Uma mulher especial

     Deixei-a em seu canto. Nem alegre nem triste. Ainda  com a fisionomia nova. O rosto emoldurado por preocupação severa não lhe tirara a bondade que lhe era peculiar. As mãos enrugadas pelo tempo e pelo trabalho pesado não impediam que ela as colocasse em forma de prece diante do altar. Ela orava pelo filho que partira, pelos amigos que a deixaram um dia.
     Estava só, mas era o suficiente forte para desbravar qualquer multidão. Vez por outra regava o jardim para que as flores não murchassem e não fossem portadoras de tristeza daquela casa tão simples, mas tão significativa para ela. Com os cães conversava, e eles, somente eles, davam-lhe ouvidos para suas lamúrias e suas poucas alegrias.
      Seu estilo de vida era sóbrio e seu único entusiasmo era estar com o filho que partira  um dia para alcançar a felicidade de viver como pássaro a voar. Não sei se o conseguira.
     Um dia voltei... Encontrei-a na mesma casa simples, mais sorridente e alegre. Seu jardim estava florido como florida é a primavera. Seu rosto mais envelhecido pelo trabalho pesado, pela solidão que vivia no próprio lar, continuava dócil e acolhedor. Abracei-a fortemente, confessando-lhe minha saudade, minha alegria por estar ali com ela. Abençoou-me e voltou a agradar os cães que pareciam entender aquele momento tão singular para mim. Surpreendi - a, no entanto, com uma lágrima no olhar que procurava ocultar quando pelo rosto passava um lenço que lhe enxugava o suor.
     Deixei-a novamente no seu canto. O jardim mais florido, o seu semblante mais alegre e os cães latindo.
     Outro dia voltei. Não a encontrei mais naquela casa simples, nem ouvi o latido dos cães. As flores feneceram no jardim. Não a abracei; não fui abençoada. Fui embora e carreguei comigo minha saudade.
Vilma Tavares
Enviado por Vilma Tavares em 17/06/2010
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