O GRITO - CAPÍTULO 1 – O AMOR, A CRIATURA E A SERPENTE.

O amor.

Ah, o amor...

O mais nobre sentimento, que a tudo perdoa e que não pede explicações, foge a dicionários e tem mil e uma definições.

Amor materno;

Amor paterno;

Amor fraterno;

Amor carnal;

Amor celestial;

Amor a Deus;

Amor humano;

Amor divino;

Amor ao próximo;

Amor próprio;

Amor em comunhão;

AMOR!...

O sentido da vida, a música para os poetas, inspiração eterna. O que move o a humanidade, combustível dos sonhos, verdade incontestável, caminho inevitável.

Porém lá estava a criatura, um nada no meio do nada, apenas uma sombra se apagando, uma infeliz obra da natureza. Mas afinal o que era aquilo? Uma pessoa? Acho que não. Um ERRO talvez, um ERRO DIVINO! Uma TRAGÉDIA DA NATUREZA! Alguém, ou algo, a qual não se aplicava as definições do amor.

Sim, lá estava, em meio às trevas, sozinho, na beira de um precipício, jazendo lento e dolorosamente, lembrando cada minuto de sua insignificância, cada segundo de sua vida. Vida? Não, não se pode dizer que aquilo tenha sido vida, já nasceste morto.

Uma criatura sombria, amaldiçoada, tão repugnante que fora rejeitado pelo próprio ventre que te geraste. E assim, não viveu apenas existiu nas margens da sociedade, rejeitado por tudo e por todos, até pela própria alma, que se recusava a habitar aquele ser.

Nunca entenderas o porquê da sua existência, fora exilado pelos Deuses, banido do Paraíso e rejeitado pelos Demônios. Odiou a tudo e todos, até que cruzaste com o amor nos olhos de uma serpente. O amor que a tudo transforma! E então acreditou, pela primeira vez acreditaste em algo, pela primeira vez tiveste sonhos e fizestes planos, e até acreditou que tiveste uma vida.

Mas o amor pode ser a mais perigosa e destrutiva arma. O mesmo amor que encanta, também fere. E aquela criatura, jamais saberá o que realmente é AMOR. Pois amor nenhum jamais habitará aquilo que há em seu peito.

E mais uma vez és rejeitado. Não terás amor, não terás nada! Apenas habitarás as profundezas, viverás em sombras, em meio às mentiras, em meio ao estrume, nas trevas e terás como companhia fiel a humilhação, a rejeição, a dor e o ÓDIO! Sim o ÓDIO, irmão gêmeo do AMOR! Apenas o ÓDIO!

E agora em sua mente perturbada, as desgraças de sua existência lhe assombram e a criatura praguejava com ódio sua existência:

- Olho o mundo a minha volta com total desprezo e revolta. Não encontro a paz, porque a paz eu não procuro mais, assim como já não procuro a luz na escuridão.

- Nasci mudo para o mundo e mudo morrerei.

- Nasci surdo para as palavras belas e surdo morrerei.

- Nasci cego para as Glórias Divinas e cego morrerei.

- Sinto a agonia de viver em um mundo caótico e miserável, sinto o ódio correr em minhas veias, sinto o fogo que consome minha alma; sou trevas.

- O meu coração pétreo se dilacera em meu peito por repulsa a qualquer sentimento, as minhas mãos enrugadas e ásperas se contorcem, minha garganta seca como o solo infértil dos desertos rasga uma tosse monstruosa, como que um anuncio do que me aguarda nas sombras dos meus pensamentos.

-Se eu ao menos pudesse gritar, eu gritaria o meu ódio, se eu ao menos pudesse gritar, eu gritaria meu desprezo pela vida, se eu ao menos pudesse gritar, eu gritaria minha ânsia, se eu ao menos pudesse gritar eu gritaria...

Então, quando sua existência se dissipara e o precipício lhe engolira, sentindo as labaredas do Inferno lhe acariciar a pele, sentindo as nuvens cinzentas embaçarem a sua vista, lembrando dos olhos da serpente, o medo, a dor, a aflição e todo o ódio do mundo tomam conta do seu “ser”; em seu ultimo suspiro, sentiu sua garganta rasgar, e como que em uma explosão, ouviu a sua voz ranger alto e claro em um grito:

- MONSTRO!!!

- TU ÉS MONSTRO!

- MONSTRO!!!

Sua voz que mais parecia um trovão ecoou por todos os lados, ultrapassou as barreiras da escuridão, atingiu o inatingível e se fez ouvir nos quatro cantos do mundo, e por onde mais o vento pudesse soprar.

- MONSTRO!!!

- TU ÉS MONSTRO!

- Monstro, que invade a minha mente e faz de meus pensamentos o seu lar.

- Monstro que rouba meus sonhos, que tira meu sono e me faz delirar.

- MONSTRO!!!

- TU ÉS MONSTRO!

- Monstro que destrói minha vida, que devora o amor, acaba com a minha paz e só deixa o pavor.

- MONSTRO!!!

-Nas noites frias e escuras sua face me assombra, teu olhar me congela, sua voz me entorpece e eu sinto medo, sou apenas uma criança, sem fé, sem força, sem esperança.

- MONSTRO!!!

- Porque me fizeste crer em suas mentiras? Suas verdades inventadas e sua vida vazia?

- MONSTRO!!!

- Me condenaste ao Inferno de Dante, apunhalaste meu coração, assassinaste minha alma, abandonaste meu corpo e agora segue o seu caminho de glória, com um sorriso nos lábios, a maldade no olhar e o seu jeito errante.

- MONSTRO!!!

- TU ÉS MONSTRO!

- MONSTRO!!!