O PESADELO DE KENAN WEST
 

 
   Adormeci por volta das 01h20 da madrugada, quando tinha finalizado o projeto que ia apresentar aos meus superiores no dia seguinte. Minha esposa estava fora, em viagem com nosso filho, então tinha a casa toda para mim. O sono me abateu como uma nevoa. Recordo-me apenas de ouvir o tilintar do relógio. Em seguida acordei numa sala escura, sentado à frente de uma mesa, enquanto uma lâmpada balançava no teto, pendurada por um fio. Havia alguém do outro lado da sala, uma silhueta estranha e deformada, com olhos desproporcionais, que brilhavam num tom avermelhado-purpura. Ele permaneceu me observando do canto escuro da sala, sem dizer palavra alguma, a porta do lado esquerdo da sala estava aberta e tenho certeza conseguiria correr para fora da sala antes que aquilo me alcançasse. Flexionei as mãos sobre a mesa, vidrado na coisa parada no escuro e então saltei na direção da porta. Saindo da sala, cheguei a uma espécie de matadouro de porcos. A porta estava atrás de mim, literalmente uma porta sem sustentação, em pé. Fechei-a quando notei que aquilo se aproximava, e então ela sumiu da minha vista.

   Haviam dezenas de porcos mortos pendurados em ganchos. Caminhei pelo deposito a erma, estava frio e silencioso, como na sala com aquela coisa, os porcos fediam intensamente a putrefação, alguns estavam repletos de moscas e vermes que devoravam suas carcaças. Enquanto caminhava na direção de uma outra sala, ouvi um guincho, um porco gemia de dor. Espreitei ligeiro até a passagem e levantei a lona branca da porta. Um porco estava pendurado pela pata num gancho, enquanto um homem devorava suas tripas com ferocidade, parecendo até um animal, recuei, mas ele ouviu meus paços e se virou na minha direção, havia muito sangue em sua boca, e nacos da carne do porco escorregavam de seus dentes.

   Após ter percebido minha presença, comecei a correr, tentando encontrar uma saída, ouvi os paços dele me seguindo. Uma segunda porta surgiu no final de uma fileira rodeada de porcos mortos, enquanto distraí-me com a porta, aquilo me alcançou e segurou meu braço, senti unhas grossas e afiadas penetrando na minha pele e quando puxei o braço, senti aquilo dilacerando-me, havia três fendas paralelas profundas no meu antebraço direito. E antes que aquilo tentasse me pegar novamente, joguei-me para dentro da porta e fechei-a o mais rápido que pude, meu braço sangrava, e uma dor excruciante subiu de dentro da ferida, não conseguia olhar para aquelas marcas, aquilo tinha quase mutilado meu braço.

   Enquanto me distraia com a ferida, não notei que estava num campo coberto de neve. Ouvi um grito vindo do alto do morro a minha frente, tinha certeza que era de Helena minha esposa. Tendo subido a trilha, cheguei até uma casa, que muito se assemelhava a minha, na varanda estava meu filho em pé, de olhos fechados, chamei-o com medo, então ele levantou o braço e apontou no salgueiro que havia ao lado da casa, Helena estava pendurada sobre uma corda no galho mais alto da arvore. Ela havia sido enforcada, estava com a boca escancara numa expressão de horror. Comecei a chorar vendo aquilo, e então acordei.

    No minuto que minha mulher cruzou a porta de casa, fiquei tão feliz que não tinha como mensurar minha alegria. Entretanto, notei que meu antebraço latejava e mesmo que não houvesse ferida aparente, lembrei-me do pesadelo e a porta da sala me pareceu tão nostálgica...
Vinícius N Neto
Enviado por Vinícius N Neto em 27/01/2018
Reeditado em 27/01/2018
Código do texto: T6237663
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