A TEMPESTADE - Parte 2

Decidiram ir ao barco de onde haviam visto o sinal mas não todos. Carlos e Angela ficariam no barco. Carlos sabia pilotar e caso acontecesse algo ainda poderia tentar tirar os outros dali. Desceram em um bote inflável e Silvia notou algo na água que tinha uma camada grossa de musgo verde sobre a superfície e em todo lugar. Rapidamente o pequeno bote levou os três amigos até o barco de onde parecia vir o sinal.

Ao se aproximarem do barco Sancho leu o nome "ANGLO-AUSTRALIAN". Era um pequeno cargueiro inglês, provavelmente da primeira metade do século 20. Subiram a bordo com dificuldade mas conseguiram jogar as cordas e alcançar o convés. Dentro do barco nenhum sinal de vida mas tudo em perfeita ordem. Paul desceu seguido por Silvia e Sancho ao compartimento de carga e constatou que a carga estava intacta. Não havia sinal de luta ou de graves avarias no barco. Então decidiram fazer a busca juntos. Não queria se separar pois não sabiam o que iriam encontrar ali.

Paul decidiu ir na cabine do capitão para ler o diário de bordo a fim de encontrar alguma pista de todo aquele mistério. Vagaram pelos corredores úmidos do barco até encontrar a cabine do capitão que estava limpa e seca. Paul procurou nas gavetas e logo encontrou o diário que tinha última data de 23 de março de 1938, no entanto não havia nada de anormal exceto um incidente com um marinheiro por indisciplina e a tempestade súbita que aparentemente surgiu do nada.

Paul ficou frustrado e pensou em continuar a busca pela pessoa que tinha enviado o sinal mas Sancho e Silvia achavam melhor voltar para o barco e sair dali. Paul insistiu que pudessem ao menos varrer o barco de popa a proa ao menos uma vez, todos juntos, e depois iriam embora. Sancho e Silvia aceitaram com certa resistência e o grupo continuou a busca.

Silvia ficou curiosa, como bióloga, sobre o musgo verde que haviam encontrado em todas as partes do barco e quis examinar, retirando com cuidado um pedaço e colocando em um vidro para análise posterior quando deu um grito assustada dizendo que o musgo havia se movido e espetado o dedo dela que apresentava um pequeno corte em seu dedo indicador que sangrava. Sancho achou estranha a ideia do musgo verde se mover, ajudou a fazer um rápido curativo e pediu para Silvia ter cuidado.

Prosseguiram pelo corredor úmido e não encontraram nada. Nenhum sinal de vida. Por fim em uma das cabines acharam a lanterna que funcionava com um pouco de querosene. Estava em um canto da cabine. No outro canto havia um homem ou o que outrora fora um homem. Estava muito magro, pálido e assustado. Suas roupas eram um farrapo e fedia a peixe como se fosse um pescador que não tomava banho há muito tempo. Sua aparência era de alguém que estava morrendo de fome lentamente, muito pálido e abatido.

O homem se apresentou como sendo George McCarthy, o primeiro oficial do barco e parecia estar confuso, assustado e perdido. Perguntou que ano era e Paul horrorizado nao acreditava que aquele homem pudesse estar vivo naquele local. Ofereceram água e comida mas o homem rejeitou. Ficava olhando o horizonte e dizendo que o capitão iria voltar para busca-lo. Perguntou de onde eram e Paul disse que eram dos EUA e tinham vindo da Flórida. O homem fitava o horizonte como se estivesse hipnotizado e não respondeu quando o grupo ofereceu ajuda novamente, perguntando se ele queria ir embora dali. Era como se o velho marujo pertencesse aquele lugar para sempre.

De repente o marujo, como se tivesse acordado de um transe alertou para que eles saíssem rápido dali, viajando para o sul, sempre para o sul. Paul perguntou para ele porque não queria ir e então o marujo olhou para Paul com olhar sério e disse que ele não deveria sair jamais daquele lugar e que deveria esperar pelos companheiros. Silvia perguntou intrigada como havia sobrevivido, ao que o marujo simplesmente respondeu que "aquilo nos alimenta mas nós também o alimentamos". Todos fiaram em silencio com aquela resposta. Paul perguntou se ele havia feito o sinal e o marujo disse que sim, que sempre fazia o sinal para que o capitão retornasse com os homens que restaram. Depois com um olhar triste e olhando para o horizonte o marujo disse melancolicamente " mas ele nunca voltou ".

Sancho e Silvia olharam para Paul desesperados e Paul fez uma última pergunta: " Como podemos saber onde fica o sul? Os instrumentos não funcionam aqui.". O marujo não respondeu, votou ao transe e ficava agora falando coisas sem sentido, de sem próprio tempo, falava da noiva, da viagem, dos problemas com o marinheiro indisciplinado e da tempestade.

O grupo perguntou uma ultima vez se ele queria sair dali mas ele nao respondeu e ficou num canto escuro da cabine falando sozinho e olhando para o vazio.

Deixaram a cabine e se dirigiram ao convém com a certeza de que havia algo muito errado ali. Ao menos sabiam que havia uma saída e deveria ser navegando ao Sul.

Entraram no bote e se afastaram do velho cargueiro inglês, há muito desaparecido. Estavam abatidos, com medo de terminarem como a tripulação do ANGLO-AUSTRALIAN. Silvia parecia mais abatida do que os outros. Sancho ofereceu um pouco de água ao que Silvia aceitou mas depois vomitou tudo.

Paul pilotou o bote inflável rapidamente de volta ao barco onde Carlos e Angela os receberam felizes mas depois preocupados com o que ouviram. Silvia então quis descer e fazer alguns testes básicos com o pedaço de musgo verde. Sempre trazia na bagagem seu kit de biologia com varios instrumentos. Adorava estudar a vida marinha. Ficou algumas horas concentrada e depois fez uma descoberta surpreendente. O Musgo não era vegetal nem animal mas um pouco de ambos e se alimentava de material orgânico. Todos ficaram surpresos com a descoberta de Silvia que estava animada mas também cansada e resolveu dormir um pouco.

Paul tentava calcular a posição do Sul e tendo como base sua ultima posição fez a volta e partiu em uma direção no meio do cemitério de navios. Perceberam que já era noite e então notaram vultos que se moviam nos barcos, como fantasmas do passado. Ouviram então aterrorizados gemidos, gritos e sons que não pareciam ser humanos.

Paul acelerou um pouco na tentativa de encontrar logo o ponto de saída do nevoeiro e do cemitério de navios. Quando notou tentáculos se movendo na direção do barco. Desviou e continuou a jornada, assustado com Carlos ao seu lado não acreditando no que via.

Então sentiram uma batida no fundo do casco ao que Paul gritou para Carlos ir verificar o estrago, acrescentando que o barco não iria aguentar outro dano no casco. Carlos desceu correndo para a sala de maquinas e suspirou aliviado quando viu que não havia nenhum dano alem daquele que já havia ocorrido e que havia sido tratado provisoriamente. Certificou-se que as bombas ainda funcionavam dando conta do recado e já estava subindo quando novamente algo atingiiu o casco mas desta vez mais forte. O sangue de Carlos gelou em suas veias e ele subiu correndo para contar a Paul quando finalmente viu uma luz e o nevoeiro se dissipando. Haviam conseguido encontrar uma saída para o cemitério de navios e para o nevoeiro.

Paul acelerou o barco enquanto Angela e Sancho olhavam para tras e viam o nevoeiro se afastando e sumindo no horizonte junto com o cemitério de navios esquecidos no tempo.

O grupo ficou animado e Paul viu que os instrumentos voltaram a funcionar mas que estavam um pouco longe demais da costa e o combustível não era suficiente para retornarem.

Ouviram um grito de socorro vindo do mar. Olharam em volta e viram uma mulher pedindo ajuda. Rapidamente desceram o bote e foram ao resgate conseguindo salvar a mulher. Que estava nervosa e ao mesmo tempo agradecida. Era uma mulher jovem, muito bonita e cega completamente cega. Perguntaram seu nome e era respondeu que se chamava Marisa. Perguntaram o que aconteceu com o barco onde ela estava e ela disse que naufragou com a tempestade. Ofereceram agua e alimentos para ela nao quis. Disse que estava muito cansada e queria se deitar. Providenciaram uma cama para ela em uma cabine e ela dormiu um sono profundo. Todos ficaram surpresos em encontrar um sobrevivente aquela tempestade terrível.

Paul procurou nos mapas algum porto próximo ou ilha onde pudesse encontrar combustível. Além disso, sabia que o barco não iria suportar outra tempestade e não queria correr riscos. Encontrou uma ilha não muito longe e explicou ao grupo o que pensava em fazer e todos apoiaram a decisão. Depois comeram alguma coisa e foram todos dormir.

Mas nem todos conseguiram dormir naquela noite. Sancho se levantou e foi ver Silvia e constatou que ela estava terrivelmente pálida e gelada como se estivesse morta mas dormia um sono profundo. Sancho se levantou para falar com os outros quando sentiu a mão gelada de Silvia pegando na sua mão e ouviu ela tentando dizer alguma coisa. Sancho encostou então o ouvido e Silvia disse que "Aquela coisa troca o sangue humano por uma substância com água salgada, nos dando em troca ilusões e fantasias, num mundo surreal do qual não podemos partir e assim nos perdemos para sempre".

Sancho tentou acordar Silvia que voltou a dormir um sono profundo. Percebeu horrorizado que o corpo de Silvia estava mais pálido e magro do que nunca, como se fosse uma prisioneira de algum campo de concentração nazista. Então, Sancho se levantou correndo e foi as outras cabines onde gritou a todos que acordaram e foram rapidamente a cabine de Silvia mas encontraram a cama vazia e úmida. O corpo de Silvia havia desaparecido completamente.

Paul achou que Sancho tivesse feito alguma coisa mas logo mudou de ideia pois conhecia Sancho de longa data e ficou sem ainda saber de fato o que havia acontecido ali. Procuraram em todo o barco e nada não havia nenhum sinal de Silvia.

CONTINUA...

Cronista das Trevas
Enviado por Cronista das Trevas em 28/04/2019
Reeditado em 24/01/2020
Código do texto: T6634272
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