PERFUME DE MULHER

    Sexta feira, 22:00h. O movimento no aeroporto de Congonhas era grande por ser início do fim-de-semana, sendo agravado pela confusão ocasionada pelos atrasos nos horários de chegada e saída de aviões. A minha esperança consistia em conseguir embarcar e retornar para casa após uma semana cansativa em São Paulo. Cansado e ansioso dirigi-me ao guichê da companhia aérea a fim de fazer o checking para o embarque, mas lá chegando fui informado que o vôo estava atrasado por motivos técnicos. Fiquei triste porque só me restaria aguardar na sala de espera até que pudesse embarcar. Acomodei-me em uma poltrona e tentei não me aborrecer com os transtornos do aeroporto e com um indisfarçável sorriso irônico no rosto lembrei-me do conselho da Ministra do Turismo. Comecei a folhear uma revista porém a impaciência causada pelo cansaço não me deixava concentrar na leitura. De quando em vez dava uma espiada na televisão, porém meus olhos cansados nada percebiam que pudesse me prender a atenção. As horas passavam e nenhum funcionário da empresa anunciava o meu vôo.
    Vencido pelo cansaço adormeci recostado na poltrona sendo acordado por um burburinho de passageiros que se apressavam no saguão. Estavam sendo liberados alguns horários. Rapidamente peguei os meus pertences e procurei o balcão da companhia. Passava das 02:00h e finalmente eu iria para casa. Enfim o momento do embarque. Sentei-me na poltrona ao lado da janela e a primeira providência foi relaxar. A minha intenção era cochilar. Rapidamente o avião foi sendo lotado. Com o fone de ouvido eu escutava músicas e relaxava tentando dormir durante o vôo. Senti um toque no ombro esquerdo e ao abrir os olhos deparei com uma mulher alta e muito bonita, com os cabelos negros longos e  vestida num vestido preto incomum. A mulher me cumprimentou e perguntou se eu me importaria de trocar de lugar porque ela preferia viajar na poltrona da janela. De maneira nenhuma, respondi e de pronto levantei-me e deixei que ela sentasse na poltrona solicitada, sentando-me ao lado dela. Pelo menos faria a viagem em companhia agradável, pensei.
    O comandante anunciou que iniciaria os procedimentos de decolagem enquanto orientava aos passageiros quanto ao comportamento de praxe em caso de sinistros. Enquanto as comissárias faziam mímica sobre os procedimentos de utilização dos equipamentos à medida que o piloto falava, notei que a jovem apresentava-se ansiosa. O avião enfim decolou. O perfume daquela mulher era muito forte. Eu procurava relaxar um pouco e tentava cochilar quando ela me perguntou se podíamos conversar porque estava necessitando de atenção. Então ela começou a me contar que dias antes saíra de Porto Alegre para vir ao encontro do noivo em São Paulo e que ao chegar havia sido vítima de um terrível acidente porque o avião explodira ao pousar. Estranhei aquele relato e achei que a mulher estava brincando ou que não estava bem da cabeça.
   A viagem prosseguia e de vez em quando aquela misteriosa mulher relatava alguma coisa ocorrida sempre associando o fato ao acidente que dizia tê-la vitimado. O meu cansaço era grande e a atenção que eu procurava aparentar aos seus assuntos ia diminuindo à medida que o sono me dominava. Enfim adormeci, embalado pelo movimento do avião. Despertei com um toque no ombro dado por uma comissária que me pedia para colocar o cinto de segurança porque iríamos pousar. Preparei-me para desembarcar e percebi que a mulher que viajara ao meu lado na poltrona da janela não estava mais lá. Encabulado, comecei a pensar como ela passara por mim sem me despertar. Pensei: deveria ter ido para outra poltrona. Perguntei a comissária pela estranha passageira e ela disse que nenhum passageiro trocou de lugar durante o vôo. Expliquei que a mulher estava sentada Ao lado da janela e dei a descrição. A comissária disse não haver a bordo nenhuma mulher com aquelas características. Fiquei calado tentando entender o que acontecera enquanto o avião chegava ao Santos Dumont. Antes de descer mais uma vez perguntei a comissária por aquela passageira e ela, brincando comigo, disse-me que eu havia sonhado durante a viagem ou viajado com um fantasma do acidente da TAM. No caminho de casa eu não conseguia esquecer o assunto e tentava entender o que ocorrera. Preferi acreditar que eu realmente sonhara. Ao chegar, meus familiares indagaram-me sobre o cheiro do perfume que estava entranhado na minha camisa, justamente do lado que aquela mulher estranha estava sentada. Contei o ocorrido e todos ficaram também sem entender nada. Após tomar um banho relaxante e comer alguma coisa, finalmente pude descansar. Peguei no sono ainda tentando entender aquela estranha aventura. 

* Este texto está no livro "Ponto de Vista" a ser lançado brevemente com artigos, contos e crônicas. É proibido a reprodução parcial ou total. Visite o meu site: www.prosaeverso.net

Valdir Barreto Ramos
Enviado por Valdir Barreto Ramos em 24/07/2007
Reeditado em 20/06/2009
Código do texto: T578099
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