O bosque

Como chegara àquele bosque? Esquecera. Havia enlouquecido? Era tudo tão estranho. Estava absolutamente sozinha e, no entanto, não tinha medo. Antes, costumava ter medo da solidão. Embora viver cercada de gente pudesse ser entediante, tinha medo da solidão e se perguntava se conseguiria respirar se se visse sozinha. Mas, agora, vendo-se só, ela não tinha medo algum. Não havia ninguém por perto a lhe dizer o que fazer ou como se comportar e isso lhe aliviava. Pela primeira vez, o gosto absoluto da liberdade e de ser apenas ela mesma. Sentou na relva.

Apreciando a beleza melancólica do bosque, ficou contemplando as árvores, tão anciãs, tão imponentes. Pareciam velhas senhoras, cheias de sabedoria antiga, prontas a ensinar os segredos do mundo e a revelar o ciclo vital que corria nas veias de todo ser vivo.Mais tranquila, descalçou os tênis e deixou os pés sentirem a terra úmida e fértil. As flores selvagens eram tão diferentes das flores de jardim, tinham uma beleza espontânea, pura, despida do contato com qualquer mão humana que as podasse aqui e ali. Cresciam como a natureza as determinara, sem que nada detivesse seu ciclo natural.Viu os marrecos que nadavam no lago, livres e selvagens e desejou ser selvagem também. Havia pureza naquilo tudo, pureza nas aves aquáticas que nadavam, nas flores selvagens, nas árvores envelhecidas, na vegetação verde-escura. Quis estar livre de tudo. Despiu-se. Ali, nua, sentia-se pura e imaculada, totalmente natural.

Mergulhou nas águas profundas do lago, nadando com prazer, a água fria refrescando sua pele nua, renovando-a, enchendo-a de uma energia que ela nunca sentira antes.Sentia-se viva, forte e descobrira o que antes não sabia: a consciência de estar viva, de possuir dentro dela. Aquele instante, aquele bosque, aquele lago, eram só dela. Ela podia andar sem roupa, ser só quem era. Nadou mais e saiu das águas, diferente. A pele estava fria mas, por dentro, ela queimava. Queimava de excitação. Teve ímpetos loucos de rir e riu, porque estava feliz. Estava feliz porque tinha consciência de que tinha muita vida dentro dela.

Quando sua pele secou, não se vestiu de imediato porque, sem roupas, sentia-se pura e limpa. Por que as pessoas achavam a nudez indecente? Passeou entre as flores, acariciando-as sem colhê-las porque colhê-las lhe parecia uma violência. A natureza devia ser respeitada. E as flores deveriam ficar onde estavam, os marrecos, as árvores e o lago deveriam permanecer como eram. Por isso, depois de voltar, não contaria a ninguém sobre aquele bosque. Que o bosque permanecesse em sua pureza imutável.

Vestiu-se e não demorou a achar novamente seu caminho. Quem a conhecia, perguntava onde estivera e dizia que estivera andando a esmo. Duvidavam, respondendo que ela estava mudada e andar a esmo não poderia mudar alguém tão profundamente. Rindo muito, falou que descobrira que estava viva e responderam: "Mas como você não sabia que está viva?Todos nós não estamos?'

Deixou que pensassem o que quisessem. Ela nunca falaria sobre o bosque. Lá, ela se descobrira.