OBSESSÃO FATAL - DTRL 28

- Ele é simplesmente um gênio!

- Gênio? Um monstro, isto sim doutor!

- Observe bem as ressonâncias, a eletromiografia, olhe bem todos os exames. Um trabalho de mestre.

- Estou com medo doutor. O senhor parece gostar do que ele fez.

- Não seja boba. A questão não é gostar. O caso é a perfeição das incisões, todas as interferências, os cortes dos nervos, tendões, tudo caprichosamente interrompido. Digo interrompido, porque esta claro que ele desejava religá-los. O cara é genial.

A enfermeira mantinha-se perplexa ao ouvir o cirurgião falar com tanto entusiasmo da barbárie cometida contra a nova paciente.

* * * * *

- Amor! Estou em casa. Senti saudades!

Rodrigo fechava a porta atrás de si anunciando sua chegada. Como sempre a esposa deveria estar no quarto a sua espera.

Deixou a pasta e de alguns envelopes sobre a mesinha da sala, foi até a cozinha perguntando se Marisa desejava algo. Ele não esperou pela resposta. Ela nunca respondia, mesmo assim como parte de um ritual não desistia.

Demorou alguns instantes preparando um café expresso, aquela cafeteira veio bem a calhar. Sorveu um gole quente e forte como gostava. Não se deteve, estava louco para encontrar a mulher e dividir com ela as novidades do trabalho.

Antes de fazer a especialização na capital, Rodrigo viveu seus dias de mocidade naquela cidade de porte médio, ninguém estranhou quando retornou a suas origens. Comprou um belo sítio a menos de quarenta minutos da clínica, onde junto com seu sócio atendia principalmente as matronas queixosas quanto à beleza. Um cirurgião plástico formado na capital arregimentou logo um bom número de clientes. Seu amigo de faculdade que dali nunca saiu, ficou feliz em abrir as portas de seu consultório, somando-se ortopedia e estética, mas cada um na sua.

O sítio era muito bem cuidado, três vezes por semana um jardineiro com sua esposa zelava pelas tarefas que o médico não conseguia, apenas os dormitórios eram resguardados, lá ele mesmo gostava de cuidar, ainda mais por que mantinha um pequeno escritório ali. Nos outros dias a casa se tornava inviolável graças à ferocidade dos seus bichinhos de estimação, a constar, seis não tão dóceis rottweilers difíceis de conquistar.

-Você não sabe meu amor, como essas mulheres de cidades pequenas são vaidosas. Hoje foi a vez daquela insuportável esposa do vereador. Dei um jeito nas mamas dela. Acho que ele vai gostar. Depois te mostro o vídeo.

Sem ter com a mulher, ele continuava falando apesar de não obter respostas. Já nem se importava, acostumou a ter o silêncio como companhia. Estava quase na porta do quarto, porém mal havia tocado em seu café.

* * * *

Rodrigo e Marisa se conheceram como médico e paciente algum tempo antes do casal ser obrigado a voltar para o interior.

O médico já se destacava na profissão, tinha um bom cargo num prestigiado hospital, era jovem, entusiasta, galgaria rápido os degraus do sucesso. Marisa uma moça tímida escondia uma grande vergonha, se algo grave não ocorresse, de boa vontade jamais buscaria ajuda.

Na adolescência não tinha muitas amizades, mantinha distância das garotas de sua idade, dos rapazes então, só de olhar se corava. Enquanto as outras desfilavam com seus namoradinhos ela os evitava, mantinha-se resguardada. Coisa cafona esta de entregar apenas ao homem com quem fosse se casar, muito pouco usual hoje em dia, mas convicta mantinha-se pudica.

Aos vinte anos conheceu Jorge. Rapaz de boa lábia, começaram um leve namoro, ele tentava de tudo para difícil minar a resistência da moça, mas encantado valia a pena. Com o tempo e muita luta o rapaz havia marcado alguns pontos. A namorada se tornou especialista em sexo oral, satisfazia seu parceiro levando-o ao delírio sem nunca consumar o ato. Casaria ainda virgem.

No terceiro ano, com muita insistência, mantendo as luzes apagadas e ainda de calcinha, ela se deixou penetrar por trás. Foi doloroso e prazeroso ao mesmo tempo, algo indescritível para amantes inexperientes . Até que fim o moço tinha algo para se deleitar. Depois da primeira vez seguiram-se outras tantas e cada vez melhor, porem sempre no escuro e sem mover a peça íntima.

Desesperado o rapaz pressionava, estavam noivos, passava a hora de experimentar tudo que o amor poderia proporcionar. A garota mantinha firme sua decisão. Depois de tanta frustração, Jorge se cansou, desistiu. Rompeu o compromisso despedaçando o sofrido coração da pobre Marisa.

Era o que faltava para a garota buscar ajuda, nada melhor que as dores do amor para impulsionar uma escolha. Fazendo algumas pesquisas, Rodrigo foi a melhor opção, num hospital particular e caro, a cirurgia seria rápida e discreta.

Bastou as primeiras entrevistas para o cirurgião se encantar pela recatada moça. Seus olhos, sua voz, sua pele, os seios eram só perfeição, por mais que buscasse não encontrava o que melhorar em tão bela obra divina.

Ficou acertada a internação para a próxima semana. O procedimento era simples, ele usaria sua maestria para extirpar o micro pênis semi-funcional que como um apêndice maldito brotava do interior da vulva, também moldaria a glande transformando-a nos ausentes pequenos lábios, por fim desviaria a uretra ligando-a no conjunto dominante do aparelho reprodutor feminino. Nada mais deveria fazer, estava tudo normal. Trompas, ovários, útero, inclusive seu ciclo menstrual era perfeitamente regular.

Em nenhuma outra cirurgia houve tanta dedicação, fez tudo com extremo desvelo. Seu bisturi esculpia habilmente o órgão feminino como se desejasse criar ali a imagem de uma orquídea rara. Era tão belo o que fazia que sentiu todo seu corpo queimar, um furor não antes experimentado fez sua faces enrubescerem, o ar pareceu faltar a seus pulmões, sua existência estava em júbilo.

Terminada a intervenção, alguns dias de convalescência estreitaram os laços entre médico e paciente. Durante algum tempo ela deveria voltar para o acompanhamento pós-operatório que ele mesmo se responsabilizaria por fazer. Outra consultas foram marcadas, mesmo além do necessário. Apaixonado por sua obra, faria o possível para mantê-la por perto. Quanto mais tempo passava, mais bela ficava e seu desejo ardia queimado em seu peito, estava sempre desesperado para vê-la.

Num desse retornos desnecessários, Jorge estava presente. Queria ele mesmo apertar a mão do homem que lhe proporcionava a felicidade. O casamento foi remarcado, estavam prontos a ter uma vida feliz, não haveria mais vergonha ou traumas.

* * * * *

Ao entrar no quarto, Rodrigo beijou carinhosamente Marisa que estava deitada, porém acordada. Como por habito, ele falava pelos cotovelos, a mulher em silêncio ouvia cada palavra.

De frente ao leito, um enorme televisor dominava a parede, no celular o médico enviava um vídeo para o aparelho. Em minutos, prazerosamente dividiria com a esposa sua obra do dia.

Além das mamas, a mulherzinha do vereador passaria por uma lipo, não era usual dois procedimentos de uma só vez, mas também por isso suas pacientes o recomendavam, todas queriam a beleza sem o esforço, mesmo com riscos e custos maiores. O medico fazia questão de acompanhar todo o processo, desde a preparação até o pós-operatório, em alguns casos dispensava até o anestesista responsabilizando-se também por mais esta etapa.

A paciente tinha trinta e oito anos, trocaria as próteses mamarias, retiraria o excesso da cintura massageando assim seu enorme ego.

Estava tudo pronto. Com delicadeza ajeitou o travesseiro buscando melhorar o ângulo de visão da amada, dando lhe também um maior conforto, ela não agradeceu. Ligou o televisor ajustando o som.

Era nítido que as imagens foram gravadas por um celular com muito pouca técnica e sem autorização ou conhecimento.

A paciente se encontrava na cama em seu quarto na clínica. Dormia sob efeito dos remédios, possivelmente já anestesiada, o rosto sereno, desprovido de qualquer preocupação era quase angelical. Seu corpo coberto por um lençol branco possuía os contornos de uma mulher madura e sedutora.

Se colocando aos pés da cama, com a mão esquerda o tecido foi puxado com suavidade. À medida que deslizava mostrava aos poucos o colo da vítima, devagar os seios se revelavam lindos apesar da opinião da paciente, seus braços estendidos estavam colados ao corpo, no umbigo o sinal de um pircing retirado, logo abaixo um close destacava lindos pelos dourados que seguiam em direção ao delta dos desejos. Ao descer um pouco mais percebia-se um tremor por parte de quem empunhava o celular, uma pequena pausa e logo depois a imagem se aproximava e afastava, o cinegrafista parecia querer valorizar ainda mais espetáculo. O lençol continuou seu caminho, agora as coxas torneadas estavam à mostra, finalmente os pés. A mesma mão que despiu aquele corpo, acariciou cobiçosamente os pequeninos pés de sua vítima.

Lentamente o médico circulou o leito. Filmava em detalhe o corpo nu a sua frente, às vezes fazia closes enfatizando este ou aquele detalhe, era uma forma de ampliar sua volúpia.

Cheio de desejos, Rodrigo afagou os seios da incauta esposa do vereador. Ficou mais excitado quando de forma natural os mamilos enrijeceram-se, as ourelas róseas tornara-se ainda mais sedutoras que ele quase não suportou, sua mão deslizou na direção do rosto, acariciou aquela face plácida, brincou com os lábios macios, enfiou os dedos na boca da indefesa mulher, sentia enorme prazer em fazer aquilo. De um jeito desastrado tentou filmar o primeiro beijo, foi cômica a investida. Bruscamente se irritou dando um forte tapa que deixou marcado o rosto da moça.

Insatisfeito voltou a brincar com o corpo inerte. Passava as costas da mão pela barriga enquanto os pelos de seu braço se arrepiavam de prazer, acariciou a vagina da mulher, primeiro com dois dedos em movimentos ritmados. Sentindo a umidade morna aumentou sua fúria, enfiou violentamente os quatro dedos da mão, a imagem tremia e perdia o foco, desejava penetra-lhe com o próprio punho seguido do braço até alcançar seu útero.

O que a câmera não mostrava era o suor banhando o corpo do agressor, a besta estava a ponto de ejacular em sua calça. A imagem girou desorientada pelo quarto parando de uma forma estratégica que mostrava todo o corpo estendido naquela cama. Ficou assim alguns instantes, então, também nu, o sádico doutor subiu lascivamente sobre sua vítima.

Parecendo um animal desorientado urrava e babava sobre a inconsciente mulher que recebia os golpes como a carne morta de um açougue de quinta, bastou uns meros segundos para que exausto tombasse para o lado, estava feito, porém não satisfeito.

Interrompendo a filmagem, limpou qualquer vestígio da relação involuntária, a paciente jamais sonharia ter sido abusada. Em breve a cirurgia seria realizada e mais uma cliente satisfeita recomendaria o zeloso profissional.

O travesseiro molhado de lágrimas era o único protesto de Marisa, seus olhos vermelhos jamais expressariam tamanha dor. Agora sabia chegar sua hora, como tantas outras vezes passaria pelo tormento, seria covardemente violada.

* * * * *

- Ela é uma moça de sorte. Também poderia estar morta.

- Pois é. Parece que o sócio andava desconfiado do comportamento do maníaco na clínica e vinha pressionando. Ameaçava fazer uma investigação.

- Graças a Deus, doutor. Um monstro como aquele não merece viver.

* * * * *

Rodrigo via seus esforços em conquistar Marisa frustrados com o recomeço do noivado. Estaria tudo perdido, não concebia dividir o objeto de seus desejos com outro homem. Tremia só de imaginar mãos alheias percorrer o corpo que tanto cobiçava. A mulher tinha que ser apenas sua e de mais ninguém.

Ainda tinha uma última oportunidade, seria a derradeira investida. Naquela consulta se despiu de toda vaidade, colocou de lado seu orgulho, expos seus sentimentos de uma forma que nunca imaginou finalmente se declarando.

Surpreendida, Marisa riu de seu desespero. Estava diante do médico que abria seu coração despejando ali tantas juras de amor eterno, ela jamais notou suas intensões, em sua vida não caberia ninguém além de Jorge.

A besta sentiu-se pequena, inútil, frágil. Estavam a sós, o rosto queimando de vergonha, de raiva. Com toda a força da alma cerrou os punhos. Sem muito pensar desferiu um golpe certeiro que a fez desmaiar.

Tendo deixado a moça com um enorme hematoma no rosto, ele não sabia o que fazer, hesitou por alguns instantes. Ela acabaria com sua carreira. Deveria livrar-se do estorvo. Destruiria aquela a quem amava, jogaria sua carcaça em qualquer beira de estrada, tornando-a mais uma vitima de um latrocínio insolúvel.

Não era tão simples, ele amava aquela criatura, necessitava daquela existência. Pensou um pouco. Foi ao ambulatório voltando com um sedativo intravenoso. Aproveitou da confiança dos colegas para retirá-la oculta do hospital. Houve uma investigação, mas ninguém duvidava que a paciente após a consulta deixou o local se perdendo no caminho de casa.

Nos meses seguintes ele a manteve sedada, primeiro na capital, depois no sítio. Usando de suas habilidades, o cirurgião de forma precisa seccionou todos os tendões e nervos motores da mulher a quem amava.

Marisa acordou num quarto branco. Não conseguia se mover, tentou gritar por socorro mas a voz lhe faltou. Daquele momento em diante estava condenada à estagnação, não haveria mais caminhadas de mãos dadas ao entardecer. Alimentava-se por soro, possuía sondas em seu corpo, seu único movimento consistia no abrir e fechar dos olhos.

As humilhações e abusos se tornaram constantes. No começo fechava os olhos imaginando viver outra vida num lugar bem distante ao lado de seu noivo, depois já não se importava, apenas aceitava, só neste doloroso momento tinha a certeza de ainda estar viva.

* * * * *

- Teve a morte que mereceu. O monstro foi devorado por seus próprios cães.

- Uma morte horrível, porém merecida. Não sei se estivesse vivo a justiça seria feita.

O médico e a enfermeira falavam sobre Rodrigo enquanto tomavam um café.

* * * * * *

Pressionado pelo sócio, Rodrigo temia ser descoberto. Não tinham nada contra ele, eram só desconfianças, mas seu sangue quente turvava suas ideias. Criou vários cenários, em todos eles se dava mal.

No meio da tarde deixou a clínica transtornado, brigou com todos que cruzaram seu caminho. Dois dias depois o jardineiro chamava a polícia.

Num canto da chácara encontrava-se o cadáver parcialmente devorado pelos cães. O rosto, as pernas, o abdômen dilacerados pelos animais famintos. Somente o DNA pôde identificar o cirurgião.

Quando chegou em casa naquela tarde, estava muito nervoso. Ao descer do carro foi recebido pelos cães adestrados e sob seu comando. Os animais percebem até mesmo as ligeiras alterações. Algum deve ter estranhado, o médico revidado, os outros seguiram no ataque.

Sua garganta foi rasgada. Morreu como a fera que realmente devia ser. Era o fim do suplício de Marisa.

* * * * *

- Então doutor, qual o prognostico?

- Ela vai ficar bem. A cirurgia foi tranquila, esta fora de perigo. Todas as secções foram recompostas. Breve estará na fisioterapia.

- E a fala?

- Deve demorar um pouco mais. Só o fonoaudiólogo vai precisar.

- Coitada, finalmente esta livre. Acabou o pesadelo.

* * * * *

Alertados por um enfermeiro, uma equipe invadia o quarto de Marisa. Finalmente estava livre. Nunca mais sentiria dor, não mais ia ser abusada, seu frágil coração parou de bater.

Geralmente as pessoas simples são aquelas que ninguém percebe, enquanto todos corriam em auxilio da moça um pacato faxineiro retirava o lixo. Em meio aos sacos de resíduos contaminados uma ampola de cloreto de potássio fazia par a outra de brometo de pancurônio, a primeira para o coração, a segunda para os pulmões. No porta-luvas do carro, no subsolo, uma passagem de ida para Europa.

Tema: Torturas e traição (relação médico-paciente)

Gilson Raimundo
Enviado por Gilson Raimundo em 18/07/2016
Reeditado em 13/08/2016
Código do texto: T5701466
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