Um Conto de Halloween

Um Conto de Halloween

Pilgrim City, 31 de outubro de 1995. Existem dias na nossa vida que nós jamais nos esquecemos.

Tais como o primeiro dia de aula, ou quando conquistamos uma grande vitória, o primeiro beijo da namorada ou quando você recebeu seu boletim com todas as notas boas, momentos esses podem ser raros, como o último principalmente.

Mas o dia que eu jamais esquecerei na minha vida e que levarei para o meu túmulo, foi o 31 de outubro, dia das bruxas há exatos 10 anos quando eu e meus amigos Brad e Jake fomos perseguidos por uma criatura que me fez ter pesadelos por muito tempo.

Hoje tenho 24 anos e conheço perfeitamente o risco que corri nesse dia, apesar de que minha inocência me impedia de reconhecer isso.

Mas para relatar a aventura em que me encontrei e que já estava acostumado a ver nos filmes de terror da época, volto para o ano de 1985 quando tinha 14 anos de idade.

Morava numa cidadezinha pequena no estado de Chicago. Vivia com minha mãe, Julie, meu pai, Richard e minha irmã, Betty.

Eu sempre gostei do dia das bruxas, pois combinava bastante com a época de minha adolescência, os anos 1980. Enquanto no mundo dos adultos o principal medo eram as bombas nucleares vindas do leste europeu, o meu medo era do chuvisco de minha pequena televisão.

Toda semana, eu e meus dois melhores amigos saíamos do colégio às duas horas da tarde e íamos a pé ao cinema mais próximo para assistir um bom lançamento que eram anunciados nos jornais e revistas.

Nossos pais sempre determinavam o que iriamos ver para que não nos deparássemos com filmes para maior de idade, mas sempre dávamos nossas escapadas, e mesmo assim nossos pais descobriam, pois a maioria dos filmes impróprios que víamos era de terror.

Ainda me lembro do dia que entrei para ver O Iluminado.

Ao chegar a casa, pedi que meu pai se livrasse do machado que ele usava para cortar lenha.

Pela noite, meus amigos vinham a minha casa para nossa sessão obrigatória de nossos jogos de tabuleiro até às 9 da noite.

Os sábados eram os melhores. Quando não íamos ao parque de diversões onde gostávamos de entrar no trem fantasma, assistíamos desenhos animados. O nosso preferido era Caverna do Dragão.

Meus amigos foram as melhores pessoas que eu já havia conhecido. Brad era o nerd, rico e judeu de nós três. Tudo que nós gostamos até hoje, aprendemos com ele.

Lembro-me que na semana seguinte a que o conheci, ele começou a falar para mim sobre Senhor dos Anéis e depois me emprestou seu livro. Eu fiquei viciado naquilo. Li os três e ainda por cima O Hobbit. Tolkien virou meu ídolo da literatura. Até hoje sonho com o dia em que Stanley Kubrick irá dirigir uma dessas obras.

Nós vivíamos colados. Conversávamos sobre desenhos que assistíamos desde Thundercats e Looney Toonies e dos filmes que faziam sucesso na época.

Nunca vou me esquecer do dia em que o primo dele nos levou para ver Star Wars quando eu era bem novo.

Na nossa escola, nós fazíamos a tarefa juntos, sentávamos um do lado do outro na sala e até passávamos cola durante a prova.

Nossa camaradagem era tão forte que não desgrudávamos até durante as brincadeiras cruéis dos valentões.

Eles no chamavam de irmãos gêmeos, aliança nerd ou bichas, mas eles que se danem.

Eu pensava que ele seria meu único melhor amigo até o fim, até que conheci Jake.

Ele era um garoto negro, descendente dos africanos trazidos para o país na época da escravidão.

A sua família tinha problemas financeiros, mas através de uma bolsa, conseguiram matricular Jake num colégio que pudesse dar-lhe educação de qualidade.

Ele era muito esforçado, sempre ficava num canto da sala estudando durante o intervalo e tirava boas notas.

Enquanto sua família se orgulhava, os brancos racistas de minha sala se mordiam porque a nota do garoto era mais alta que a deles.

Nessa época, ficamos preocupados, pois sabíamos que aqueles imbecis não iriam engolir isso.

Um belo dia, ouvimos uma tramoia daqueles caras dizendo que pegariam o pobre Jake no ginásio e bateriam nele.

Quando descobrimos isso, fomos avisar ao inspetor do colégio, só que ele estava em reunião, então tentamos avisar a secretária que não queria nos dar ouvidos, pensava que estávamos inventando.

Começamos a fazer muito barulho, até que ele saiu pela porta e perguntou o que acontecia.

Então eu tive uma brilhante ideia e disse que um garoto branco seria espancado no ginásio por dois zeladores latinos.

Em menos de um minuto o inspetor já estava lá, ele chegou bem no momento em que o valentão Billy pegava Jake pela gola e preparava o soco.

O inspetor o impediu e os levou para a coordenação nos olhando com uma expressão de raiva.

Eu e Brad acolhemos Jake em nosso grupo e daí nasceu nossa interminável amizade. Nunca que o nosso companheirismo foi atrapalhado.

Quase foi dificultado quando me apaixonei por Sally, a garota novata na cidade que passou a estudar na nossa escola.

Ela era loirinha e magrinha, vestia sempre rosa e gostava de conversar comigo enquanto eu a ajudava com a tarefa de história.

Jake e Brad só ficaram com ciúmes inicialmente, até que Sally me substituiu por suas amigas.

Naquele 31 de outubro, não iriamos fazer o de sempre, ficar na casa do primo do Brad, o Dave, e assistir filmes de terror porque a namorada dele iria para lá e só poderíamos ficar até as 8 da noite pois eles queriam ficar sozinhos vendo uma série.

Então nosso plano era ficar na rua das 8 as 10 da noite pedindo doces apesar de não termos mais idade para isso.

À noite, antes de sairmos, Dave e sua namorada quiseram nos contar uma história de terror.

Sentamos no sofá com a sala escura e Dave pegou uma lanterna para iluminar seu rosto enquanto contava. A história era mais ou menos assim:

“Muitos e muitos anos atrás, na cidade existia um mendigo conhecido como Velho Joe, ele vivia na praça deitado no banquinho fedendo a álcool e coberto por um jornal.

Ele era tranquilo, mas os garotos adoravam brincar com ele já que ficava engraçado quando bêbado.

Então, no Halloween de 1975, os garotos colocaram um grande boneco sentado numa cadeira de frente ao banco em que Joe dormia e sua cabeça era uma caveira falsa com uma vela acesa dentro.

Eles ficaram cutucando Joe com uma pena durante alguns minutos até que o velho acordou para ver o que acontecia e tomou um susto com o boneco.

A reação foi tão grande que ele pulou do banco e o golpeou fazendo com que a caveira caísse e se quebrasse e dela saísse a vela.

Joe usou uma garrafa para bater na caveira, o que fez com que o álcool se misturasse com o fogo da vela.

Na hora, Joe ficou em chamas devido ao odor de álcool em sua roupa.

Nas ruas, viu-se o velho correndo e incendiando, até que chegaram os bombeiros e os rapazes tentaram abrir um hidrante.

Eles foram presos e o velho Joe foi enterrado. Reza a lenda que o seu espírito queria vingança, mas o diabo só permitiu que ele voltasse se lhe conseguisse almas de jovens.

Até hoje, ainda podemos ver nos céus uma criatura vestindo um casaco, com cheiro de álcool, uma aparência queimada e asas de demônio matando inocentes no dia 31 de outubro”.

Perguntamos ao Dave se essa história era verdadeira, mas ele desconversou. Depois daquela história, Brad e Jake foram para suas casas e eu para a minha.

Tínhamos que nos fantasiar e nos encontrar na frente de minha casa.

Quando cheguei, lá estava minha irmã e seu namorado atleta se beijando no sofá da sala enquanto meu pai lia um jornal, fumava cachimbo e falava par a minha mãe que os soviéticos iriam nos bombardear a qualquer momento.

Mamãe fingia que ouvia enquanto prestava atenção na televisão da cozinha onde passava sua novela. Enquanto fazia o jantar, me permitiu ir pedir doces nas casas, contanto que voltasse as 10 ou fosse dormir na casa do Brad.

Eu resolvi inovar e me fantasiei de Marty McFly do De Volta para o Futuro que em minha opinião, era o melhor filme daquele ano.

Antes de sair, perguntei ao meu pai sobre a história do velho Joe mas ele estava mais preocupado em conseguir conversar com seu amigo do comitê do Partido Republicano.

Eu desisti e saí pela porta dizendo “tchau” e ele me respondendo: “volte cedo”.

Esperei alguns minutos até que avistei Brad vestido de Han Solo enquanto Jake usava uma fantasia de Indiana Jones. Saímos pelo bairro pedindo doces.

Após 30 minutos não tivemos tanto progresso, afinal, ninguém dava doces para garotos de 13 e 14 anos no Halloween. Pelo menos elogiaram nossas fantasias.

Às 9 horas da noite, caminhávamos pela vizinhança, enquanto muitos já haviam ido embora. Até que na metade do caminho para a casa do Brad onde iriamos dormir, avistamos uma vã se aproximando.

Da janela, saiu o babaca do Billy e seus amigos idiotas que começaram a rir de nós e soltar as seguintes piadas.

Brad ficava irado com aquelas piadas então xingou Billy de algo muito pesado.

Nesse momento, a expressão de Billy fechou. Ao percebermos a besteira que tínhamos feito, saímos correndo e o motorista da vã pisou fundo enquanto ele e seus amigos tentavam jogar ovos em nós.

Estávamos correndo muito rápido, mas aí tropeçamos numa poça d’água. Billy então saiu da vã para nos encher de socos. Tentávamos nos levantar e ele ia se aproximando até que quando menos esperávamos, alguma coisa o carregou.

Eu e meus amigos ficamos apavorados, pois foi tudo muito rápido e assustador. Estava escuro, mas vimos à silhueta de algo voando e atravessando as folhagens das árvores.

Corremos até a floresta, eu, Brad e Jake enquanto os amiguinhos do Billy ficaram na vã se borrando de medo.

Ao adentramos a mata, ligamos nossas lanternas, olhando para todos os lados. Só ouvíamos os gritos de desespero que eram nosso único guia.

Naquela hora, começou a chuva, estava tudo frio. Até que nos deparamos com algo estranho se mexendo, como se estivesse analisando com gestos brutos alguma coisa que se mexia embaixo.

A coisa tinha asas e quando uma afastou, vimos um rosto morto, era o de Billy. A reação foi tão assustadora que Jake começou a gritar, fazendo com que a coisa virasse para nós.

Era um monstro negro, com olhos vermelhos, dentes pontiagudos e uma expressão demoníaca.

Ao nos ver, a criatura alçou voo batendo suas enormes asas e saímos correndo o mais rápido possível tentando escapar das garras da criatura.

Ao passarmos das folhagens, atravessamos a rua e pensamos que tínhamos despistado o monstro, até que ouvimos o bater de asas e ele saiu entre as folhagens tapando a figura da lua no céu.

Continuamos a correr e o monstro tentava se aproximar o máximo que pudesse.

Em determinado momento, alcançamos a vã e gritamos por socorro, mas aqueles malditos dos amigos do Billy pisaram fundo para fugirem.

Então corremos por entre as cercas das casas onde era mais difícil para o monstro nos enxergar.

Mas o mesmo preferiu perseguir os amigos do Billy que uma hora pararam o carro, pois a gasolina havia acabado.

Eles abriram a porta e tentaram sair correndo, mas o monstro os alcançou e com cada com as duas enormes garras da mão, pegou dois e com as do pé, os outros dois.

Continuamos fugindo, pois sabíamos que o monstro poderia aparecer a qualquer momento.

Estávamos desesperados para encontramos a casa do Brad. Até que após alguns minutos, nos deparamos com o carro do primo de nosso amigo se aproximando de nós, enfim salvos.

Dave perguntou o porquê de ainda não termos voltado. Contamos a história, mas ele e sua namorada começaram a rir e nos mandaram entrar, disseram que estávamos imaginando.

Entramos no carro dele e seguimos em frente. Até que nos deparamos com nossa prova cabal do que acontecera, o carro dos amigos do Billy.

Ele resolveu descer para olha-lo e pediu nossa ajuda para revirarmos as coisas. Só encontramos bebidas, cigarros, ovos e sinalizadores.

Após alguns minutos, ouvimos a namorada de Dave chamando-o. Ao chegarmos, ela nos mostrou a trilha de sangue do asfalto e ambos tiveram a “brilhante” ideia de seguir.

Depois de alguns minutos enquanto andávamos e tentávamos convencer Dave a voltar ele se aborreceu e falou: “Meu Deus, parem de me encher o saco, caras.

Essa história já está insuportável, temos quatro colegas desaparecidos e vocês ficam inventando essa historinhas ridículas.

Brad, eu vou contar para a mamãe e a tia que você anda alimentando essas besteiras que eu te conto e assustando seus amigos.

Não existe Velho Joe ou monstro voador. Entendeu?”. Nesse momento ouvimos o barulho de bater de asas, Brad olhou para trás e avistou o monstro de olhos vermelhos se aproximando rapidamente, então ele gritou: “corraaaam”.

Saímos correndo o mais rápido que podemos enquanto o monstro ainda estava longe. Naquele momento, pensei que iria morrer e enquanto corria freneticamente.

Então foi que nos deparamos com a vã dos amigos do Billy e percebemos que o monstro ainda estava longe, dessa vez voando com menos velocidade e foi aí que tive uma ideia a falei para o Dave:

“Cara... Lembra que encontramos uns sinalizadores na vã? Pegue alguns, acenda e jogue no monstro quando ele estiver se aproximando”.

Dave gostou da ideia, mas a completou de um modo mais infalível e disse: “Melhor, vamos pegar as garrafas de bebida e jogar no monstro, para quando arremessarmos os sinalizadores, ele morra queimado, é mais garantido.

Então fizemos isso, pegamos cada um uma garrafa de bebida e quando o monstro se aproximou, jogamos, mas só uma acertou, e foi a de Jake. Então ele puxou Dave pelas garras traseiras e começou a tentar voar mais alto.

Só que Sally, a namorada de Dave, pegou o sinalizador e o arremessou com toda a força no monstro que, por estar sujo de álcool, começou a pegar fogo e deixou o primo de Brad cair.

Fomos socorrê-lo enquanto o monstro queimava no asfalto.

Depois desse dia, guardamos tudo em segredo e a polícia que ficou ciente do acontecido escondeu o corpo do monstro e optou por mudar a história.

Cinco anos depois, o corpo havia desaparecido, o delegado disse que pode ter sido roubado já que a coisa estava sendo preservada por cientistas que quiseram estuda-lo.

O mais assustador de tudo é que toda noite de Halloween após aquele dia, quando eu e meus amigos nos encontrávamos, sempre ouvíamos sons de asas batendo o que nos levava a optar por ficar em casa vendo filmes de terror.

Gabriel Craveiro
Enviado por Gabriel Craveiro em 31/10/2016
Código do texto: T5808933
Classificação de conteúdo: seguro