Silvano, apenas um trabalhador.

Silvano, apenas um trabalhador

Valéria Guerra Reiter

Chovia na comunidade. E Silvano descia a ladeira assoviando. Ele estudava a noite, e trabalhava de dia.

Algo que em tempos líquidos, era artigo de luxo. Afinal há um exército de catadores de papelão e lixo soltos pela "Cidade Maravilhosa". As rugosidades que sobraram do tempo do Rio Colonial são muito admiradas por turistas desavisados.: que se encantam com a estátua do Duque de Caxias, e com o Paço Imperial, onde Tiradentes ficou preso, no Calabouço, antes de ser enforcado e despedaçado.

O nosso Silvano trabalhava como vendedor em um Mercadinho no Centro do Rio de Janeiro - hoje largado às traças. Bem, Silvano mora em uma imensa Comunidade do Rio, mas lê. Agora, ele está lendo "O 18 de Brumário de Luís Bonaparte". Quem indicou? ninguém, ele prestou atenção quando o professor de História comentou sobre isso.

Mulato, 25 anos, casado, dois filhos e um sonho: ser professor de História.

A pressão social faz a sua parte, tenta aliená-lo, mas ele resiste. Mesmo tendo casado cedo; sua esposa, a Rita, também é estudiosa, ela gostava muito de assistir aulas de todas as disciplinas, quando ainda cursava o Ensino Médio, naquele tempo em que Biologia, Química, Física e História faziam parte do Currículo.

Ela terminou a fase média, e não pode dar continuidade aos estudos, pois teve dois filhinhos, em tempo recorde: o sonho dourado de um sistema que forja, prepara e engendra, o mal comum. Bem, o Silvano, mesmo caindo de sono, vai para aula à noite, e "manda ver", o que ele não sabe é que ele enfrenta um Tigre a cada dia, corre risco de ser assaltado, ou morrer em uma enchente, no trajeto para casa. Ele está no último ano do E.M. E o que mais o indigna é ter "Aula de Brigadeiro" no lugar das aulas de Química. Ele já tem noção de que tal deboche/política, é pior que vinte chibatadas no lombo, em uma Fazenda ou Engenho do Brasil Colônia, ou Império.

E o moço continua perseverando, sem pensar em se corromper. Quer vencer simplesmente pela dedicação autodidata, mas também não se ilude, ele sabe que o Sistema não quer vê-lo graduado, de jeito nenhum, o que o sistema quer é que ele morra rápido, e vire apenas uma estatística. Depois que servir bem de massa de manobra para retroalimentar o Sistema Desigual e combinado.

E o que tem de terrível nisto?

Em 2030, Silvano é professor de História, formou-se, a esposa voltou a estudar, e se graduou também, virou atriz. Fez artes cênicas. O mais velho com 12 anos já ensaia seu caminho no teatro, e a mais nova, com 08, ama esportes, mas gosta de física. Estudam, e agora residem na zona sul. Como isso aconteceu? eles mantiveram o foco, e não se corromperam. Conseguiram alugar um quitinete, no Largo do Machado. Ele foi escolhido por uma Escola Particular para ministrar aulas, primeiro ganhava muito pouco, menos que um salário, depois conseguiu mais turmas, e o salário aumentou. Parece até mentira.

Em um belo dia de sol, ele, os filhos e a esposa foram pela primeira vez conhecer o Jardim Botânico, e quando estavam caminhando para chegar ao local aprazível, foram assaltados, rendidos por 08 robôs humanóides, que armadas disseram: - Mãos pro alto! é um assalto! e de mais a mais, a nossa missão é exterminar pobres, como a Dona Agenda 2030 determina em suas entrelinhas...e então desta forma fúnebre e triste, perdemos Silvano, Rita, Procópio (12) e Beatriz ()8). Na verdade, eles não reagiram...

O curioso é que Silvano significa etimologicamente “deus da floresta” um lutador...

Valéria Guerra
Enviado por Valéria Guerra em 27/01/2024
Reeditado em 31/01/2024
Código do texto: T7986072
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