O Labirinto de espelhos.
 
 
Entediado e invariavelmente portador de pouquíssimas palavras, deixou a mesa à qual bebia uma cerveja em reunião com seus poucos amigos e rumou, em passos lentos, até o toalete.
 
Havia muito, tudo o enfastiava, desde a mesmice da vida jovem ao marasmo do cotidiano adulto. Verdade é que desejara, até os seus quarenta anos, ser outro homem: gregário, acessível, folgazão, enfim, sociável. Os amigos não reclamavam outra sua atitude, embora esse apaziguamento não o tranquilizasse. Em vias desse estado melancólico, era um homem soturno.
 
Empurrou as lâminas da portinhola de acesso ao lavatório e sequer ouviu o ranger, atrás de si, das abas que procuravam o seu estado de inércia. E entrou.
 
De imediato, não conseguiu assimilar, em sã consciência, a inexplicável quantidade de espelhos que se reproduziam indefinidamente pelas paredes, o que resultava em uma sucessão interminável de seu reflexo, quer à sua frente ou aos lados.  De qualquer modo, a primeira e impactante impressão fora, sem dúvida, a de ver-se perdido no miolo de um fantasmagórico labirinto.
 
Contudo, o que mais o aterrorizou levando-o ao limite com a loucura foi o haver notado, tomado de quase incurável espanto, que o seu reflexo naqueles inusitados e infinitos espelhos não caracterizava, como fosse de esperar, a sua fisionomia. No lugar e em cada um deles havia outro homem. E não apenas isto, mas, em cada reflexo, um homem diferente...
 
Por quanto tempo manteve-se estático, no interior do toalete, não se soube. O estado catatônico que é impingido ao ser humano, em situações de extremo terror, leva o homem a cronologias desconhecidas pela ciência, e mesmo quando de seu retorno, à vida real, a vítima é já uma presa fácil na malha do esquecimento.
 
Ao deixar aquele extraordinário recinto, retornou à mesa onde ainda se encontravam os seus amigos e ocupou a cadeira vaga.
 
Dizem, até hoje, não saber-se explicar o paradeiro do homem que deixara a sua cerveja sobre a mesa e se dirigira ao toalete para jamais voltar. Da mesma forma, o que levara aquele sujeito estranho sentar-se em uma cadeira reservada a poucos amigos, ainda que por mais jurasse esse homem, como tivesse de fato jurado por toda a vida, que os conhecia desde a juventude...