O último sequestro - Episódio 2 - Negociação
Quatro lances de escada de cimento cru, apartamento duzentos e alguma coisa, ainda não havia uma referencia ali. Entrei empurrando a folha de madeira com o pé esquerdo. Rashid estava inquieto encostado numa parede a minha frente olhando desconfiado para todos os lados. Parecia meio demente, mordendo levemente e língua e as vezes a raspava no lábio superior. Quando conseguiu me fitar, disse-me:
- Bem devagar doutor. Deixe as garrafas de água e o colete ai no chão, depois se afaste com as mãos para cima.
Rashid fez uma pausa enquanto eu me afastava, em seguida questionou:
– Diga-me uma coisa doutor! O que tem nessas garrafas?
- Água Rashid. Apenas água. Não há tranquilizantes se é o que quer saber. Agora será que já posso abaixar as mãos? Como vê, não estou armado.
- Dê uma girada doutor e levante os joelhos para que eu veja suas meias. Sem truques e bem devagar.
Girei-me novamente trezentos e sessenta graus diante de Rashid e fiz com os joelhos conforme me pediu. Em seguida, Rashid empurrou a médica até os objetos que estavam ali no chão, pressionando seu ombro para que os pegasse. Foi estranho, pois antes que a doutora se curvasse para pegar os objetos, seus olhos pareciam me pedir desesperadamente para que a resgatasse. Senti-me fragilizado por não poder ajuda-la, mesmo estando ali, tão próximo.
Com o colete bem ajustado e metade da garrafa vazia, Rashid parecia bem mais calmo. Começamos a conversar sobre os seus interesses. Primeiro ele disse que não queria voltar para a cadeia novamente, em seguida reclamou seu carro blindado, só que desistiu dele minutos depois pedindo agora para ser resgatado pelo helicóptero da policia, o mesmo que naquele momento protegia o espaço aéreo – o efeito de drogas era visível e pela instabilidade de pensamentos tratava-se de algo como cocaína ou, crack talvez.
Me surpreendi ao ver que Rashid chorava, quase como uma criança quando toquei no assunto de família. Naquele momento eu encontrava seu ponto franco. – pensei e por isso resolvi trabalhar nessa linha.
***
Sentando e levantando, depois de quase duas longas horas minha boca já estava seca e eu já não tinha argumentos para convencer Rashid a desistir de sua loucura. Na verdade eu já não sabia mais o que lhe dizer. Contudo, a noite só termina quando os primeiros raios de sol apontam no horizonte. Lancei sobre a mesa minhas ultimas fichas psicológicas. Funcionou? Parece. As lembranças da mãe vieram à tona como chuvas torrenciais. Rashid então fazia a sua escolha. Ainda segurando a médica pelo pescoço e com aquela arma apontada para o seu rosto, o jovem Árabe nem sequer titubeou.
O ruído que seguiu só fora menos impactante do que aquilo que veio depois. Nada parecia real! Era difícil de acreditar...
(em breve o terceiro episódio)
Sidelcy Ribeiro