Dois Médiuns - parte II

- Mas, espere, agora observo que estamos num cemitério, o que fazemos aqui? Não me recordo de sair para os bares da vida como você, um sujeito comedido, família, não me diga que me embriaguei e vim parar aqui dentro, ébrio...

Angelo conservou-se em silêncio, apesar de manter um ar sereno na sua face. O braço sobre o ombro do amigo, de longas datas.

- Você está estranho, poderia me deixar em casa? Sinto-me cansado, sem energias, como se tivesse passado uma semana sem dormir.

Deram meia volta, voltaram ao cemitério. Angelo percebeu que precisava dar ao amigo um tratamento de choque, sem delongas. sentaram-se em duas tumbas, um frontal ao outro.

- Recorda-se, pelo menos quem você é?

- Lembro com clareza a seu respeito, é o meu amigo de fé, companheiro de todas as horas. A bebida às vezes proporciona uma amnésia temporária, e sinto a minha cabeça doer.

-Veja à sua volta.

Então, Maurício pôde observar uma multidão, que lhe parecera a poucos instantes invisível aos seus olhos, tamanha era a sua desorganização mental. Inúmeros vultos, circulando por entre as covas, túmulos. Alguns, feitos zumbis, como ele estava ha poucos momentos. Outros choravam de forma desesperadora. Alguns reagiam, com espanto por estarem ali, num cemitério áquela hora da noite, alta madrugada, sombria e molhada pelo fino chuvisco. Notou algumas figuras que possuíam aparência assustadora - á semelhança de feras. Os rostos eram angulosos, de supercílios proeminentes, olhos assustadores. Os dentes amarelos e pontiagudos. Maurício, ficou de pé, tamanho foi o susto ao avistar alguns mais assustadores - estes tinham par de chifres na testa, ostentavam um rabo daqueles que as figuras do diabo tinham nos livros de Magia Negra. A pele era escura, ou vermelho ocre. Estes davam risadas fantasmagóricas, guturais - Maurício ficou em pânico.

Pôde observar que estes tinham ali, certa autoridade, pois iam de cova em cova selecionando os miseráveis que lhes eram de direito. Usavam de um poderoso chicote, e os continham com feras selvagens, presas em poderosas correntes para juntá-los num determinado canto do cemitério. Alguns possuíam tridentes, e assim os fustigavam nas costas.

Eram velhos e mulheres, senhoras e jovens, de ambos os sexos. Não via crianças entre eles.

- O que se passa, homem? Diga-me, estamos num pesadelo?

Bradava, sentindo um frio de medo a lhe percorrer a espinha. Suas pernas tremiam, a voz embargada, presa na garganta. As mãos suando frio, trêmulas.

- Vamos fugir daqui, como viemos para num local deste, numa cena tão insólita? Eu quero ir para minha casa...

- Maurício não temos como fugir.

- O que está dizendo? Vão nos pegar...

Então, ao se erguerem das covas, onde estavam sentados, Maurício, com espanto viu a foto do amigo na lápide. Com horror, falou:

- Angelo...a sua foto...a sua foto está nesta lápide.

- Sim, e se se virar, a sua está nesta outra, onde estava sentado.

E, Maurício viu, ali a sua cova.

-Estamos mortos, hoje é o dia do resgate dos mortos.

-Oh, meu Deus, quer dizer, que estamos mortos, morremos? Diga-me que estamos num pesadelo.

Falava assim, assustado, se chocando por entre as árvores e túmulos, em completo desequilíbrio emocional. Chorava.

Um senhor vestido de branco saiu da escuridão do cemitério e se apresentou para os dois amigos, e disse:

- Vamos, é chegada a hora de ir.

Maurício viu o amigo Angelo ir junto com uma trupe de pessoas vestidas de branco, envoltos por repladescente luz branca - havia naquelas pessoas uma tranquilidade e uma paz envolvente.

- Esperem por mim...

Gritou, com desespero, quando o que parecia o líder daquela trupe de luz lhe disse:

- A vida é uma peça de teatro, onde no tablado da vida escolhemos os nossos personagens - temos esses livre-arbítrio. A sua escolha ja foi feita:foi ébrio, imoral, desoneto, mal pai de família, péssimo amigo, egoísta, entre outros males. À luz para os que são da luz, ás Trevas para quem serviu ás Trevas.

- Ei, você, venha para ca.

Vociferou um dos demônios branindo o chicote e jogando uma das feras acorrentadas contra ele.

Fim

Leônidas Grego
Enviado por Leônidas Grego em 17/10/2012
Reeditado em 19/10/2012
Código do texto: T3938390
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