ONDE AS RUAS NÃO TEM NOMES

Depois de longos e exaustivos dias lutando no inferno, você acaba se acostumando com o cheiro fétido de centenas de corpos queimados como se fossem torradas. As densas nuvens de poeira que erguem do chão não fazem mais suas narinas sangrarem. Por qualquer barulho, o menor que seja parecido com um tiro, seu corpo fica trêmulo e você já começa a rezar pra que Deus te de forças para matar o inimigo.

Contudo, isso está no passado. Nós não temos mais o que temer. Matamos até o último verme que caminhava sobre duas pernas.

Os tanques esmagam pedaços de concreto no solo, os quais pertenciam às paredes do que antes era uma cidade, enquanto nós, os tropeiros, marchamos ao lado dessas monstruosidades tecnológicas, segurando a bandeira da liberdade, de nossa amada pátria que lutou por um mundo melhor, ainda ouvindo sons estrondosos de bombas a quilômetros de distância.

Caminho pelas ruas que antes possuía vida, onde pessoas circulavam no seu dia-à-dia, mas agora, a agonia dessas milhares de pessoas está derramada juntamente com seu sangue nesse solo, que foi o único que as acolheu na miséria.

Ao olhar para o lado, me deparei com a horrível imagem de um rosto sujo de terra e ensanguentado, porém ainda conseguia possuir traços belos de uma moça, entre os escombros, com o corpo enterrado no chão -, aquela face, mesmo falecida, com um brilho sinistro em seus olhos, parecia me pedir ajuda!

Meu companheiro de batalha anda do meu lado, imponente, orgulhoso com a nossa vitória, olha para um novo horizonte; um futuro prometido por aqueles que acreditamos.

Enquanto damos nossos passos rumo a liberdade, olho para cada canto, de cada moradia arruinada pela guerra e então, vejo os demasiados fantasmas daqueles infelizes que não tinham nada a ver com isso, com fisionomias marcadas por mortes desgraçadas.

Estou certo que neste momento, entendo que nada daquilo faz sentido. Os fantasmas haviam aberto os meus olhos para uma realidade que é cegada à nós, soldados, que temos o único dever de demorarmos o máximo o possível antes de perecermos em campo, lutando, matando, enquanto os poderosos donos dos países enriquecem, sendo eles que deviam estar aqui!

Percebo que havia deixado pra trás todo o conceito do que é ser um homem. Nesses instantes, deixo de ser um humano; eu não passo de um animal cruel... assassino... Mas pelo que sei, até os animais tem motivos maiores para matar do que política e religião. Meu orgulho em defender a minha pátria morreu assim como a inocência de cada criança asiática que perdeu seus pais nessa tolice.

Lembro-me de meu companheiro comentar o quanto estava satisfeito, e que queria se encontrar com "aqueles porcos" no inferno, urinando naquela face. Eu já não tinha mais o que perder, minha honra foi jogada embaixo de um escombro a metros atrás... E os fantasmas me incentivam em mirar na sua cabeça e puxar o gatilho, vendo meu companheiro cair morto no chão!

Seu desejo foi concedido. Agora, sou um animal assassino e traidor, mas sem nenhum pingo de remorso, vagando sozinho onde as ruas não tem nomes.

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ESPERO QUE TENHAM GOSTADO. ATÉ A PRÓXIMA!

Rafael Contos
Enviado por Rafael Contos em 05/12/2016
Código do texto: T5844371
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