PIZZAS E ASSASSINOS
Ele olhava pela janela do seu apartamento no décimo quinto andar. Via o movimento das pessoas nas ruas. Todas elas andando de um lado para o outro, algumas num passo acelerado, nervosas e apressadas, outras em um passo lento e despreocupado. De cima, à distância, sob o silêncio, pareciam formiguinhas; cada uma delas uma possível vítima ideal. Ele riu prazerosamente. A sua vontade era dar um fim a cada uma delas. E sua disposição era de fazê-lo metódica e paulatinamente. Por isso mudava constantemente de endereço, de identidade e de hábitos; tudo para cumprir sua missão pessoal, sua busca pelo desejo infindável do prazer de ter a vida dos outros em suas mãos e não ter misericórdia.
A campainha tocou. Era o entregador que trazia a pizza que pedira.
Aquele seria, na sua lista pessoal, o quinto entregador de pizza que ele liquidaria, dali a poucos minutos. Eram vítimas fáceis de se pôr fim. Vinham para o seu covil, sua armadilha. Não tinham como se defender. Pobres seres indefesos.
Foi o entregador de pizza, e sua espera, que o fizeram espiar pela janela e contemplar o mundo externo e se regozijar na espera de uma vítima que estava para chegar.
A campainha tocou mais uma vez. E ele esperaria pelo terceiro toque; adiaria o máximo que pudesse aquele prazer que antecedia a execução da próxima vítima.
Do lado de fora do apartamento, o homem, após tocar pela segunda vez a campainha, ajeitou a pizza que carregava na mão esquerda e suspirou. Lembrou de minutos antes, quando parara sua moto na entrada do prédio e, por alguns segundos, dera uma boa olhada nas pessoas que perambulavam pelas ruas. Gente apressada, preocupada; outra gente tranquila, sorrindo, indo para algum lugar para se divertir. O homem riu para si, como se apenas ele conhecesse algo que aos outros fosse imperscrutável. Pegou a pizza no baú da sua moto e se lembrou de todas as vezes anteriores que fizera o mesmo ritual, e no que esse ritual sempre acabava resultando. Riu mais abertamente dessa vez; esperou mais alguns segundos e só depois tocou o interfone.
Já na porta do apartamento, antes de apertar a campainha pela terceira vez, o homem mexeu a cabeça de um lado para o outro, como um atleta que se prepara para alguma ação física; ajeitou mais uma vez a pizza em sua mão. E suspirou mais uma vez. Aquele momento era, talvez, o de maior prazer; o da espera pela porta que se abriria e revelaria sua próxima vítima. O homem a quem entregaria aquela pizza seria o quinto em sua lista pessoal. Ele mudava de nome, de endereço e de cidade, mas o entregador de pizza ainda era o personagem que julgava mais adequado interpretar para praticar aquilo que considerava uma missão pessoal, sua busca pelo desejo infindável do prazer de ter a vida dos outros em suas mãos e não ter misericórdia.
O homem sabia que o morador que aguardava sua pizza não teria a menor chance; eram as vítimas mais fáceis de pôr fim. Eram como cordeiros convidando lobos para o seu habitat. Pobres seres indefesos.
O homem do lado de dentro do apartamento arqueou os ombros e cerrou os punhos esperando pelo terceiro toque da campainha. Estava pronto para agir.
Do lado de fora do apartamento, o homem suspirou pela terceira vez, sacolejou e esticou os dedos da mão direita. Estava pronto para agir. E tocou a campainha.
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