Disque 666

Henrique Haw estava com a vida conturbada. Sua mulher o deixara, estava sendo cobrado quase diariamente pelo agiota de quem pegou dinheiro emprestado para saldar suas dívidas de jogo e, para piorar, estava para ser despejado do apartamento onde morava por falta de pagamento.

Foi sob esse cenário sinistro que Henrique resolveu dar uma volta para ver se surgia alguma ideia que o tirasse do mar de lama em que se encontrava. Como sua linha telefônica estava cortada por falta de pagamento e seu celular estava quebrado, acabou fazendo uso de um telefone público para falar com a razão de sua vida: Sofia, sua filha de seis anos de idade, que fora morar com a mãe na casa de seus avós maternos em Copacabana.

Após a conversa, que durou alguns minutos, Henrique já estava indo embora quando, por curiosidade, olhou para os diversos folhetos pregados no interior do orelhão. Eles ofereciam diversos tipos de serviços, como por exemplo: lindas modelos para sexo ou companhia, cartomantes e quiromantes que adivinham o futuro, crédito sem a necessidade de fiador, etc. Entretanto, um dos folhetos, escrito em letras vermelhas e colocado de forma destacada em relação aos demais, chamou-lhe mais a atenção: “Tudo que você quiser!” era isso que estava escrito nele. Havia também um número de telefone do lado da mensagem: 666.

Henrique engoliu em seco de curiosidade, já que estava numa maré de azar e as palavras que lera eram justamente as palavras que ele precisava ouvir para acabar definitivamente com sua urucubaca. O telefone indicado no folheto poderia ser a chave que abriria seus caminhos e o tiraria, afinal, do imenso buraco negro em que ele se encontrava.

Henrique Haw resolveu pagar pra ver e ligou para o número indicado no panfleto. Do outro lado atendeu um homem com a voz anasalada e rouca: — Tudo que você quiser!

— Quem fala?— perguntou Henrique.

— Satã!

— Quem? — perguntou Henrique Haw surpreso com o que ouvira.

— Satã!

— Então aí é o inferno?— perguntou às risadas Henrique Haw.

— Isso mesmo!

— E você realiza todos meus desejos?

— Sim!

— E para isso eu tenho que lhe entregar minha alma ? — perguntou, não se aguentando de tanto rir, Henrique Haw.

— Sim — respondeu a voz alheia às gozações de Henrique Haw.

— E como funciona isso?— perguntou Henrique se divertindo às custas do “Diabo”.

— Muito simples, meu amigo: você pode ter o que quiser

durante 11 anos de sua vida terrena. Passado esse prazo você deve me entregar sua alma incondicionalmente — disse Satã sem alterar o timbre de sua voz.

Henrique que não acreditara em nada que seu interlocutor falara, perguntou-lhe: — Posso lhe fazer uma contraproposta?

— Sim.

— Posso oferecer a alma de minha filha no lugar da minha?

— Não é de praxe, mas vou abrir uma exceção pra você — disse o Diabo dando uma sinistra risada.

— Quando eu posso fazer os pedidos? — perguntou Henrique Haw tentando disfarçar suas gargalhadas.

— Após você desligar o telefone — disse Satã.

— Então eu aceito o pacto — disse Henrique Haw quase se mijando de tanto rir.

— Feito — disse o Diabo.

Henrique desligou o telefone e ficou rindo sem parar durante cerca de três minutos. Estava na pior, mas pelo menos tirara sarro de um palhaço que dizia ser o Demônio. — Ora, vejam só? O que faltam mais inventar?! — pensou Henrique Haw com seus botões, seguindo seu caminho.

Passaram-se alguns dias e Henrique Haw já esquecera por completo a conversa que tivera com Satã.

Por incrível que pareça sua vida começou a mudar para melhor como que por um passe de mágica.

O dinheiro surgia do nada e, de repente, ele já era capaz de pagar suas dívidas e de resolver todos seus problemas. Bastava pensar no que ele queria que, como por encanto, seu desejo se realizava.

E os anos de felicidade foram passando sem que Henrique Haw se desse conta de que toda aquela alegria era efêmera e um dia acabaria.

No dia exato em que o prazo estipulado por Satã chegaria ao fim, o telefone celular de Henrique Haw tocou. No identificador de chamadas um número aparecia: 666. Henrique não conseguindo na hora se lembrar de quem era aquele estranho telefone atendeu-o:

— Sim, quem é?

— Aqui é Satã, lembra-se de mim?

— Isso é alguma brincadeira, amigo? — disse irritado Henrique Haw.

— Não, isso é apenas um acerto de contas! — disse enfaticamente a voz do outro lado da linha.

— Você é louco?— disse Henrique Haw, aos prantos, lembrando-se finalmente de tudo que ocorrera e do pacto que fizera com aquele que dizia ser o Diabo.

— Na verdade, você que é! — disse ironicamente Satã.

— Era tudo brincadeira, não era? — disse gaguejando e chorando muito Henrique Haw.

— Aproveite bem o resto do dia com sua filha! — disse Satã dando uma risada diabólica e sinistra.

— Mas... Henrique tentou ainda argumentar com o Demônio, mas este desligou o telefone de forma abrupta.

Henrique Haw, que estava fora do país, ligou imediatamente para casa de seus ex-sogros para saber se sua filha estava bem, mas devido à diferença de fuso horário entre o país em que ele estava, Estados Unidos (Seattle), e o país onde vivia sua filha, o Brasil, ninguém atendeu seu telefonema, pois lá, no país do futebol, já era alta madrugada e todos estavam dormindo.

No dia seguinte ao do fim do pacto, Henrique recebeu uma dura notícia: sua querida Sofia morrera dormindo.

A desgraça maior, entretanto, não era a morte de sua filha, mas o fato de Henrique Haw saber que fora o único culpado disso e que sua filha não iria para o céu, mas para o inferno, ser mais uma alma perdida a fazer parte do enorme séquito de Satanás.

Henrique Haw, por sua descrença no “Mal”, pagou um alto preço: a alma eterna de sua filha que, infelizmente, estava perdida para sempre.

Afinal como diz acertadamente um sábio dito popular:

“Quem brinca com fogo, acaba queimado.”

Luciano RF
Enviado por Luciano RF em 26/07/2017
Código do texto: T6065048
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