PROJETO PARUSIA - PASSAGEM

Este texto faz parte da obra "PROJETO PARUSIA" que será lançada no primeiro trimestre de 2017.

(...)Ao olhar em sua volta percebeu a grande quantidade de água por todas as direções. Estava em um grande barco, era noite e o céu mantinha-se negro sem estrelas. Girou a cabeça tentando ter um campo de visão mais amplo. Era só água, uma água escura sem muitas ondas o cheiro de minerais reinava. O mar estava até calmo, porém turvo, maldito. Juvência tentou comunicar-se com uma das pessoas que passavam pelo convés, sem sucesso. Não estava sendo avistada por ninguém. — Seriam piratas? — Pensava na possibilidade de ter sido realmente sequestrada para servir como escrava de algum contrabandista. Teria sido sedada e arrastada até ali por um grupo de malfeitores – mas porque ninguém fala comigo? – Pedia aos céus uma resposta. Onde estaria o seu deus naquele momento? Quantas perguntas sem resposta. Precisava sair daquele barco de qualquer jeito. Não havia sinal algum de terra, apenas a água negra batendo contra o casco em uma cadência lenta e sufocante. Andou para frente, próximo ao deck do lado direito, reparou que alguém se encontrava agachado próximo da entrada da grande cabine. Chegou próximo e ajoelhou ao lado daquela mulher, ouvindo o barulho de seu choramingar. A mulher retirou a cabeça do meio dos joelhos olhando fixamente para a face de Juvência. Uma bela mulher com olhos de esmeraldas usando uma camisa de gola polo. Sua maquiagem estava totalmente borrada mostrando um efeito de grandes olheiras já tomando boa parte das maçãs do rosto, escorrendo em um filete negro até o pescoço. A jovem não conseguia falar, todavia era a única que conseguia ver Juvência em todo aquele cenário. A jovem deixou tombar a cabeça para o lado apertando os olhos de grandes cílios piscando lentamente, encarando a cigana. Um pequeno sorriso tentou brotar de seus lábios rachados dando vez agora a pequenas lágrimas inundando aquelas duas lindas pedras verdes de seu rosto. Colocou uma das mãos no ombro de Juvência falando com a voz trêmula:

— Salve a minha alma... Não aguento mais ficar aqui sofrendo.

A cigana reparou nos cortes por toda a extensão do braço daquela mulher. Os hematomas que lhe cobriam o pescoço. Não tinha a menor ideia do que estava acontecendo. Não sabia onde estava e nem como poderia ajudar a jovem em estado precário. Parecia ter levado uma surra. Até em seus lábios haviam cortes, o sangue já coagulado sujava o cotovelo e o antebraço. Eram feridas fundas, mas não sangravam tanto. Reparou que as pernas da menina também estavam feridas. Machucados redondos como queimaduras feitas com ferro quente.

— Eles estão acabando com o próprio sofrimento. — Apontava o dedo em outra direção.

A cigana acompanhou a mão da jovem e percebeu que na proa do grande barco pessoas em farrapos se atiravam ao mar. Faziam uma fila andando como zumbis. Iam mancando, alguns com grandes ferimentos e outros com membros arrancados do corpo. Todos na mesma cadência, pacientemente esperavam um atirar-se ao oceano negro e logo depois deixavam o corpo cair. Uma mulher com uma criança no colo esperava a sua vez de ganhar o mar com o que um dia fora seu filho, a criança chupava o dedo polegar sabendo que a morte o aguardava em segundos. A cigana ouvia nitidamente o barulho da água recebendo aquelas almas vazias. Olhou novamente para a jovem a sua frente e reparou no pequeno sorriso esboçado quando a pequena criatura ouvia o marulho de corpos caindo. Segurou a mulher pelos ombros pedindo a sua atenção. – Temos que sair daqui agora. — Repetiu umas três vezes antes de ouvir a resposta.

— Não tem saída! A saída é desistir da vida, como eles estão fazendo. Ele é muito forte. Controla nossa mente. Controla o que queremos fazer. Não dá para voltar-se contra ele. É muito forte, mesmo para todos nós juntos.

— E o que eu tenho com isso? Porque estou aqui nesse lugar? — Juvência agora sacudia a jovem com mais força. Perdia totalmente o controle da situação.

— Você está aqui porque quer. Nós estamos aqui pela maldição que acordamos. Mas você vai ter o dom de salvar a minha alma quando a hora chegar. Por enquanto... Vou ficar aqui até que o último se jogue. Não tenho mais nada para fazer. — Fez uma pausa olhando para o céu. — Droga aí vem ele novamente. Não quero mais sofrer! Saia daqui(...)

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Paulo Costa Lima
Enviado por Paulo Costa Lima em 06/10/2016
Reeditado em 06/10/2016
Código do texto: T5783264
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