LIVROS E TIROS (Capítulo quinto)

Passaram-se algumas semanas em que se seguiram os roubos de livros. Mas o fator decisivo para a narrativa se deter em algum ponto e não somente um ponto aleatório no calendário da história, foi o assassinato de uma jovem poetisa da cidade. Este crime ocorrera cerca de um mês depois do primeiro. A segunda vítima foi assassinada também com uma bala na cabeça, e ao seu lado, jazia junto, igualmente ao primeiro crime, um exemplar do livro.

Dada estas "coincidências" Pedro conseguiu convencer Raul da sua tese de que a mesma pessoa ou a mesma quadrilha que roubava os livros, também era mentora dos assassinatos. Mas o que teriam aquelas vítimas de especiais? Até onde puderam investigar, não mantinham nenhuma relação entre si, exceto o fato de que ambas eram escritores e tinham seus livros roubados, mas, mesmo nisso, os gêneros eram completamente diferentes. Precisavam da ajuda de alguém, mas não de outro investigador ou policial que, no final das contas, veria as coisas de uma perspectiva muito parecida com a deles; tampouco de um criminoso que pudesse pensar como a mente do assassino, pois a mente deste, obviamente, era diferente. Precisavam de alguém que tivesse a mesma paixão do criminoso - e não falo aqui da paixão de matar, até porque quem mata com paixão geralmente faz algo macabro com suas vítimas, e não apenas enfia uma bala em suas cabeças, mas da paixão motivadora destes crimes, a literatura - para assim, então, tentar refazer seus caminhos. Precisavam de Notório. Ambos sabiam disso quando, revisando as pistas depois do expediente na delegacia - sem encontrar nada de novo - , cruzaram os olhares.

Na manhã seguinte, bem cedo, os três discutiam e bebiam café numa sala apertada da delegacia.

- Entrevistamos testemunhas e verificamos os arquivos das duas vítimas, nada nos mostra que elas tivesses algum tipo de relação. Não tinham amigos em comum, não frequentavam os mesmos lugares. Tampouco seus livros tinham algum teor parecido ou o mesmo tipo de público. O primeiro era autor de auto-ajuda; o outro um poeta - falou Pedro enquanto caminhava de um lado ao outro da sala. Raul só observava. E Notório foi quem falou:

- Ambos eram escritores medíocres. Não importa o que escreviam. Vejam, não estamos perseguindo aqui o assassino de John Lennon. Essa história é bem diferente, o assassino despreza suas vítimas.

- Como seguir? - falou calmamente Raul.

- Depois que vocês me ligaram ontem a noite, fiquei pensando. Primeiro um autor de auto ajuda, depois uma poeta. Acho que poderíamos correr o risco e descartar que ele vá repetir estes crimes com os mesmos tipos de autores. Aparentemente ele que mostrar algo, e para a sua obra estar completa, ele tem que abranger todo tipo de literatura. Porém, resta muita coisa. Seria muito difícil seguir seus passos para saber qual serão suas próximas leituras. Contos de terror? Romances policiais? Não há como saber, nem ao menos sabemos como ele faz essa divisão na cabeça dele, de tal forma que poderia até mesmo considerar diferentes formas de poesia, e aí o risco do qual falei antes, seria muito grande.

Pedro e Raul não falaram nada. Estavam tentando adivinhar onde Notório queria chegar, e ele continuou.

- Precisamos chamar a sua atenção. Moldar o seu caminho. Ele sabe que será investigado, mas não espera uma provocação. Vamos atacar a sua vaidade. Senhores - falou Notório se levantando e batendo no peito - precisamos de uma isca.

Não sem alguma insistência, Notório convenceu Raul - Já que Pedro já tinha sido convencido desde que Notório falara a palavra isca - do seu plano, que consistia em ele próprio - Notório - escrever um livro. Não necessariamente um livro ruim do ponto de vista do assassino, pois pelo pouco que o conheciam, isso seria muito subjetivo. Dado isso, esse livro teria que instigar e provocar o criminoso, não somente pelo seu conteúdo, mas também, e principalmente pelo marketing.

Lucas Esteves
Enviado por Lucas Esteves em 26/09/2014
Código do texto: T4977029
Classificação de conteúdo: seguro