AS TRÊS PREGAÇÕES

Luciana Carrero

Era uma vez, ou melhor, foi bem aí que aconteceu o caso, nas duas meias-noites, quando as bruxas assombraram duas vezes, por repetição do horário de verão. Adentravam, então, os três reis magos trazendo ouro, incenso e mirra, para o menino que nascia. As vaquinhas de presépio olhavam-se, umas para outras, e mudas falavam coisas que ninguém entendia. Um corisco cruzou a noite e foi dito de estrela de belém, porque tinha um sino pendurado no rabo, para anunciar a chegada do filhote de deus. José, o carpinteiro, envernizava os pés do berço improvisado, para dar maior brilho e homenagear a vinda do pequenino. Enquanto Maria embalava, Mercedes, bens lembrava, para esquecer o estábulo, onde nascia o rei dos reis. Mas a noite estava fria e Maria pedia mantos para enrolar o menino. E foi aí que deu-se o fato. Nenhum rei mago tirou seu manto para cobrir o infante. Voltando ao começo do relato, na primeira

meia- noite do horário de verão, chegou uma bruxa operosa e, com sua vassoura, varreu toda a sujeira do ambiente. Até quis botar as vacas para fora, mas o menino pediu: deixai virem a mim as vaquinhas, porque delas é o reino do bafo que me aquece. Todos ficaram quietos. Uma hora depois, os relógios foram atrasados e a nova meia-noite surgiu. Outra bruxa veio para ajudar; e ao menino cobriu com seu manto negro de má sorte. Assim vaticinou: Cuidem bem desse menino para que não morra na cruz. Depois de tudo passado, José não parava de pensar no sortilégio da segunda bruxa. Resolveu mandar o filho, aos treze anos, para estudar no Himalaia, onde os sábios do Tibet ensinavam filosofias boas de vida; e este estaria a salvo de qualquer crucificação. Mas Pandira voltou sábio, cheio de ideias, aos trinta anos, dizendo chamar-se Jesus. Seu pai pregava madeiras. Jesus, pregava revelações. Por precaução, os poderosos pregaram o sábio na cruz.