EDGAR SOLENE | O caso Amanda Rosa | capítulo 2

Eu deixei aquele prédio tão empolgado que tudo o que eu queria era me jogar nos braços de Jacke e esquecer da vida por pelo menos uma hora. Somente uma mulher como minha Jaqueline possuí essa capacidade. Fazer com que um homem esqueça que existe vida depois dela não é para qualquer uma. Dentro do carro, voltando para o departamento fiquei a pensar em tudo o que havia acontecido naquele quarto rosa. Como eu soube que na boca da vítima morta haveria uma prova viva. Como? Foi sorte? Seja lá o que tenha sido, eu estava perto de resolver um assassinato brutal e restava somente Roni seguir com seu bom trabalho para que a justiça fosse feita. Virando a direita peguei uma via secundária que daria rapidamente no DP e também na rua da quitinete de Clemente. Olhei o relógio respirando aliviado por saber que daria tempo de fechar meu relatório. Decidi tomar um café com o meu bom e velho amigo.

- Clemente, sou eu. – desci do carro.

Clemente é um idoso gente fina que na juventude aprontou mil e umas travessuras. Teve cinco filhos, cada um com uma mulher diferente. Num passado bem distante Clemente foi escrivão da polícia civil, o melhor de sua época, mas precisou deixar a profissão por motivos que ele não gosta de lembrar, muito menos de falar. Hoje, doente, solitário e com uma aposentadoria de merda, ele precisa se virar como pode e contar com ajuda de terceiros – como eu por exemplo – para sobreviver.

- Vamos chegando. – disse ele arregalando os olhos por trás dos óculos de grau forte.

- Tem café ai? – apertei sua mão flácida e fria.

- Não, mas posso fazer.

A quitinete alugada nunca esteve tão suja e mal organizada. Fazer o que? A saúde de Clemente já não o permite mais fazer uma faxina, no máximo uma varrida e olhe lá.

- Está em que caso agora, detetive? – encheu a leiteira de água.

- Homicídio. – peguei o celular e lhe mostrei a foto.

- Uau! Que bundinha. – tossiu ao rir. – causa da morte?

- Mata-leão.

Água no fogo, hora de pegar o pote com o pó de café.

- Uma coisa é atirar numa pessoa. Outra coisa é mata-la aos poucos. É preciso ser muito covarde para isso. Já tem alguma pista?

Andei até a porta que dá acesso aos fundos.

- Acho que sim. Esse será rápido.

Ao ouvir isso Clemente emitiu um ruído de reprovação.

- Nunca menospreze casos como esse, meu jovem. Já vi detetives melhores do que você surtarem. Fique sempre alerta.

- Valeu pela dica.

O café ficou pronto vinte minutos depois. Fomos para sala onde ocupei uma cadeira de madeira tão antiga que parecia ter saído de um filme de época ou de um antiquário. Clemente, como sempre, sentou-se em sua poltrona de estimação. Ninguém, absolutamente ninguém está autorizado a se acomodar ali.

- Qual era a ocupação da vítima?

- Produzia conteúdos hot pela internet.

O velho não entendeu nada.

- Ela se exibia diante de uma câmera de celular e vendia esse material.

- Ah, sim, como se fosse uma stripper antigamente.

- Exatamente. – pisquei.

- É, pelo visto as coisas se modernizaram, mas os crimes seguem sendo os mesmos. Em 1978 eu acompanhei um caso muito parecido. A mulher vendia o corpo e recebia seus clientes em sua própria casa. Certa ocasião um sujeito que não estava a fim de seguir as regras da prostituta, a enforcou e sumiu com o corpo. Deu um certo trabalho, mas conseguimos localiza-lo.

- Ele disse aonde estava o corpo?

- O miserável a jogou num rio de piranhas. Só foi possível encontrar os ossos.

Terminei o meu café. Aproveitando que eu já iria para a cozinha Clemente me deu sua xícara.

- Um cliente insatisfeito? – perguntei.

- Provavelmente.

Ao voltar para sala o meu velho amigo complementou sua fala.

- E lhe digo mais; ele ainda está na cidade e por perto. Vai por mim.

- Legal. Pode deixar comigo. Gostei do café. Você se redimiu da última vez. Estava uma bosta.

- Bosta é o teu pai que lhe colocou no mundo. – riu.

Júlio Finegan
Enviado por Júlio Finegan em 14/09/2022
Código do texto: T7605414
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