O maior de todos os inimigos

Haviam dez minutos que ele estava de pé, totalmente inerte. Sua garganta já não mais podia pronunciar qualquer som, por mais que se esforçasse. Estava estático. Uma pequena gota de suor, gelado, escorria pelo canto esquerdo de sua testa, rígida pelo pavor que o dominava. Seu coração palpitava, mais rápido do que o de costume. Sua respiração era ofegante, porém silenciosa. Não se permitia fazer qualquer ruído. A angústia lhe dominava, queria se mover, mas não podia. Queria correr, mas suas pernas não mais lhe obedeciam. A expressão em seu rosto tornava o seu desespero visível para qualquer um que pudesse vê-lo naquele momento, mas infelizmente não havia ninguém que pudesse vê-lo. Ninguém além do seu maior inimigo.

Por um segundo seus pensamentos voltaram alguns minutos atrás, no momento em que estava sentado em seu sofá assistindo a um filme que não podia mais se recordar qual era. Sua garganta estava seca por um bom tempo quando finalmente resolveu levantar-se para ir a cozinha pegar algo para beber. Ficou se perguntando por que diabos tinha que ter se levantado naquele exato minuto para ir à cozinha. Talvez se tivesse demorado mais alguns minutos pudesse ter evitado o encontro. Mas não foi o que aconteceu. Levantou-se e dirigiu-se à cozinha. Quando acendeu a luz, lá estava ela: causadora de tamanho medo, a criatura mais horripilante na face da terra. A simples visão de tal criatura era o suficiente para paralisá-lo, e assim ele ficou.

Seus olhos piscaram quando as lembranças se foram, fazendo que sua mente retornasse para a cozinha, para o seu maior inimigo. Seu coração, ainda disparado, começava a doer. Talvez pela imensa velocidade com que batia. Seus olhos voltaram a encarar a criatura à sua frente. Não conseguia imaginar uma criatura mais medonha, mais assustadora. Dotada do incrível poder de atacar a mente de suas vítimas. No seu caso causando paralisia. Começou neste momento, que poderiam ser os últimos minutos de sua vida, a analisar a criautra: Suas seis pernas continham espinhos que, em sua concepção, seria o suficiente para matar um ser humano. De sua cabeça, que era desproporcional ao tamanho do corpo, saiam duas grandes antenas que se moviam o tempo todo. Provavelmente eram instrumentos extra-sensoriais, usados para ler a mente de seus inimigos. Suas asas descansavam por cima do grande corpo que era protegido por uma armadura que parecia extremamente resistente. No parte de trás, um pouco acima das asas e abaixo da cabeça, pairavam dois grandes olhos, que provavelmente permitiam visão de 360 graus, o que tornava qualquer emboscada para esta criatura praticamente impossível.

Paralisado e com os olhos fixos na criatura, pôde perceber quando ela esboçou um movimento em sua direção. Seu coração começou a disparar, mais rápido do que antes. Sua respiração tornou-se mais ofegante. Queria fugir, queria correr, mas não era possível. Seu corpo não respondia mais a seus impulsos. Seu coração parecia querer pular fora de seu peito, tamanha a velocidade com que batia. Lembrou-se, nesse momento, que não havia tomado sua medicação noturna ainda. Sabia que seu coração era frágil e não resistiria por mais tempo, mas seu inimigo não dava trégua, estava ali, prestes a atacar. Tentou, em um esforço imenso, fazer suas pernas responderem, para que pudesse correr para um lugar seguro, aonde pudesse tomar seus remédios, mas parece que o inimigo detectou sua intenção, e deu mais um passo em sua direção. Seu coração deu a última batida, forte como uma bomba que explodia em seu peito. Tinha certeza que este tinha sido o ataque fatal de seu inimigo. Seu corpo caiu em direção ao chão, fazendo com que sua cabeça batesse com força. Quase inconsciente e com seus olhos quase se fechando, fitou seu inimigo pela última vez, antes que sentisse seu coração funcionar praticamente sem forças. Em sua cabeça, talvez tivesse agradecido que a tormenta tivesse acabado, que o pânico não mais tomasse conta de seu corpo, mesmo que tivesse sido derrotado. E lá no chão da cozinha deu seu último suspiro antes que seu coração, em lentas batidas, cessasse seu funcionamento de vez. Seus olhos se fecharam e em seu rosto podia ser visto um certo ar de tranquilidade. Talvez estivesse feliz. Nesse momento, a pequena barata, assustada com o barulho e a movimentação que a queda do corpo causou, deu meia volta e voltou para o pequeno buraco na parede de onde veio.