O pé de eucalipto

Quando jovem, eu gostava muito de caminhar próximo a uma conhecida reserva florestal da região. Todos os dias, à tarde, eu contemplava a gigantesca presença de um maravilhoso pé de eucalipto que já havia atravessado os séculos. Seus galhos ainda eram realmente firmes, sua postura como a de um soldado em forma, seu tronco se estendia tão alto que parecia arranhar o azul do céu. Durante muitos dias, caminhei por ali, passando sempre em frente a ele, e a cada caminhada pela reserva, era difícil não parar para contemplá-lo. E assim, em um belo fim de tarde quando o sol já procurava seu refúgio, decidi sentar-se a seu lado. Entusiasmado e em posse de um bom livro, ajeitei-me entre as suas grandiosas raízes que já se manifestavam sobre o solo umedecido. Enfim, comecei minha leitura e logo me surpreendi refletindo sobre sua existência:

- Como pode, uma pequenina semente se transformar em algo assim tão gigantesco e belo?

Nesse momento comecei a sentir uma leve fragrância. O eucalipto então liberava um saudoso aroma refrescante, que logo foi invadindo minhas vias nasais, me sufocando e tomando por completo todo o meu olfato, e de certa forma, também possuindo meus sentidos. Aos poucos fui adormecendo. Era muito estranho... Parecia me dopar de alguma maneira e então me senti como se perdesse parte da minha consciência. E fui descansando levemente o peso de minhas pálpebras que não mais conseguiam se sustentar, até que apaguei por completo.

De repente, uma luz ilumina todo o ambiente, sussurros invadem o silêncio de uma maneira dominante. Aos poucos os sussurros vão se transformando em frases completas, e sem nenhuma complexidade, o saudoso aroma revela a origem das palavras. Agora já consigo entender frases completas, que relatam o medo de um futuro desmatamento. Sim, o grande pé de eucalipto está preste a ser derrubado, e assim eu comecei verdadeiramente a ouvir a sua voz, que dizia:

- É lamentável saber que não vou mais poder contemplar o brilho das estrelas, disputando sua maior reluzência.

- Não vou mais emanar minha fragrância por entre o caminho dos alegres visitantes.

Sua voz desaparecia lentamente junto com o seu saudoso aroma. Eu não tinha mais certeza do que ouvia, mas sabia que tudo aquilo fazia sentido, pois aquelas palavras eram verdadeiras e fortes o bastante, para permanecerem vivas durante muitas gerações. Então, aos poucos, fui despertando do sono que mais parecia uma alucinação, e logo sou tocado por um estranho visitante que também passara por ali naquele instante.

- Você esta bem? Ele pergunta.

- Estou sim!- Apenas parei aqui para descansar um pouquinho. - Respondo.

Levantei-me, passei as mãos sobre o rosto e ergui a cabeça contemplando o imenso pé de eucalipto, com quem eu conversara há pouco. Respirei profundamente e segui meu caminho para casa. Chegando lá, já ao anoitecer, deitei-me, lembrando por completo todos os momentos e fatos do meu confuso dia, e decidi não mais caminhar pela reserva.

Passaram-se alguns anos e, agora mais velho, voltei a caminhar em direção à antiga reserva, que para minha surpresa, não existe mais. No lugar do antigo pé de eucalipto existe agora uma pequena casa, onde mora uma humilde família. Não resisti às lembranças e parei em frente aonde existia o pé de eucalipto recordando as palavras que ainda sondavam a minha mente. Segui então minha caminhada e, chegando em casa, um velho amigo me aguardava. Sentamos juntos e tomamos um belo café, e logo lembramos velhas histórias de infância.

Quando então ele pergunta:

- E aí, por onde tem caminhado?

- Pela antiga reserva, respondo.

Foi então que ele comentou:

-A reserva não existe mais, porém existe uma história curiosa sobre a família que mora naquele local:

Ouvi dizer que lá mora uma criança de cinco anos de idade que sofre de uma grave asma. Um belo dia, sua mãe a deixou sozinha, rapidamente, enquanto fazia algumas compras em um mercadinho próximo. Logo a criança começou a brincar e correr alegremente nos fundos do quintal de sua casa, quando foi surpreendida por uma aguda crise de asma, desmaiando repentinamente. Quando sua mãe retornou, procurou a criança por toda a casa e não a encontrou. Desesperadamente correu para os fundos do quintal e então encontrou a criança caída, desmaiada e completamente pálida. Em prantos ela liga para emergência enquanto recosta a criança a um pequeno pé de eucalipto que nascia tímido no quintal da casa. Para sua surpresa e espanto, os pequeninos galhos do eucalipto começaram a encostar suavemente no rosto da criança, dispersando um singelo frescor em meio a um envolvente aroma. A criança, então, sufoca os primeiros suspiros. A mãe, nesse momento mágico, não consegue conter as lágrimas e começa também a sentir uma constante brisa e uma fragrância suave emanando da pequena árvore. Assim, seu filho foi se restaurando aos poucos, e como em um passe de mágica, ergueu-se completamente curado, e desde então nunca mais sofreu de asma.

Depois de ouvir esta história, nunca mais caminhei por lá. Logo me mudei para outra cidade onde comecei também a ouvir novas histórias...

O fato é que não devemos desprezar o que ainda não compreendemos, e tão pouco deixar de imortalizar, os grandes milagres que constituem a nossa misteriosa história de vida.

Fabiano Moreira
Enviado por Fabiano Moreira em 20/12/2008
Reeditado em 04/02/2009
Código do texto: T1345206
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