A MASCARA DO AMOR É DE VIDRO
 
 
Ulisses desconfiava de Rosana a muito tempo, tinha quase certeza que o traíra com Mario, ex-colega de classe na Fatec. Ele tinha esperado chegar final de semana para terminar o namoro, ainda assim resolveu lê-la para um baile de máscaras no centro, coisa que ela pedia a ele fazia dois meses, mas era caro, quase cento e cinquenta reais o ingresso. Ulisses não queria gastar aquele dinheiro, não com ela, mas precisava terminar, então resolveu que seria ótimo desmascara-la num baile de máscaras.
— Porque está tão estranho amor.
Ele continuou dançando, sem responde-la, observando as luzes estroboscópio girarem intercaladas no teto, uma amalgama de cores brilhantes. — Eu sei que está com Mario.
— O que? — Gritou ela sem conseguir ouvi-lo por conta do barulho.
— Eu sei que está me traindo com o Mario.
Rosana parou de dançar, fitando-o com uma expressão de desentendimento.
— Como assim? Não estou te traindo com ninguém.
— Não precisa mentir. Já sei de tudo. — Berrou pulando com a música.
— Seu idiota. Não estou te traindo com ninguém... — Respondeu ela, correndo para o banheiro.
As vezes ele tinha necessidade de ficar sozinho quando saída de uma discussão, mas não foi o que aconteceu naquela noite, ele continuou dançando por mais uma hora, vibrante como nunca.
— Ei cara, está interessado? — Sussurrou um cara de capuz e máscara de pânico, mostrando-lhe um saquinho com vários comprimidos rosas.
­— O que é isso?
— É polícia por acaso.
— Não.
— Então só compra.
— É quando?
— Vinte o saco...
Ele sabia que não deveria comprar drogas, ainda mais se o fornecedor fosse desconhecido. Antes que o caro ameasse ir embora, ele tirou uma nota de vinte reais do bolso. — Aperta a minha mão.
— O que?
— Aperta a porra da minha mão.
Ulisses apertou a mão dele entregando-lhe o dinheiro, então ele enfiou o saquinho transparente em seu bolso, tão rápido que nem notou.
­— E o meu bagulho...
— Olha no bolso.
A noite tinha parecia ter acabado de começar quando tomou aquele comprimido. A sensação que tinha cinco minutos depois era de estar num dentro de um barco no meio de uma tempestade, e o barco não parava de balançar, para um lado e para o outro, ele não se sentia tonto, nem enjoado, nem com dor de cabeça como ficava quando fumava maconha, apenas uma leveza espontânea que fazia todo seu sistema nervoso ficar anestesiado. Enquanto dançava aleatoriamente com quem estivesse à sua frente, ouviu um grito vindo da multidão, e logo soube que era de Rosana.
Ele se aproximou de onde pensara ter ouvido o grito e encontrou-a caída no chão, ao lado de uma poça de sangue. — Puta merda... — Gritou, enquanto o efeito mudara de uma leveza espontânea para uma tontura abstrata, vendo tudo dobrado e amorfo.
— Rô. O que aconteceu. Que droga porque está sangrando.
Uma voz perpetrou em seus pensamentos, dizendo. — Queria que ela morresse. Queria que ela morresse.
Ele olhou para a própria mão e viu que estava segurando uma faca molhada de sangue.
— Não. Eu estava dançando não posso ter feito isso. — Falou, vendo a mão gingar em sua mente, distorcendo-se e se reconstruindo como um quebra cabeça sem sentido.
Ulisses aproximou o rosto da máscara dela, e então a tirou, e no momento que o fez, notou que não era Rosana, mas sim Mario, seu ex-colega da Fatec e o cara que estava pegando sua mulher. Ele saltou para trás assustado, então o rosto de Mario começou a dissolver, como se sua pele fosse um pedaço de plástico, seus olhos tornaram-se duas pedras de ródio preto e após alguns segundos só havia um crânio branco, cheirando a plástico queimado.
— Calma cara. Deixe o bagulho te levar. Não se contenha. — Ouviu a voz do cara que o vendeu a droga.
Afastando-se daquilo, ele se perdeu na multidão, estava sufocado com a música e a luz, sem conseguir se mover direito até que vomitou no chão. As máscaras gingavam ao seu redor, fitando-o com um sorriso aberto e macabro. O silencio dentro de sua mente formava um carrossel, girando sem conseguir voltar si. — Cara, está tudo bem? — Perguntou uma mulher, segurando-o para não cair.
— Estou um pouco tonto. — Respondeu.
— Tomou a droga do Vitor não foi.
Ele respondeu fazendo que sim.
— Só relaxa, daqui a pouco passa o efeito. Curte um pouco, esse barato é ótimo. Se não vai no banheiro e toma um ar.
— Sabe para onde fica o banheiro.
— O dos homens naquela direção... — Apontou para o lado direito.
— Obrigado.
 
Ulisses acordou no dia seguinte numa sala escuro, algemado a uma mesa, sem conseguir se levantar.
— Até que enfim acordou. Não sabe como foi difícil traze-lo para cá na condição que estava ontem à noite. — Falou um homem entrando na sala.
— Como assim, que condição, onde estou?
— Calma ai moleque! Não se lembra da noite anterior... — Perguntou colocando uma pasta na mesa.
— Porque estou algemado.
— Não adianta. Encontramos a faca no seu bolso.
— Que faca.
— Não fode. Matou sua namorada, e depois matou o cara com quem ela estava te traindo.
— Não. Não, não, não... não matei ninguém.
Ele não conseguia se lembrar de mais nada depois que foi procurar o banheiro.
— Estava chapado quando encontramos você do lado de fora daquela boate.
Sentando-se numa cadeira, ele abriu a pasta que tinha posto sobre a mesa e tirou uma série de fotos da cena do crime, fotos de Rosana e Mario desfigurados.
Ulisses lacrimejou, sem entender como tinha feito aquilo.
— Eu só ia terminar com ela.
— E os matou.
Havia pouca luminosidade na sala onde estava, e por algum motivo, conseguia ouvir a mesma música do baile do outro lado da porta.
— Vai confessar? — Indagou com veemência.
— Onde estou?
— Vai confessar? — Perguntou novamente, como se fosse uma gravação.
Uma luz estroboscópio surgiu por debaixo do vão da porta, e em seguida uma serie de sombras apareceram do lado de fora, dançando e pulando, enquanto ouvia a música aumentar.
— Vai confessar? — Perguntou de novo, e desta vez, quando olhou para seu rosto, viu que sua pele tinha trincado, como se estivesse usando uma máscara.
Vinícius N Neto
Enviado por Vinícius N Neto em 26/08/2018
Reeditado em 26/08/2018
Código do texto: T6430544
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