Mercy

MERCY

Piloto imbecil! Como pode? Como pode nos deixar aqui no telhado deste prédio infestado de zumbis? - vociferou Francis - Filho da mãe!

O helicóptero voou para longe deixando um rastro de fumaça.

Guarde sua raiva para aqueles filhos da mãe que querem nos devorar lá embaixo! - rebateu Louis.

Um jovem mecânico de pele negra, que escapou por pouco de um ataque no posto de gasolina que trabalhava. Ele recarregou sua única pistola. A única lembrança que tinha desde a epidemia era o de sua esposa morrer sem folego na cama de um hospital.

Que droga! Esta vida é uma bosta!

E é a única que temos.

Calma garotinhas - interrompeu Bill.

Um ex-militar convocado para conter hordas e mais hordas de zumbis. Na passagem pela ponte, uma das vigas se rompeu e ele pulou para salvar sua vida, porém, ao olhar para trás, o helicóptero do exército tinha ido embora o deixando para morrer. Desde então, sua motivação estava um pouco além da própria sobrevivência.

Tudo de que precisamos é achar um carro e sair daqui.

A pegadinha é achar o carro - respondeu Francis.

O motoqueiro tatuado, rude, habituado a falar tantos palavrões; que fugiu de um incêndio no prédio onde morava.

Vamos economizar a saliva e acabar logo com eles - respondeu Zoey, a única moça do grupo. Estava na faculdade quando os alunos receberam ordens para evacuar, no meio da correria precisou matar vários deles para conseguir fugir.

Passou na frente dos outros, Francis deu uma olhada e Louis abafou o riso.

A porta estava danificada e rangeu mas nada grave; o silêncio continuou.

Quatro sobreviventes. Foi o que restou da última evacuação e o que se sabia até agora: um dos cobaias contaminado com o vírus, criado em laboratório, escapou e entrou em contato com outras pessoas através de saliva e sangue; e propagando-se, a doença agia depressa obstruindo as vias respiratórias, os pulmões, a faringe, a laringe e a traqueia causando grave hemorragia. O cérebro do indivíduo fazia com que a pessoa ficasse totalmente descontrolada e agressiva. O indivíduo ficava muito sensível a focos de luz e a única maneira de não ser contaminado era mirando bem na cabeça da pessoa.

Um, dois, três... quatro zumbis - sussurrou Zoey observando os infectados no corredor.

Estão prontos? - indagou Bill.

Sim. - respondeu Louis.

Vamos nessa! - disse Francis.

Aproveitando que eles estavam de costas, os quatro andaram devagar. Os infectados gemiam com dores, andavam de forma desengonçada, às vezes pendendo para o lado como se tivesse um peso na cabeça.

Ao chegarem perto da escada escutaram um ruído estranho.

O que é isso? - Zoey parou.

Apareça seu maricas de merda! - provocou Francis, que já conhecia aquele som. Aquele bicho era tão irritante quanto o som que ele emitia. Não era mais uma pessoa, já tinha passado dessa fase. - Fale baixo, é um hunter!

Mas ele nos achou antes; seu bom olfato nos rastreou.

De repente, o hunter se jogou por cima de Zoey querendo rasgá-la com suas garras enormes, mas felizmente o motoqueiro mirou na cabeça do infectado a tempo de salvá-la. Ela levanta, aliviada. E nesse momento de distração, algo agarra Bill, que pede por socorro. Aquilo parecia uma corda verde apodrecida e pegajosa que ainda cheirava mal. Zoey começa a atirar incessantemente naquela direção; os demais atiram também: um com fuzil e os outros com as pistolas. Até que escutaram um estouro... Bill se livrou daquele emaranhado e se levantou. Eles olharam de perto e notaram um homem com o rosto inchado coberto de pústulas e o que parecia ser uma língua enorme se tratava na verdade do intestino vomitado pelo infectado.

Smoker… Ele era um fumante infectado pelo vírus; quando morrem, explodem liberando esse gás horroroso!

Desceram as escadas e encontraram uma bela quantidade de infectados: uns sentados, outros vagando com o pescoço pendurado, sangrando pela boca e nariz e uma outra parte encostado a parede com as mãos no rosto. Eles desligaram as lanternas e assim tiveram sucesso em acabar um por um, as paredes todas salpicadas com sangue.Seguiram em frente e se surpreenderam com um rastro de sangue que os levava na direção contrária. Zoey ficou curiosa e decidiu segui-lo. Quanto mais se aproximava escutava um som inaudível, um murmúrio e logo depois um pequeno choro.

Zoey! O que está fazendo aí? - perguntou Bill.

Espere!

Cuidado! - aconselhou Louis, apontando a arma.

O sangue parou na entrada de uma biblioteca e ela achou estranho. Vendo que não havia perigo, mirou a lanterna para a direita e encontrou um corpo de bruços sem a cabeça. A cena e o fedor causaram repulsa nos quatro sobreviventes.

Argh! - Francis tampou o nariz.

Vocês não estão ouvindo? - insistiu Zoey.

O quê?

Um pequeno choro... deve ter alguém aqui, alguém que está sofrendo.

Mas não é seguro!

Deixe-me ver.

A biblioteca escura causava desconfiança na equipe, no entanto Zoey ficou emotiva com o choro. Um pouco de vento que atravessava os ductos de ventilação fazia um barulho assustador, que parecia sussurrar entre as prateleiras dos livros e causar o eco do choro desconhecido.

Oi? Tem alguém aí?

Nenhuma resposta.

Ei você...

Nada.

Você é uma menina? Nós só queremos ajudá-la...

Silêncio e logo em seguida choro, apenas choro.

Zoey descobriu que vinha pelos fundos, de trás do balcão. Usava a lanterna para iluminar o caminho.

Eu só quero te ajudar a sair daqui.

Seja quem fosse, apenas chorava.

Zoey... - chamou Louis - Zoey!

Você está machucada? Está sofrendo? Não tenha medo... - Zoey encontrou alguém agachada com o rosto virado para a parede e ao apontar a lanterna uma criatura de olhos avermelhados, cabelos esbranquiçados e de garras enormes deu um grito perturbador.

Bill! - gritou Zoey correndo de volta para o grupo que a esperava na porta da biblioteca - Socorro! Depressa!

Atrás dela vinha uma pessoa infectada, era uma menina gritando e querendo matar. Louis rapidamente fechou as portas da biblioteca e trancou com uma barra de ferro. Aquela criatura híbrida esmurrava a porta, desesperada; as garras começavam a destruir o obstáculo e a porta foi despedaçada com sucesso. Tomaram um caminho bifurcado à direita, porém escutavam os gritos se aproximando, então resolveram atirar, mas não adiantava.

Vamos! - disse Francis, atirando enquanto corria.

Sentiram alívio quando escutaram um alto urro no meio do corredor, a criatura infectada havia morrido.

Mal haviam saído de uma situação apavorante, eles acabaram tropeçando com mais um infectado: corpo volumoso, horrível e gordo, mais inchado que o normal vomitou uma terrível pasta esverdeada. De repente, uma horda de infectados encheu o corredor e a gosma os impediam de enxergar direito.

Atirem! - mandou Bill. Disparavam a todo vapor torcendo para que cada bala atingisse seu alvo, e quando não, tinham que usar os próprios punhos para empurrar e atirar.

Carregando! - dizia Louis.

Zoey estava agachada atirando com uma pistola, pois tinha acabado a munição da arma maior. Mais dois infectados vindo de longe, Francis os acertou com o fuzil, eliminando seis balas de uma vez só.

Bom trabalho! - verificou o ex-militar.

Quando a poeira baixou, perceberam o que sobrou daquele infectado: só havia sobrado metade do quadril para baixo e uma mistura de gordura e secreções do vírus.

Boomer… - ele cuspiu.

No entanto, em comparação as demais hordas que viriam, aquilo tinha sido apenas um teste. Mais hunters e smokers.

Um elevador desativado chamou a atenção: Louis, em seu conhecimento, conseguiu fuzis para fazê-lo funcionar novamente e então ativou o motor; e o tal ruído atraiu mais infectados. Zoey avistou um Boomer a distância, mirou bem em sua enorme barriga e o explodiu.

Nada mal! - elogiou Francis. Ela deu de ombros.

Ali! - gritou o mecânico - O carro que estávamos esperando!

Chegando ao térreo, os quatro precisaram atravessar o pátio, o estacionamento e o muro de arame farpado. Viram um carro simples parado no meio da estrada. A parte mais estranha é que estavam completamente sós.

Você ainda tem munição?

Só mais um - respondeu Louis ao Francis.

Eu também estou precisando; minha pistola zerou. - confessou a garota.

Bill colocou a mão no rosto para tampar a visão do sol e enxergou uma porta. Ao entrarem no estabelecimento, notaram um corpo sentado na cadeira inclinado para frente, e no lugar da cabeça, sobrou um monte de miolos apodrecidos. Um computador desligado e um rádio. Ele pôs a pistola na cintura e ajeitou a arma nas costas; pegou o rádio tentando achar alguma frequência. O restante do grupo vasculhava o local à procura de munição ou kits de primeiros socorros. Por sorte, encontraram kits e analgésicos numa pequena prateleira de cor vermelha.

Zoey utilizava um kit, Louis parecia tranquilo e Bill buscava contato.

"O restante da população que ainda estiver na Capital, por favor, se retirem para que possamos eliminar os resto dos infectados(...)"

Sou o Bill, soldado do exército, e estou com três sobreviventes aqui precisando de resgate, câmbio! - disse afoito.

"Vocês devem sair imediatamente e procurar segurança em outro lugar."

Mandem ajuda! Câmbio!

"A Capital se concentra a maior parte dos infectados. Busquem refúgio nos campos onde não exista qualquer contato físico(...)"

Que refúgio? Que lugar seguro? Mandem resgate! - gritou impaciente.

"O governo mandou destruir a fonte de infectados(...)"

Maldição! - irritou-se, jogando o rádio na parede. Os três se olharam.

Rumo a uma brecha na parede de arame, observando ao redor o ambiente estranhamente calmo, o carro apenas alguns metros.

Achei munição! - exclamou Louis.

Zoey virou-se na direção contraria.

Rapazes...

Quando olharam para trás viram dezenas de infectados surgirem de todos os lados.

Estão prontos?

Sim. - respondeu Francis.

É pra já! - Louis recarregou sua metralhadora.

Bill não respondeu, viu aquela ameaça como o fim do mundo. Balas e cartuchos caíam no chão e não havia cessar fogo, pois quanto mais atiravam, quanto mais matavam, mais apareciam. Pouco a pouco, chegaram próximo ao carro quando o chão começou a tremer assustadoramente.

Que diabos é isso?

TAAAANK!!! - gritou Bill.

Os militares o conheciam, seu nome era uma abreviação de tanque de guerra, uma comparação tão justa pelo seu imenso tamanho e força bruta; um infectado com o triplo do tamanho de um gorila, seus braços eram o dobro da sua altura, musculoso e muito rápido. Eles recarregaram as armas sem parar, porém quanto mais ele era atingido mais poderoso parecia ficar. O monstro atropelava qualquer um que estivesse no seu caminho, para ele não havia obstáculos, jogava objetos para cima e esmagava os infectados como formigas. Bill procurou as chaves do carro no banco, no parabrisa, no tapete, enquanto sua equipe lhe dava cobertura. Francis correu na direção oposta sendo perseguido pelo monstro. Uma outra horda correu naquela direção. Tank arrastou Francis e o jogou violentamente contra o concreto.

Socorro! - gritou. Sentiu as costelas estalarem, o braço pender mas continuava atirando com a única mão boa. Ele estava certo de que iria morrer ali.

Bill vasculhou as gavetas e o banco do passageiro.

De repente, o enorme monstro parou de se mexer e inclinou-se pesadamente para frente, morto; Francis se jogou para o lado para evitar ser esmagado por aquela coisa.

Zoey estendeu sua mão.

Obrigado! - respondeu ele. Zoey colocou o braço bom de Francis em volta do pescoço para segurá-lo até o carro.

Vão! Vão! - gritava Louis recarregando a arma.

Bill finalmente conseguiu ligar o carro. Eles entram no carro e Francis se senta com dificuldades, soltando alguns gemidos de dor.

Acho que ele quebrou alguma coisa... - disse Zoey preocupada.

Louis! - gritou Bill. O rapaz veio correndo e atirava nos infectados, cada vez mais próximos, eles começavam a subir pelo arame farpado.

Bill pisa firme no acelerador e o carro sai em disparada deixando poeira e fumaça e um monte de zumbis para trás.

Louis limpou o suor da testa. Francis teve um corte na testa, hematomas e com uma mão pressionava a barriga, uma de suas costelas estava fora do lugar. Com o único kit de primeiros socorros que sobrou, Zoey usou no companheiro ferido.

Vamos ficar bem longe deles da próxima vez, está bem? - disse Louis sentado no banco do passageiro olhando para trás.

Francis está ferido e precisa de cuidados. Vamos para um lugar seguro. - sugeriu Zoey.

Não existe lugar seguro, senhorita - rebateu Bill. - É a segunda vez que abandonam um soldado para morrer.

E o que você sugere?

Vingança - Bill sorriu cruelmente.

A moça viu os olhos inflamados do soldado pelo retrovisor. E seguiram para o norte, que de acordo com o mapa, era onde se concentrava o terreno militar.

Nefer Khemet e Chet Faliszek
Enviado por Nefer Khemet em 25/12/2018
Reeditado em 27/01/2021
Código do texto: T6535474
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