela, ficou pensativo por alguns segundos, fixando os olhos tentando descobrir que estranha e nebulosa imagem era aquela, gravada de alguma forma na parede branca. Por um instante ele fora remetido em pensamentos ao momento que entregara a mulher o cartão do quarto, desejando gentilmente a ela uma boa estada, tentando de alguma forma entender aqueles acontecimentos funestos e sobrenaturais, no entanto aquilo tudo o fez duvidar do trágico destino da bela hóspede.
            Uma folha amassada sobre um criado-mudo lhe chamou a atenção, não parecendo ser um tipo de papel que se encontra habitualmente em papelarias, parecia ser papiro, uma folha de papiro amassada, seus olhos brilharam de curiosidade, cuidadosamente desamassou e leu, mas não entendeu, pois parecia que as letras estavam embaralhadas em uma espécie de código.
            Alguns minutos já haviam passado e ele ainda não entendera o que teria acontecido, uma coisa era certa pensou consigo, algo terrível tinha passado por ali naquela noite.
            No canto do quarto aquela luminosidade fosforescente refletia a figura esfumaçada na parede, a luz ignota vinha de uma pedra que de alguma forma se revestia de um brilho hipnótico, parecia ser muito valiosa pensou o recepcionista, de um modo peculiar aquilo aguçou a sua recalcada avareza.
            Ele avançou cuidadosamente, curvando o corpo apanhando a pedra fosforescente.
            Era uma pedra pequena, cabia na palma da mão, mas que emitia um brilho incomum e pulsante.
Algo aconteceu quando ele a tocou, com seu toque a joia começara a brilhar intensamente como se tivesse vida própria.
            O jovem teve um sobressalto ao sentir seu braço tremer, alguma coisa parecera sugar suas energias através daquela estranha fosforescência, forçando seus músculos de tal maneira que deixara a pedra cair sobre um tapete grosso e aveludado onde seus sapatos quase afundavam.
            Ele se afastou um pouco olhando com espanto para a joia que diminuíra o brilho quase se apagando, notando de relance uma pequena caixa metálica próxima da cama.
            Um temor mortal se apossou do rapaz ao ver que a figura na parede parecera se contorcer e assumir uma forma um pouco mais nítida depois que tocara a joia.
             Apesar do espanto Siegfried avançou e curvou-se para apanhar a caixa misteriosa caída próxima da cama, era uma pequena caixa parecendo ser feita de chumbo, e teve certeza disso quando verificou o seu peso chegando à conclusão que era mesma feita do material isolante, com certeza era para acondicionar aquela pedra misteriosa em segurança.
            Não se sabe se fora por instinto ou por alguma força misteriosa pairando no ar naquele momento, o jovem pegou a joia rapidamente colocando-a na caixa, e fechando rapidamente.
            Em seguida ficando assombrado quando diante dele aquele borrão na parede de alguma forma desaparecera, se apagando diante de seus olhos arregalados, a parede branca ficara limpa e ainda mais branca com se tivesse levado uma segunda mão de tinta.
            Já estava quase amanhecendo quando resolveu abandonar aquele quarto, sairá furtivo carregando a caixa com a joia e o papiro amassado, mas o que diria ao chefe de polícia quando fosse chamado para depor sobre os fatos acontecidos naquela madrugada, certamente diria que não sabia de nada.
            Dois investigadores periciaram o quarto na manhã seguinte, perscrutaram todos os cantos, buscando pistas, para tentar explicar aquele fato fora do comum, porém, mesmo assim não conseguiram definir o motivo da “causa mortis” da ocupante do quarto naquela madrugada, nenhuma pista fora encontrada.
            Estes fatos os levaram a convocar as testemunhas para depor.
            Aqueles interrogatórios aconteceram no dia seguinte, foram três horas de depoimentos.
            Os primeiros a dar suas declarações sobre os fatos foram os ocupantes de quartos vizinhos, assombrados afirmaram apenas que teriam ouvido gritos e uivos apavorantes, seguido de muito barulho, parecia que um terremoto acontecia dentro do quarto, mas ninguém teve coragem de investigar, deixando isso para os policiais e bombeiros.
            A conclusão depois de exaustivos depoimentos cercados de poucas provas, fora que a mulher simplesmente havia murchado como uma planta, parecendo que sua energia vital havia sido sugada de alguma maneira sobrenatural.
            No entanto, isto não era uma explicação plausível e, o juiz resolveu de acordo com laudos e a perícia médica encerrar o caso.
            Certamente foi desconsiderado o estado de extrema magreza do cadáver encontrado e o caso se deu por encerrado, ou talvez abafado.
De maneira velada baseando-se talvez em lendas, alguns jornalistas sensacionalistas não conseguindo informações sobre o caso devido a muitos fatos obscuros, diziam que alguns advogados envolvidos no caso pertenciam a uma estranha seita, da qual o juiz também faria parte, até mesmo o médico que de forma totalmente esdrúxula assinara o óbito, faria parte daquele culto mítico.
            O motivo alegado da “causa mortis” fora inconclusivo, não conseguindo dar nenhuma explicação esclarecedora para o estado do corpo, o laudo pericial em termos técnicos dizia grosseiramente que a mulher de nome Gertrudes Piedade Zimmer, morena de trinta e dois anos, natural de Lisboa – Portugal tivera vários ataques cardíacos consecutivos e não tinha resistido.
 
 
 II
 
 
            Alguns dias se passaram esfriando as lembranças daquele caso.
            No hotel muitos funcionários ainda murmuravam sobre os fatos inomináveis ocorridos no misterioso quarto do terceiro andar, inclusive quando um homem de pele escurecida, parecendo ser do oriente médio chegara.
O sujeito era incomum, magro com estatura acima da média, deveria ter quase dois metros de altura, usava uma roupa totalmente preta e um estranho chapéu tipo kipá da mesma cor da roupa. Um intérprete o seguiu até o quarto para recolher os pertences da mulher morta.
            Ao voltar o estrangeiro começou com certos interrogatórios, ele perguntara sobre um pergaminho, perguntara sobre uma pequena caixa de chumbo com uma pedra fosforescente, mas ninguém soube responder.
Siegfried também dissera que não sabia de nada, e que não estava naquela noite.
            Diante dessas circunstâncias o intérprete disse enfático, traduzindo o diálogo sussurrado pelo homem de pele escura e olhar soturno, avisando sobre os perigos que estavam correndo caso estivessem escondendo algum fato, era de extrema importância que fosse revelado o paradeiro da caixa com a pedra e do pergaminho o mais rápido possível, isto poderia evitar muitos aborrecimentos, com certeza, fatais.
            Antes de ir em direção à porta da saída, o homem do oriente proferiu algumas palavras ameaçando o recepcionista, dizendo que a pedra era perigosa e atraia um mal que ninguém poderia controlar e, se por acaso encontrassem a caixa e o pergaminho que procurassem por ele imediatamente, completando com a seguinte frase numa língua desconhecida.

 “yataeallaq al'amr eindama aintafa'at alainwar laja'at sbe marrat raghabat stt 'annah 'aetaa w alssabie hayatah lm tattakhidh ay wahid yumkin alhurub min alzzalam”

Imediatamente traduzida pelo intérprete.
 
-< “Ele vem quando as luzes se apagam, sete vezes o invocará, seis desejos ele concederá e na sétima sua vida tomará ninguém consegue escapar da escuridão” >.
 
            O jovem recepcionista já havia tocado na joia, era ambicioso demais para cair naquele conto fantástico e nas ameaças sem fundamento do estrangeiro. Afinal, ele não sabia se estavam falando a verdade ou blefando, pagaria pra ver e, de certo modo esta noite quem sabe acabasse descobrindo o terrível segredo da pedra fosforescente.
O contato com a joia de algum modo o enfeitiçara.
            Aqueles dois homens foram embora levando os pertences da mulher, cujo trágico destino, somente o misterioso homem alto do oriente sabia.
Eles ficaram pouco tempo em frente do luxuoso hotel, até que um carro preto de vidros escurecidos veio e os levou.
            No dia seguinte aquele recepcionista não apareceu para o trabalho, nem no outro, portanto faltara ao trabalho por dois dias consecutivos. O gerente do hotel, preocupado com a falta repentina de seu funcionário fizera uma denúncia junto ao órgão policial, dissera que o rapaz era de outra cidade e, não tinha parentes próximos.
            Um investigador fora até o apartamento do rapaz para uma investigação de rotina, ele também procurava pistas de objetos reclamados por certo estrangeiro do oriente médio, em posse de determinada hospede falecida tragicamente há algumas semanas no mesmo hotel.
            Siegfried morava na periferia numa quitinete em um prédio de seis andares, para o policial aquilo seria apenas uma investigação rotineira.
            Quando chegou diante do prédio, não havia ninguém na recepção, isso permitiu sem maiores problemas que o policial à paisana subisse pelo elevador principal.
            O rapaz morava no número 305 dissera o gerente, e nunca havia faltado ao trabalho. Aquelas lembranças fizeram o investigador tomar certa cautela, ele ficara um pouco inquieto enquanto saia do elevador e, muito mais ansioso ao ouvir algumas pessoas comentarem sobre gritos e uivos apavorantes seguidos de muito barulho vindos do número 305 na noite passada.
            Logo avistara o quarto no final do corredor sombrio, a maioria das luminárias estava apagada ou talvez estivessem queimadas e, somente uma delas, clareava fosco com uma luz fraca e falhando aquele corredor imundo.
            Chegou rapidamente ao apartamento, tocara a campainha muitas vezes, depois de muita insistência fora atendido pelo jovem recepcionista.
            O investigador não o conhecia, entretanto fora uma foto mostrada pelo gerente que o fez notar imediatamente que os seus cabelos haviam mudado, estavam mais compridos e com um tom um pouco mais escuro que o normal, achando aquilo demasiado excêntrico, não teve com esconder seu espanto.
            A profissão exigiu que o investigador entrasse e fizesse algumas perguntas.
Notou de início que o rapaz parecia falar com um sotaque estranho, parecendo ser um português arcaico.
Aquilo chegou a intrigar o investigador, no entanto, depois que as perguntas que fizera foram respondidas de forma perspicaz pelo jovem culto, durante os dez ou dose minutos de perguntas, ele chegou a comentar sobre uma pequena caixa de chumbo com uma pedra fosforescente, a qual pertencia à vítima hospedada no hotel, e sobre certo pergaminho reclamado como pertencentes à mulher morta.
Explicou também que um homem alto de pele escura e olhar soturno, parecendo ser do oriente médio, viera umas duas ou três vezes ao hotel reclamando o desaparecimento dos tais souvenires, insistentemente acusara o rapaz de tê-los roubado, principalmente agora que soube do seu abandono do emprego no hotel.
            O jovem exaltado negou sistematicamente saber o paradeiro de tais peças, todavia alegou ser seguido por tal homem de tez escura e olhar soturno. Queria registrar queixa contra o tal sujeito.
            O investigador ficara sem saída sendo obrigado a registrar tal ocorrência e, não encontrando nenhuma prova do sumiço das peças milenares, foi convidado a se retirar do quarto.
            Enquanto o investigador seguia pelo corredor sombrio não notou que o jovem, com um olhar sorrateiro em sua face sinistra o observara pela fresta da porta entreaberta, logo em seguida a fechando silenciosamente.
 
 
III
 
 
            Algumas semanas mais tarde, houve uma ocorrência policial num paraíso turístico, determinada ocorrência enfatizava sobre certos fatos horríveis ocorridos no quarto onde um rapaz acompanhado de três mulheres se hospedara.
            O boletim descrevia que o quarto de hotel ficara em destroços, e os corpos encontrados no local estavam irreconhecíveis.
Segundo a perícia, foram encontrados deitados sobre a cama os cadáveres esqueléticos de três mulheres, eram pele e ossos amontoados, com se propositalmente tivessem sido empilhadas.
            A perícia teve sérias dificuldades devido ao fedor pútrido que exalava dos corpos não permitindo a entrada, a não ser com um tipo especial de máscara contra gases, porém aquele jovem que acompanhava as moças não fora encontrado, desaparecera do local.
Foi nesse mesmo local que notaram a presença de um homem alto de pele escurecida e olhar soturno, alguns funcionários interrogados pela polícia disseram que o homem estava investigando o paradeiro de antiguidades valiosas, roubadas de sua coleção particular há cinco meses, ele tinha certeza que o rapaz hospedado naquele hotel era o ladrão, entretanto o tal homem também havia sumido.
Especuladores gratuitos afirmaram que o sujeito de tez escura e com um estranho chapéu na cabeça era pertencente a alguma seita proibida da qual muito pouco se ouvira falar, sabiam apenas que alguns ricaços e seletos bilionários faziam parte.
            O mesmo policial que investigava o paradeiro do rapaz e, que registrara queixa contra o estrangeiro do oriente médio acusado de perseguição, fora contratado pelo mesmo homem do oriente em troca de uma considerável soma em dinheiro, para seguir o ex-recepcionista de hotel em todas as suas andanças e viagens, agora muito rotineiras.
Não se sabe como, mas de um modo não muito convencional, Siegfried começara a investir na bolsa de valores e muitos outros investimentos lucrativos, ganhando uma fortuna em muito pouco tempo.
            Tanto ganhava dinheiro como gastava em festas e orgias desenfreadas, viajando por quase todo o continente, sendo alvo de minuciosa investigação durante meses.
            Até que em certa noite quando se hospedara num hotel cassino, numa grande e famosa cidade da costa oeste americana.
            Enquanto saia de uma limusine, muito bem-vestido com roupas refinadas, parecendo ser uma celebridade, estava muito bem acompanhado de duas mulheres esculturais, lindas e jovens.
Ele chegou a ser abordado pela polícia local na porta de entrada do luxuoso hotel cassino, devido ao conhecimento de alguns fatos secretos sobre o jovem.
Tais fatos estariam em segredo de justiça, e de algum modo era sabido por certo investigador, e por um estrangeiro do oriente médio.
            Os policiais não foram explícitos na abordagem, entretanto tinham certeza que aquelas beldades seriam mais duas de suas vítimas, era certo que seria preso, mas a polícia não tinha provas conclusivas e somente fez algumas perguntas tipo quanto tempo ficaria hospedado ali, armando de certa forma uma tocaia para pegá-lo.
            Aquela noite passou sem muitos sobressaltos, os investigadores ficaram vigiando no hotel até o amanhecer.
Assim que o dia clareou, notaram as duas mulheres companhias do tal jovem saindo a passos apressados, elas pareciam estar muito pálidas e com o aspecto horrível de magreza, talvez nenhuma dieta existente fizesse com que elas perdessem tanto peso em apenas uma noite, desconfiaram daqueles fatos, e teriam agora atenção redobrada sobre o jovem turista, já que ficaria ali uma semana.
            Qualquer fato fora do comum, com certeza, ele seria o acusado.
            Por incrível que pareça aquela semana passou, e nada de estranho acontecera, talvez acuado pela polícia o jovem passasse a controlar seus instintos.
            No fim de semana seguinte, em certa noite, Siegfried se divertiu muito nos jogos de azar, ganhando muito dinheiro na roleta, parecia que uma sorte eterna o acompanhava – não errava uma jogada.
            Os seguranças do tal hotel cassino desconfiaram de tanta sorte.
            Aquilo tudo mudou quando subiu para o seu quarto muito bem acompanhado de duas lindas mulheres, não eram as mesmas da última semana, uma delas parecia ser de origem alemã, enquanto a outra talvez fosse de nacionalidade francesa com descendência africana.
            A polícia local com a ajuda de certo investigador e um homem do oriente médio conseguiu pegá-lo no hotel cassino, foi exatamente conforme contou o queixoso homem alto de olhar soturno, na sétima vez que invocasse o poder da joia roubada, o jovem astuto teria uma surpresa fatal, a mesma surpresa que teve a mulher portuguesa há cinco meses.
            Naquela madrugada, depois de um denuncia de perturbação da ordem feita por um hóspede próximo ao quarto do rapaz, as coisas pareceram se repetir como em todas as outras vezes, o hóspede que por sinal era americano do estado Rhode Island relatou com voz trêmula ouvir gritos apavorantes e uivos assustadores e muito barulho vindo daquele quarto.
            Quando os policiais chegaram ao apartamento não havia muita coisa a se fazer pelo jovem, o cheiro de morte já dominava a suíte do luxuoso quarto, um líquido escuro e viscoso escorria pela porta da suíte aberta.
            Os policiais empalideceram de pavor cobrindo o nariz com máscaras quando sentiram aquele cheiro terrível de carne apodrecida.
            Com espanto viram o rapaz e aquelas duas mulheres que o acompanhava, a cena era quase indescritível.
Elas agora não passavam de dois cadáveres seminus debruçados no colo de Siegfried, as caveiras murchas com as bocas escancaradas pareciam gritar de pavor, no rosto zumbi os olhos estavam opacos, sem vida, enterrados nas cavidades fundas do crânio onde só restava a pele enrugada, mas, mesmo assim, pareciam arregalados para a parede.
            Siegfried também estava seminu, porém, usava uma estranha túnica negra com capuz bordada com várias figuras de luas minguantes.
            Acomodando-se quase encurvado numa poltrona, olhava para a parede com os olhos sem vida fora das órbitas, seu corpo murcho e esquelético estava ao lado do pergaminho amassado e, de uma caixa de chumbo cuja joia fosforescente em seu interior ainda emitia um brilho pulsante.
            Na parede bruxuleava uma forma estranha parecendo um borrão se contorcendo, talvez algum ser vindo das profundezas de algum abismo inominável, porém parecia satisfeita, pois a sua figura horrenda e esfumaçada demonstrava um sorriso grotesco e disforme.
            A terrível figura escurecida sumiu da parede branca quando o homem do oriente chegou fechando abruptamente a pequena caixa de chumbo.
            Ele recolhera a caixa e o pergaminho, dissera aos policiais que eram de sua propriedade aqueles objetos, cuja existência remonta antes mesmo do afundamento da Atlântida e o surgimento do ser humano.
            O sujeito de olhar soturno foi obrigado em seguida a dar um depoimento à polícia explicando que aquela pedra estava com sua família há vários séculos, tais objetos antigos foram encontrados numa escavação próxima as ruínas da mitológica babilônia.
            Esclarecendo ainda que aquelas peças ancestrais eram parte de uma exposição de antiguidades que faria no museu da cidade, ele cedera às peças para o museu expor.
            De alguma forma o homem do oriente médio, sendo ele o sacerdote daquele culto pouco conhecido, frequentado anonimamente e amiúde por seletos homens de negócios, ricaços e celebridades de várias partes do mundo, sabia como controlar a joia amaldiçoada.
            Nem Gertrudes e muito menos Siegfried tiveram a mesma sorte, suspeitava-se que tudo aquilo de algum modo tenha sido premeditado, se isto era mesmo verdade ninguém sabe, apenas que os laudos de todas as mortes foram inconclusivos e abafados por pessoas muito influentes. De algum modo tudo levava a crer numa teoria da conspiração, especuladores e jornalistas fanfarrões acreditavam que todas as vítimas não passavam de bodes expiatórios da seita macabra.
Há relatos sobre este culto secreto em antiquíssima lenda que muitas vezes sacrifícios têm que ser feitos para que o culto floresça, entretanto, se fora sacrifício ou acidente, uma coisa era certa, quem toca a pedra fosforescente, não resiste às revelações e as promessas que o amaldiçoado gênio que vive em seu interior faz a suas vítimas.
 Talvez o que aquele sacerdote não previu foi que o curioso recepcionista roubaria as peças antes de sua chegada para recolhê-los.
            A polícia não sabia dessa versão dos fatos, o homem do oriente médio estava ali para levar a gema de Hotep em segurança para o museu, onde seria mostrada a novos seguidores da maldita seita.
Secretamente um policial recebera uma ligação de alguém muito importante, ele ficou afastado falando ao telefone por alguns minutos e quando voltou assustou alguns dos seus subordinados, tomando atitudes nenhum pouco condizente com a conduta de uma investigação. Liberando o homem de tez escura e consentindo que ele levasse as peças estranhas para o museu, devido ao simples fato de ter registrado ocorrência de furto.
Alguns jornais locais destacaram em primeira página o caso estranho acontecido naquele quarto do hotel cassino, porém a maioria das informações fora abafada por pessoas muito poderosas, até as fotos da perícia sumiram de forma misteriosa.
            Alguns dias depois houve uma exposição no museu da cidade, acompanhada da presença de alguns arqueólogos e de muitas celebridades e artistas, entre eles: famosos pintores, opulentos astros de cinema, abastados senadores, ricaços de todos os cantos do mundo e, numa redoma a prova de balas havia uma caixa de chumbo aberta mostrando uma joia reluzente pulsando no seu interior, o pergaminho emoldurado ao seu lado explicava como a joia poderia ser usada para satisfazer desejos infinitos, mas o idioma nela era muito antigo, talvez somente um mago do antigo continente afundado da  Atlântida saberia decifrar.
Seria possível se aqueles antigos magos de alta estatura e pele escurecida, com olhar soturno como os dos deuses antigos ainda estivessem entre nós.
Ninguém conseguiria tocar a gema amaldiçoada, talvez leve alguns anos, até que o grotesco Djim que habita o mundo paralelo existente no interior da gema exigisse outros sacrifícios humanos.
Certamente o guardião da gema, aquele homem alto do oriente médio se certificara da extrema segurança que deveria ter sobre aquele artefato antiquíssimo, e dos perigos que ele representava se caísse em mãos erradas sem noção do monstro ignoto que vive dentro da pedra fosforescente, e acima de tudo proteger o culto secreto do qual era a autoridade máxima.
 Próximo à redoma a provas de balas onde a pedra fosforescente era exposta, havia dois policias de guarda, e próximo a eles um sujeito cujo nome era muito conhecido no mundo das celebridades e das pessoas mais influentes da terra, inclusive alguns presidentes de determinadas nações muito poderosas.
 Consultado por necromantes e videntes ele era Omar de HOTEP, ou simplesmente Omar o Mago, de tez escura e olhar soturno vestido totalmente de preto com um estranho chapéu sobre a cabeça, ele apenas observava os visitantes que rodeavam a gema fosforescente, alguns tentavam ler os escritos do pergaminho, coisa impossível para leigos, por fim, os turistas apenas contemplavam por instantes aquele tesouro antigo e logo se retiravam.
 Aquela joia fosforescente de certo modo era uma remota lembrança de cultos a deuses muito poderosos quem sabe surgidos muito antes do próprio homem.
Muita gente passava ali e olhavam o brilho hipnótico, fascinante, sedutor, convidativo da pedra.
 
FIM
FernandoCreed
Enviado por FernandoCreed em 11/07/2016
Reeditado em 22/02/2018
Código do texto: T5694295
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.