Eliott Scoch em Crime 4 itens

Thomas Hens apertou a campainha da casa de Eliott. Estava eufórico demais. Ao entrar, pareceu um furacão. Carregava consigo uma notícia surpreendente. Reuniu-se com Eliott na sala e somente ao sentar-se, recuperar o ar perdido, foi que desabafou. Na verdade a notícia estava estampada em todos os jornais. Eliott quem acordara tarde demais e ainda não teve tempo de abrir para dar uma olhadela, até por que não era um dos hobbies prediletos dele ler os jornais da manhã.

- Eu não acredito! Alfred Milikan está morto?

- Exato. E você viu a entrevista que ele deu na semana passada? O cara era o mais rico, um velho milionário...

- Senhor Milikan, senhor Milikan. Pode os conceder uma entrevista? O que o senhor pensa de ser considerado um dos homens mais ricos do mundo?

Alfred tinha um quê de convencimento. Era corajoso, enxuto barba bem aparada, terno feito sob medido pelo melhor alfaiate da cidade e não tinha medo de fazer as suas pronúncias em rede mundial.

- O que eu acho? Bem... – deu uma risadinha de canto - Eu acho a melhor coisa do mundo, assim todos podem me conhecer e conhecer a minha grande fortuna.

- Algo em especial senhor Milikan?

- São tantas as minhas fortunas, porém, há apenas uma que tenho o maior cuidado e que é muito valiosa. A mais valiosa de todas as minhas fortunas. Possivelmente, deve fazer parte da minha herança. É uma estátua de ouro de um elefante indiano... Vale milhões e milhões de dólares... Quem a ter em mãos pode-se considerar milionário...

Assim que a lembrança veio à tona, veio consigo também a hipótese. Alfred Milikan morto por causa de uma estátua de ouro de um elefante indiano.

- Você acha isso? – indagou Hens ao amigo.

- Não devo ter certeza, mas, não há outra razão para o ricaço ter sido morto. Se ela valia milhões, alguém desejaria ter se apropriado dela.

- A troco de quê?

- Oras! A troco de ser um novo Alfred Milikan. Ocupar o seu lugar. – Eliott deu alguns passos até a janela. – Temos que penetrar no caráter desse Alfred Milikan e saber se ele era uma pessoa de boa ou má índole. E acima de tudo, conhecer cada integrante da sua família, pois todos são suspeitos.

I

A mansão de Alfred Milikan era localizada em um lugar remoto da cidade grande. Ele gostava de paz. No entorno havia algumas casas. Os vizinhos às vezes eram perturbadores, entretanto, apenas um tinha quatro olhos. Dois olhos comuns e outros dois olhos que conseguiam se aproximar do que estava longe.

Em uma das casas existia um vizinho que observava tudo ao longe por meio de um binóculo. Era o seu companheiro. Mas, ele não perdia o seu tempo vendo a vida das outras pessoas. Espiava o que era remédio para os seus olhos. As copas das árvores da floresta, os pássaros, os mamíferos ao longe. Porém, sempre que havia alguma movimentação curiosa na mansão Milikan, é claro que ele não perdia a oportunidade de fisgar os acontecimentos.

Nesse momento ele viu um carro parar em frente à mansão e dois homens se aproximando da porta.

- O que será que ta havendo lá? Milikan, Milikan, Milikan... Sobrenome popular, mas sujo. Será que descobriram que o velho bateu as botas?

Quando apertaram a campainha da casa, na porta havia uma aldrava com o formato de uma serpente. Seria necessária ali? Afinal, tinham uma campainha muito mais moderna. Eliott esperou ser recebido por um mordomo carrancudo e sisudo, mas vislumbrou a imagem de uma mulher em um vestido preto de seda, com olheiras profundas nos olhos e lábios contornados por um batom vermelho.

- Bom dia. A senhora se chama? – indagou Eliott.

- Mary. Mary Milikan.

- Deve ser a esposa do senhor Alfred?

. Mary olhou para os dois rapazes e de repente entrou em prantos desesperadores. Perder o marido foi uma, ou melhor, está sendo uma dor lancinante.

- Fique calma senhora Mary... Nós estamos aqui...

- O que está havendo?

Surgiu a imagem de um homem alto e com o semblante franzido. Era um jovem branco, de olhos verdes, vestido por um blazer escuro e calça social. Parecia estar exasperado, ou melhor, muito exasperado.

- Somos detetives.

- Detetives? E quem os mandou aqui? Não precisamos do trabalho de vocês.

- Senhor – Eliott acentuou a voz, uma voz de autoridade. – Somos da polícia e viemos investigar a morte do senhor Alfred Milikan. O senhor deve ser o filho dele.

O rapaz ficou alguns instantes observando os dois homens parados a sua frente. Aquietou-se quando confrontado.

- Sim. Sou o filho dele. Roders Milikan. Desculpe a minha atitude, mas eu não quero que façam mal a minha mãe. Entrem.

A casa era suntuosa e requintada. Objetos valiosos espalhados por toda parte. Um grande número de quadros nas paredes de famosos artistas como Mondrian e Max Ernest. Acomodaram-se nas poltronas de couro com detalhes em ouro e as perguntas foram feitas.

- Alfred estava na biblioteca. – iniciou Mary. – Havia ocorrido uma explosão no interruptor da casa, alguma sobrecarga de energia e tivemos que ficar a base de luz de velas. Alfred, como eu tinha dito, estava na biblioteca. Quando eu descobri o corpo dele na lavanderia esta manhã, fiquei me perguntando o que o atraiu para a cozinha. O quê? O quê? Senhor Scoch.

E Mary desatou a chorar. Roders abraçou-a com força.

- Fique tranqüila mãe. Nós vamos encontrar esse assassino cretino. Calma, calma. – e dizia serenamente.

Eliott e Hens trocaram olhares inquiridores.

- É para isso que estamos aqui senhora Milikan. – disse Eliott triunfante.

II

Agora o nosso detetive e seu amigo Hens encontravam-se na biblioteca. O último lugar que Alfred Milikan habitou naquela noite muito mais escura que o próprio período, pois não havia luz na redondeza tranqüila. O sonho que Eliott mais almejava desde o momento em que entrara na mansão. Estar ali naquela imensa e suntuosa biblioteca era uma oportunidade grandiosa. Mas, era apenas para observar e não tocar.

Olhou as decorações, o papel de parede em uma cor bege, estantes empilhadas de livros, todos eles separados por gêneros e autores. Havia quadros nas paredes. Depois observou a mesa do senhor Milikan. Mesa de madeira maciça envernizada e brilhante. Agora caro leitor, preste atenção!

Eliott caminhou até a mesa e analisou o que continha sobre ela. Alguns objetos. Um cinzeiro. Uma taça de vinho vazia. Dois frascos. Três livros empilhados. Uma chave. E próxima a cadeira, uma vela.

- Era aqui que ele vivia. Era o paraíso dele. – disse Mary. – Nunca abandonava esse lugar. Alfred adorava ficar preso aqui lendo os seus livros. E um que ele jamais abandonava era Do outro lado da meia-noite de Sidney Sheldon.

Na sala entrou mais uma pessoa. Era um homem de cabelos negros, barba, cavanhaque e costeletas bem aparadas. Era alto e vestia um terno acinzentado slim.

- Olá inspetor.

Eliott acenou.

- Que bom que o senhor veio. Foi um choque para todos nós.

- Este é o John senhor Scoch. Nosso enteado. – apresentou Mary.

- Muito prazer senhor John. – eles se cumprimentaram.

- Fiquei sabendo agora cedo que ele havia sido encontrado morto. Mas, quem o encontrou?

- A senhora Mary. – disse Hens. – Disse que o corpo estava caído na lavanderia.

- Eu não tenho envolvimento algum na morte do meu marido inspetores.

- Por que está dizendo isso? – indagou Eliott.

- Não sei. Bem... Antes que me acusem de algo.

- Onde estava quando o crime ocorreu?

- Dormindo. Tive uma enxaqueca severa. Aproveitei que estava escuro para dormir.

Thomas Hens olhou para Eliott com aquele olhar de desconfiança. “Um álibi.”, pensou ele.

- Tudo bem. Então... Aquela janela costuma ficar aberta? – Eliott indicou. A janela ficava próxima a mesa da biblioteca. Duas cortinas brancas balançavam calmamente. Mais ou menos um metro, um metro e meio de distância da mesa.

- Não sei. Eu não costumo reparar nisso.

- Já pensou na hipótese de alguém ter entrado aqui, acertado o seu marido e levado o corpo para a lavanderia?

Roders Milikan foi quem se pronunciou desta vez.

- Para quê? O assassino poderia tê-lo matado e ido embora. Para quê ter tanto trabalho. Ah! – recordou Roders. – Se me permite senhor inspetor refrescar a sua memória... O senhor sabe que o meu pai tinha um elefante de indiano banhado a ouro não sabia? Ele o citou em uma entrevista.

- Sim, claro.

- Pois bem... Ele desapareceu.

- Como?

- É. O elefantinho sumiu. Aposto que o assassino o roubou.

- É algo relevante senhor Roders. Um objeto tão valioso gera a cobiça nos outros. Mas... O senhor não acha que... Ele pode estar com um de vocês?

Eles ficaram estupefatos. Roders deu uma risada jocosa.

- Eu não roubei nada. Se quiser pode revistar minhas coisas. Eu não dava a mínima para aquele elefante idiota. Temos vizinhos aqui sabia? A janela aberta, escuro, um dos vizinhos entra e mata o meu pai para ficar com a fortuna. Acredito nesta idéia.

- Bem... Você tem a sua visão, mas, precisamos investigar mais afundo. Senhora Milikan? Pode nos levar até o quarto do seu marido?

III

Eliott teve acesso ao quarto, mas pediu para Mary Milikan deixá-los a sós. Thomas Hens andava ao redor à procura de algo. Eliott fazia o mesmo. Avistou uma chave atrás de um abajur sobre uma estante de fotografias. Hens observava a penteadeira valiosa, com puxadores de ouro. Eliott caminhou até o criado mudo e abriu a primeira gaveta. Havia dentro uma lanterna e dois anéis de rubi. Abriu à segunda. Vazia. Ao puxar a terceira não conseguiu.

- O que houve? – indagou Hens se aproximando.

- Está trancada.

Eliott olhou ao redor e havia encontrado um jeito de abri-la. Atrás do abajur estava a chave. Ele a alcançou e colocou-as na fechadura. Ao abrir encontrou um livro de capa de couro, com o nome do senhor Milikan bordado em ouro.

- Um livro? O que será que temos aqui?

Ele o abriu. Não demorou muito para compreender que os arquivos contidos ali eram de suma importância para o andamento da investigação. Eram cartas fora do envelope pregadas com um clipe na folha. E o deixou surpreso.

- Não! O senhor Milikan teve um caso com... Com a criada!

- O quê?

- Olhe o que está escrito. – entregou o livro a Thomas.

- “Você não pode ser indiscreta. Eu sei que quando me olhas sente-se atraída. Mas eu tenho uma esposa com quem sou casado há anos. Mas... Eu posso fazê-la feliz assim mesmo. Nada vai nos impedir de estarmos juntos.”.

“A Mary descobriu o nosso romance. Sei que agora estou perdido, mas me perco ainda mais de amor por você.”.

“Ela não merece você Alfred. Não se importe com isso. Eu serei sua. Para sempre.”.

- Eles conversavam por cartas. Uma maneira de fazer menos alardes. – disse Eliott. – E você viu que a Mary descobriu tudo? Ela provavelmente encontrou este livro. Ela é suspeita. Sabia da traição. É um motivo.

- Mas... Qual o papel do elefante de ouro nessa história se o crime for passional? – indagou Hens.

- Ótima pergunta Hens – Eliott ficou pensativo. – Eu não faço idéia. – e suspirou decepcionado.

Hens folheou algumas páginas do livro e encontrou outra pista, ou melhor, outra carta. Leu:

- “Você mentiu pra mim Alfred. Sua esposa sempre te amou e você nunca negou isso. Seu cretino! Você nunca me amou. Te odeio!”.

- Talvez ela tenha descoberto a aproximação dos dois. Mas, com certeza Mary Milikan foi oportunista. Esperou para depois atacar. – sugeriu Eliott. – E sabe o que passou em minha cabeça agora?

- O quê?

- Um assassino precisa ser cauteloso. Mary mata o seu marido, pega o elefante e esconde em algum lugar da mansão. Possivelmente nos pertences de alguém para disfarçar o seu crime.

- Sim. É uma boa sugestão.

- Tudo bem. Coloque este livro de volta no lugar. Vamos fazer uma pausa.

IV

Eliott e Hens estavam no carro deitados no banco inclinado para trás. Tiravam um cochilo.

Um homem ao longe, barbudo e atarracado, se aproximava.

Os rapazes dormiam ao som de David Bowie. A música que tocava era In The Heat Of The Morning. Era um som que lembrava muito um vilarejo calmo, sereno, silencioso. Tinha todos os ingredientes para trazer essa sensação.

E aquele senhor que estava o longe, agora exibia o seu rosto no vidro do carro. Os olhos de Eliott abriram lentamente, mas o susto foi abrupto que acordou Hens.

- O que houve?

Eles olharam para a imagem do velho. Ele sorria efusivo. Acenou para eles. Eliott abriu a janela do carro.

- Olá.

- Estavam tirando uma sonequinha hein?

- É... Estávamos... – Eliott bocejou. – O que o senhor deseja? – ele diminuiu o volume da música.

- Tenho algo a dizer a vocês.

- Senhor, nós estamos descansando e...

- É sobre o velho Milikan.

Os dois voltaram os olhares para o velho barbudo, despertando interesse na sua insinuação.

- Sobre ele? O que sabe?

- Eu não sei de nada. Apenas vi.

- Viu o quê?

- Se vocês quiserem ir até o meu casebre – ele riu. – Eu contarei tudo.

V

- Naquela noite – iniciou o velho. – estava tudo escuro por aqui. Não havia ninguém nas ruas. E eu costumo sempre observar o fim da tarde e a natureza com os meus binóculos. Observo tudo dali, da minha janela. E naquela noite, por coincidência, eu observava ao redor quando os meus binóculos avistaram a mulher do velho Milikan deixando a casa em plena escuridão.

- Mary Milikan?

- Sim. – disse o velho. – Ela saiu. Vestia um casaco longo e um chapéu.

- Lembra Eliott que ela havia dito que no momento do crime estava no quarto com enxaqueca? – recordou Thomas.

- Sim. Ela tem um álibi.

- Eu pensei exatamente nisso. E agora tudo se confirma, pois ela descobriu que o marido teve um caso com a criada.

O velho inclinou-se para frente, estupefato. Por um momento ele quase não desmaiou. Ficou extremamente surpreso.

- O Alfred Milikan teve um caso com a criada? Meu Deus! Meu Deus! Não! É mesmo verdade?

- Sim.

- Que velho safado! – ele soltou uma gargalhada rouca e jocosa.

- O senhor sabe do elefante indiano de ouro do senhor Milikan, senhor Madeval? Ele sumiu.

- Ah! Claro! Ele o citou em uma entrevista. Valia milhões. E o desaparecimento dele parece ser óbvio. Todos do vilarejo possivelmente devem ter visto a entrevista. Alguém daqui poderia tê-lo roubado. Muita cobiça e vontade de ter a fortuna dele nas mãos.

- A janela da biblioteca estava aberta senhor Madeval. Cogitamos a hipótese de o assassino ter entrado por ela, matado o senhor Milikan e roubado o elefante.

- Sim, é bem provável.

Eliott e Hens fixaram os seus olhos na imagem do velho barbudo à frente. Ele era muito suspeito.

- O que foi? Estão achando que eu roubei?

- Não dissemos nada. – disse Eliott. – Mas eu creio que ainda precisamos caminhar com as investigações. Se o senhor viu a esposa do senhor Milikan deixar a casa na noite do crime, tudo indica que ela pode estar envolvida no crime, mas não temos provas contra ela. Apenas um álibi.

- Eu só acho que vocês deveriam interrogar a criada. Ela está metida em uma encrenca que só vendo.

Os dois se entreolharam.

VI

A criada se chamava Bethânia. Era uma mulher com face de uma menina jovial. Estava vestida naquele uniforme comumente de empregada e usava uns óculos redondos antigos. Não sentiu-se confrontada por estar sendo interrogada.

- Nós tivemos um caso. – disse. - E na época Alfred escondeu da mulher dele. Ele me prometeu que se separaria dela para ficar comigo. Mas mentiu. E isso me deixou possessa senhor inspetor.

- Possessa a ponto de matá-lo?

- Sim. A ponto de acertá-lo com um Grifo.

Eliott inclinou-se diante da criada, olhando-a nos olhos. Encarado-a profundamente.

- É mesmo senhorita Bethânia? O que mais? Vamos. Pode desabafar.

- Nós nos comunicávamos por cartas. E eu enviei uma a ele dizendo que o odiava. Depois, resolvi encontrar outro rapaz e nós discutimos.

- Discutiram?

- Sim. Eu saí para ir ao mercado e ele foi atrás de mim. Alfred falou que não queria me ver com mais ninguém se não fosse ele. Esbofeteei o rosto dele e voltei pra mansão. O meu namorado, na época, pois, depois de tudo nós acabamos por nos separar, disse que seria capaz de fazer qualquer coisa para acabar com o Alfred. Eu disse a ele que... Eu mesma faria algo para acabar com ele.

- E você fez?

- Não.

É claro que ela diria não. Os criminosos possuem essa tática de tentar desviar a culpa. Como eles não tinham provas contra Bethânia, apenas relatos, não adiantaria encerrar o caso.

Depois que interrogaram a criada, Eliott e Hens direcionaram-se até o verdadeiro local do crime. A cozinha. Observaram a lavanderia, onde o corpo fora encontrado e todos os pequenos detalhes que ali estavam. E tiveram uma grande surpresa. Um dos objetos usados para matar o velho Milikan estava escondido dentro da máquina de lavar, embrulhado em um lençol inundado de sangue. Agora eles tinham a prova contra Bethânia. Eles encontraram a arma do crime. O grifo.

VII

- Acha que eles vão descobrir logo?

Mary Milikan e o seu filho Roders Milikan observavam da janela os detetives ao longe. O ambiente estava carregado de suspeitas e mistério.

- Se trabalharem de verdade...

- Dois patifes. Eles não precisavam se intrometer na nossa família. Poderíamos ter disfarçado a morte do seu pai.

Mary sentou-se na poltrona enquanto Roders permaneceu na janela, absorto. Ela acendeu um cigarro.

- Poderíamos ter dito que ele sofreu de um mal estar e desmaiou batendo a cabeça em algo na cozinha. Você é inteligente Roders, saberia planejar.

- Eu sei mãe. Você não acha que eu não estava interessando naquele elefante indiano? Mas é claro que estava. Valia milhões. Poderíamos ir embora daqui. Mas eu sabia como o velho Alfred era. – disse com amargura. – Um avarento tremendo.

- Não fale assim do seu pai. Ele era mesmo um... Desgraçado!

E jogou a fumaça do cigarro para fora.

Os passos vagos de Eliott pisavam no solo lentamente. Ele estava demasiado meditativo. Pensava em tudo. Nos objetos já encontrados, no elefante de ouro, na janela da biblioteca. Por falar nela, ainda estava aberta. Ele olhou ao longe para dentro da biblioteca. Caminhou mais rápido e notou que abaixo da janela havia um canteiro de pequenos arbustos. Parou e olhou para dentro da sala. Antes de virar, algo chamou imediatamente a sua atenção. Seus olhos eram muito argutos, uma característica que ajudava. Um camaleão quando camuflado não chama a atenção do seu predador e sim da sua presa. Mas, naquele momento não se tratava de um camaleão e sim de um objeto. Na verdade, mais um objeto. Era estranho. Muito diferente de todas as pistas que Eliott já encontrara. Suas mãos apanharam o objeto estranho com delicadeza.

- E então? Encontrou alguma pista? – indagou Hens se aproximando. – O que é isso?

Eliott segurava, com o cenho franzido, um objeto muito peculiar para ser usado em um crime. Um mata-moscas de borracha.

- Um mata-moscas.

- E por quê isso?

- Espere! – Eliott virou a parte debaixo do objeto. – Parece que foi queimado. Olha. E por que o cabo dele é tão longo assim?

A parte emborrachada continha uma marca de queimadura. Eliott voltou o seu olhar para a janela. Sua mente clareou como um raio quando ilumina o céu. Finalmente ele havia compreendido a função daquele item. Caminhou e olhou para dentro da biblioteca, mais precisamente para a mesa.

...Eliott caminhou até a mesa e analisou o que continha sobre ela. Alguns objetos. Um cinzeiro. Uma taça de vinho vazia. Dois frascos. Três livros empilhados. Uma chave. E próxima a cadeira, uma vela.

- É isso!

- O que foi? – indagou Hens tentando se situar.

- O mata-moscas foi usado para apagar a vela.

- Como assim?

- Por isso ele tem o cabo alongado, para que o assassino alcançasse a vela sobre a mesa sem ser notado por Alfred que poderia estar entretido com algo. – ficou pensativo. – Sim, claro...

...- Era aqui que ele vivia. Era o paraíso dele. – disse Mary. – Nunca abandonava esse lugar. Alfred adorava ficar preso aqui lendo os seus livros. E um que ele jamais abandonava era Do outro lado da meia-noite de Sidney Sheldon.

- Ele estava lendo o seu livro.

- E por que a vela foi apagada?

- Simples. – disse Eliott. – Para levá-lo até a cena do crime. Como aquela noite na casa não havia luz e a única fonte de iluminação na biblioteca era a vela, o assassino apagando-a faria com que o senhor Alfred, que, por pura ironia, lia o seu livro e conseqüentemente precisava da luz que a vela incidia, deixasse a biblioteca para apanhar outra vela e assim...

Eliott parou, estupefato.

- Assim alguém o estava esperando na cozinha.

- Espere! Você está dizendo que duas pessoas cometeram o crime?

- Não Hens, foi uma única pessoa. A outra apenas ajudou o criminoso a levar o senhor Alfred ao seu encontro. Como um peixe levado até a isca. E ele só poderia fazer isso apagando a vela, pois, Alfred teria de buscar outra, provavelmente na cozinha e foi lá que aconteceu o fato.

- Mas, quem? Quem fez isso?

- Eu ainda não faço idéia Hens... Se pelo menos...

E para o espanto dos pássaros, vizinhos do vilarejo, e os dois detetives pensativos naquele momento, um grito cavernoso e desesperador veio da mansão. Eliott e Hens saíram correndo às pressas e antes de abrirem a porta, esbarraram com Mary Milikan aos prantos.

- O que houve?

- Meu Deus! Meu Deus! O Roders... O Roders!

- O que aconteceu com ele?

- Ele está... Meu filho está morto!

VIII

Quando chegaram ao corredor, Roders Milikan estava caído no chão numa poça de sangue. Tinha levado um golpe na cabeça que o matou na hora. John August apareceu correndo, suplicando pela vida de Roders. Deitou-se junto ao cadáver.

- Roders! Por favor... Roders! Quem fez isso com ele? Alguém pode me dizer quem fez isso com o meu irmão?

Bethânia Monford subia as escadas e caminhou em direção aos demais. Eliott ao vê-la sentiu que tudo fluía em sua direção. Ela parecia um fantasma naquele momento. Estava pálida e o uniforme de empregada não favorecia a sua aparência que estava fantasmagórica. Lentamente ela parou diante do cadáver. Olhou para John August que chorava de maneira desesperadora.

- Vocês precisam pegar esse assassino! Ele continuará nos fazendo mal como fez ao meu pai.

Bethânia abaixou-se diante do corpo de Roders.

- Roders! Fale comigo meu irmão. Não nos deixe tão cedo assim.

Bethânia, da maneira mais serena do mundo, colocou a sua mão debaixo do corpo de Roders.

- Ele não teve culpa de nada. – disse John August. – Ele era inocente. Inocente. Não merecia morrer assim!

Bethânia, ao retirar sua mão debaixo do cadáver, deixou transparecer o que todos jamais imaginariam ver naquele momento. Estava manchado de sangue. O objeto que acertou a cabeça de Roders. O objeto mais valioso do falecido Milikan. O Elefante indiano de ouro.

- Oh Céus!

- O elefante de ouro! – disse Hens, surpreso. – Você está presa Bethânia Monford pelo assassinato de Roders Milikan e quem sabe do seu amante Alfred Milikan.

- Espere Hens. – interrompeu Eliott. – Deixe-a contar toda a verdade. Ela sabe de tudo. Conte-nos Bethânia.

E Eliott sorriu.

IX

Bethânia ainda segurava o elefante ensangüentado nas mãos. Mãos trêmulas.

- Eu vou contar a verdade. Vou contar o que fiz. Eu, naquela noite, usei o mata-moscas para apagar a vela da biblioteca. Assim, Alfred teria de acender outra, já que estava lendo e precisava de luz. Ele foi até a cozinha e com o auxílio do grifo...

Ela silenciou-se por alguns segundos. Colocou o elefante ao lado do corpo de Roders.

-... John August Sanches o acertou na cabeça com tamanha violência que eu consegui escutar do lado de fora. John estava lá na cozinha à espera de Alfred. Depois de matá-lo, arrastou o corpo para a lavanderia.

John August Sanches ergueu a cabeça lentamente. Jogou o corpo de Roders contra o chão e tinha o semblante como de um lobo em fúria.

- Sua cretina!

- John escondeu o grifo dentro da máquina. Ainda naquela noite nos encontramos e ele me mostrou o elefante de ouro. Disse que o venderia e que me levaria para longe, desta vez seríamos felizes. Que não seria como da última vez. Deixei a mansão minutos depois. Queria sair para respirar um pouco de ar e esquecer tudo.

- Isso me lembrou o relato de um dos vizinhos da redondeza. O senhor Madeval. Ele disse que observava com o binóculo a mansão e viu uma mulher sair da mesma. Segundo ele, o que os seus olhos viram e que o enganou inteiramente foi à senhora Mary Milikan, mas na verdade era a senhorita, senhorita Bethânia. E também a última vez faz alusão ao seu comentário, não é mesmo? – indagou Eliott.

...O meu namorado, na época, pois, depois de tudo nós acabamos por nos separar, disse que seria capaz de fazer qualquer coisa para acabar com o Alfred.

- Você namorava então o John, não é mesmo?

- Sim. John disse que se vingaria de Alfred e de todo o sofrimento que ele me causara. Ele me convenceu a participar do plano dele. Conseguindo o valioso elefante, ele ficaria com a fortuna e fugiríamos daqui.

Eliott virou-se para John August Sanches que estava vermelho de fúria como a lava de um vulcão.

- E... Senhor John August... Por que matou Roders Milikan? Por que ele o viu, não é mesmo?

- Ele me viu com o elefante de ouro nas mãos senhor inspetor. Eu o esconderia nos pertences de Roders e faria a minha cena de acusação, simplesmente dizendo que ele foi o ladrãozinho da fortuna do papai. Mas, ele apareceu no exato momento e com certeza falaria para todos. A única solução era eliminá-lo.

- E a senhora, senhora Mary Milikan, o que fez quando descobriu que o seu marido teve um caso com a senhorita Bethânia?

Mary com os olhos inchados, com a pele do rosto mal cuidada ultimamente e com o olhar melancólico, disse em um tom sombrio e sofredor.

- Eu não pude fazer nada. A não ser ver e sentir o meu coração sangrar infinitamente.

X

Acelerando na estrada de terra que havia antes de chegarem à cidade, Hens e Eliott cantavam, juntamente com o rádio do carro, At Last de Etta James. Era uma das canções favoritas de Eliott e pouco de Hens, mas como a empolgação era contagiante, cantar fazia todo o mal se espantar.

Quando finalmente chegaram a casa, não pensaram duas vezes senão deitar e esticar os corpos no sofá.

- Será que mais um caso desce hoje? – indagou Hens.

- Por mim, se aparecesse eu não questionaria.

- Apenas digo que o caso do Milikan deve ficar registrado como um dos casos mais interessantes. – Thomas serviu uma taça de conhaque para ele e o seu amigo.

- No início eu achei que o elefante era o centro de tudo. Pobre estátua valiosa de ouro. Mas, no fim, o motivo era como sempre o amor...

- Amor... Uma catástrofe.

Hens sentou-se ao lado do amigo e degustou do seu conhaque.

- Uma grande catástrofe.

- E as catástrofes pegam as pessoas de surpresa. – disse Eliott.

Hens olhou para ele.

- E o amor também.

Seria uma catástrofe, que chega de surpresa assim como o amor, Hens e Eliott se beijarem? Talvez, não. Mas, foi o que eles fizeram.

FIM

Rogério Varanis
Enviado por Rogério Varanis em 11/11/2014
Código do texto: T5031139
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