O segredo de Zaen
O segredo de Zaen
O vento frio cortava o silêncio da floresta desnudando as árvores. Prenúncio de um rigoroso inverno. Entremeio aos galhos secos, Zaen corria mais rápido que um animal. Os pés nus, o olhar assustado e os seios descobertos. Mas de quem ela fugia?
Das chamas da morte!
Zaen não estava impune às leis da aldeia. Ela tinha o poder da visão. Era apenas um bebê quando foi encontrada na porta da capela. Nunca descobriram sua origem. Mesmo depois de anos, não conseguiram catequizar seu espírito silencioso e amaldiçoaram sua existência. Só as chamas poderiam destruir sua alma para que as crianças voltassem a nascer na aldeia.
O que lhe era pior? Ser consumida pelas chamas ou ser devorada por algum animal selvagem?
Eram longas horas da noite e ela olhou para o alto num pedido de súplica. Uma coruja a observava. O seu corpo cansado, o frio penetrando seus ossos. O barulho da floresta parecia ensurdecedor.
Zaen caiu imóvel sobre um animal ferido, retirou o pano que cobria sua cabeça e deixou-se saciar pelo sangue que emergia quente do coração daquele ser selvagem.
E a noite tornou-se dia!
Alguns passos e estava diante do abismo. As águas batiam furiosas sobre as pedras esverdeadas. Em segundos, uma multidão cercou aquele corpo debilitado. Gritavam para que não olhassem nos seus olhos. Tamanho medo assolava aquelas pessoas! Ninguém jamais sobreviveu uma noite na floresta.
Embora nua e retalhada pelos galhos secos e pelo frio, uma força tornava seu olhar ainda mais desafiador. Num voo rasante, a coruja posou no seu ombro!
Aquela gente sem fé jogou as tochas sobre as folhas secas. As imensas chamas trepidavam rubras rumo ao céu. Parecia o fim. Mas fim de quem? E sobre o abismo de pedras e águas, Zaen jogou-se, transformando-se na mais linda de todas as águias do mundo!
Muitos séculos se passaram desde então. E o espírito de Zaen continua naquela floresta. A aldeia foi destruída pelo fogo que veio do céu através de um raio. No local, apenas uma clareira, onde, todos os anos se reúnem as “irmãs” de Zaen!
Denia Dutra - 2001