O que você faria? - DTRL 29,5

Aconteceu assim de repente. O carro da família Ramos percorria a Avenida Brasil por volta das 14 horas, em alta velocidade. O dia seguinte seria véspera de feriado, então era preciso correr. Érico dirigia o veículo. A esposa estava ao seu lado e três dos quatro filhos iam atrás. Eles tinham entre 8 e 12 anos.

O outro carro surgiu de uma forma tão repentina. Érico estava distraído mandando o caçula ficar quieto. Então um pequeno deslize seu e o volante inclinou para o lado bem no momento em que o outro tentava ultrapassá-lo. O carro dos Ramos foi atingido e capotou por uns 50 metros, caindo em uma ribanceira. Tudo simples e violento. Todos morreram na hora.

O quarto filho do casal, Douglas, ficou tão chocado com as notícias que chorou durante dias. Não comeu, não bebeu, não saiu de casa nem falou com mais ninguém. A dor das perdas foi tão intensa, tão poderosa, que dominou sua mente e o fez esquecer a própria vida.

No sexto dia ele morreu. Estava sozinho em seu quarto, caído no chão numa poça de sua própria merda e urina. O quarto fedia. A morte geralmente é sim, ela fede.

.....

Ele acordou. Tudo em volta era negro. A escuridão englobava tudo, e tudo era a escuridão. Abriu os olhos devagar. Apesar de não conseguir enxergar mais nada, conseguia ver a si mesmo. Estava nu e seu corpo estava limpo. Ergueu-se do chão e olhou em volta. Tudo parecia meio etéreo. Havia um bilhete ao seu lado. Ele o pegou.

“Siga em frente e entre na porta branca. NA BRANCA! Não entre em mais nenhuma.” – dizia o bilhete.

Recolocou o papel no chão e caminhou em frente até avistar a porta branca se aproximar cada vez mais. Quando estava a um passo de abrir a porta, ouviu a voz.

- Eu estava te esperando Douglas.

A voz era suave e ao mesmo tempo invasiva. Douglas virou ao rosto para a esquerda. Ali havia um homem vestido de preto encostado em uma porta escura que há pouco não estava ali. O homem não tinha rosto. Havia apenas uma espécie de fumaça no lugar. E mesmo assim era possível perceber um sorriso escondido ali.

- Onde estou? Quem é você?

- Um amigo. Apenas um amigo – disse, ajeitando o chapéu - Diga-me, o que faria se tivesse a oportunidade de voltar no tempo e evitar que seus parentes morressem naquele trágico acidente?

- Acidente? - Douglas parecia intrigado - Que acidente?

- Ah, sim. Que deslize da minha parte – soprou na direção do rosto de Douglas, que repentinamente piscou os olhos e lembrou-se de tudo.

- Minha família!!! Aaaahhhh!!! Nãaaoooo!!! – Voltou a chorar e deixou-se cair no chão.

- Só preciso que me dê sua mão e entre comigo por essa porta. Vamos, quero te ajudar. Sou seu amigo.

Douglas enxugou as lágrimas . Olhou para a porta branca e depois para a preta. O homem lhe estendia a mão e aparentava ser uma pessoa legal. Decidiu ir com ele. Atravessou a porta e num segundo estava de volta a vida.

Obviamente não se lembrava de nada. E é lógico que a situação não lhe era favorável. Estava dirigindo seu carro em alta velocidade quando olhou para seu relógio. Eram 14 horas. Estava atrasado para seu compromisso. Enfiou o pé no acelerador e tentou ultrapassar o carro que estava na sua frente. Infelizmente o outro veículo perdeu o controle por um segundo e Douglas acertou-o em cheio. Os dois carros capotaram e, no fim, Douglas foi arremessado e caiu ao lado dos outros corpos. Olhou seu pai, sua mãe e seus irmãos. Douglas não podia se mexer, não podia gritar, não podia nem respirar direito, mas lembrou-se de tudo. Não conseguia chorar. Não conseguia salvá-los. Mas conseguia vê-los. Também viu um homem se aproximar. Ele sorriu e foi embora sem dizer nada. Douglas achou que alguém viria buscá-los. Que alguma hora alguém apareceria. Mas ninguém apareceu. Nunca. Ele foi obrigado a ficar ali olhando os corpos de seus familiares mortos. Para sempre...

OBS: Pessoal, fiz um grande esforço para participar. Tive muitos compromissos nas duas últimas semanas e só parei pra escrever o conto hoje às 20:00. Então, como não tive tempo nenhum, escrevi a primeira coisa que me veio na mente. Mas estou feliz por participar e com certeza irei ler e comentar todos os contos participantes também. Um bom desafio à todos.

Tiago Menezes
Enviado por Tiago Menezes em 07/01/2017
Reeditado em 07/01/2017
Código do texto: T5875304
Classificação de conteúdo: seguro