Em um jardim

Ela cantava baixinho, uma cantiga de ninar, parecia que queria fazer o filho dormir. Alguns não entendiam, mas nada falavam, era uma cena triste demais para ter alguma lógica.

Mas a noite iria chegar rápido e tiveram que interromper aquele momento, o problema é que ninguém tinha coragem de tirar aquele momento dela. As lágrimas continuavam a correr por sua face e ela beijou o corpo morto em seus braços. Levantou a cabeça bem devagar e os olhou.

Eles viram o sangue de seu filho em seus lábios, ela então consentiu com a cabeça. João e Maria Madelena chegaram perto dela. Enquanto Madalena chorava, ainda limpando o sangue dos pés de Jesus com seus longos cabelos, João falou com Maria.

- Maria... Mãe...

Ela esboçou um sorriso e ele continuou a falar.

- Temos que levá-lo.

Maria consentiu com a cabeça e José de Arimateia se aproximou.

- Eu mandei talhar em uma rocha um túmulo para mim, mas eu o cederei ao Senhor...

- Não podemos pagar... - Disse Madalena chorando.

- Mas eu também era um discípulo como vocês, eu o seguia, não de forma pública, mas... Eu O seguia. Eu O amava... Então quero fazer isso por Ele.

Maria de novo esboçou um sorriso e José continuou a falar.

- É aqui perto... Em um jardim.

- Jardim? Mas em um jardim? Não em um cemitério?

- Sim Maria Madalena, é um jardim. - Respondeu José de Arimateia.

Maria com os olhos ainda lacrimejando olhou para Madalena e essa se calou.

Então os homens o tomaram nos braços, o enrolaram em linhos e o levaram.

Maria foi seguindo atrás, em silêncio acompanhada por Madalena e outras mulheres. Todas em lágrimas silenciosas.

Depois que o depositaram, chegaram os romanos. José logo foi apresentando o documento dado pelo próprio Pilatos, pensando que iam impedir o sepultamento.

- Não viemos impedir nenhum sepultamento, apenas estamos aqui para garantir que o túmulo esteja lacrado.

Ninguém falou nada, pois contra o poder de Roma, naquela hora, não podiam fazer nada. Ficaram todos parados lá, vendo os soldados rolarem uma enorme pedra, lacrando assim a porta do sepulcro.

Maria se afastou e permaneceu sentada em um banco do jardim, quieta, calada, mas agora estava serena. Madalena e as outras mulheres ainda estavam entorpecidas pela dor e choravam, algumas chegando ainda a gritar, como se aquela dor pudesse ser arrancada de dentro de si pelos gritos e lágrimas.

João então se assentou ao lado de Maria e perguntou:

- Está tudo bem mãe?

Ela sorriu e disse:

- Viu onde o sepultaram João?

- Em um túmulo dos ricos não é? Ele viveu entre os pobres, para os pobres... E acabou num túmulo rico.

- Não é isso meu querido.

- É o que então mãe?

- É um jardim João... É um jardim...

João não entendeu, mas não quis falar nada. Apenas apoiou a cabeça no ombro de Maria, mas pouco depois começou a anoitecer e todos tiveram que sair... Mas Maria foi a única a entender o sinal de Deus. O jardim... Ali foi depositada a semente, ali haverá vida daqui a pouco tempo. E ela sorriu, um sorriso de esperança e olhou novamente para o jardim.