BUSCA DA VERDADE

Quase três anos se passaram. Nelcyr não tira da cabeça o pensamento repetido, como o girar de uma roda, sem início e sem fim. As mesmas palavras e os mesmos procedimentos. Isso já dura 3 anos. Faz planos incríveis que só a sua mente é capaz de tornar real. Pensa em um título, estampado nos jornais exagerando a sua atitude perante o seu ato de vingança. Pensa naqueles momentos que passara dentro da casa da sua ex mulher.

Casa que também era sua e que ela com se apossara, tornando-se única dona, não lhe destinando a parte que legal e moralmente lhe cabia. Ali em pé diante dela que dormia e nem sonhava com o que estava prestes a lhe acontecer.

A garganta cortada, o sangue jorrando aos borbotões e aquela ânsia para respirar. Nesse momento já não era mais uma pessoa. Já não era mais a arrogante Daniela, agora, simplesmente, um corpo inanimado totalmente ensanguentado. Sozinha estava, sozinha morreu, aos seus pés, sem esboçar uma reação. Nem o terror em seu rosto, ele foi capaz de presenciar, uma vez que não teve paciência para acordá-la, antes de cortar-lhe o pescoço.

Pensava na reação de sua vítima, caso ela tivesse sido acordada antes de ser degolada, certamente pediria clemência e choraria. Pensava ele que talvez movido pela emoção não teria coragem de ouvir suas súplicas. Deixaria que ela sobrevivesse, sacrificando-se sozinho, pois já havia executado três pessoas, portanto não lhe restou escolha.

Três anos e aquela maldita cena de morte não mais o deixava. Não lembrava muito bem dos acontecimentos nem pode conferir a notícia nos jornais, pois deprimido isolou-se do mundo e dos acontecimentos, além da depressão o medo de saber o que realmente acontecera, mas imaginava as manchetes que não lhe saia da cabeça, mesmo não as tendo visto. No fundo era pura imaginação. Nada de concreto ele tinha para lembrar. Mas sua mente construía tudo em detalhes, como havia acontecido. Até as manchetes, mesmo não a vendo vinha à sua mente com uma surpreendente nitidez.

Mas, tem um instante de lucidez e respira aliviado, por saber que no fundo tudo isso pode não passar de alucinações. Quase três anos naquela aflição, esperando a polícia o identificar e prender, para finalmente pagar pelo seu crime. Pensava que assim pudesse ter paz, mas lhe faltava a coragem para se entregar. Tudo isso tinha que ter um desfecho, seja o que for, pensava ele, terá que acontecer um dia.

As circunstâncias em que se deram os fatos causaram em Nelcyr um trauma que o fez desenvolver um tipo de desequilíbrio mental.

Entre psiquiatras e psicólogos e uma série de medicamentos que não traziam resultados, sua saúde mental agravou-se. Esteve internado em uma clínica para recuperação de doentes mentais, tentou se matar, mas com a interferência da família, que motivada pela sua condição psicológica. Após longos tratamentos com terapeutas que promoviam diversas técnicas de análises, começou a melhorar. A solidão não lhe causava mais nenhum distúrbio, assim como a sensação de medo e perseguição que sofria.

Antes de retornar para a sua cidade de origem, Nelcyr, vivenciou situação pouco comum deixando-o, além de traumatizado, mais confuso do que já estava. Esses acontecimentos despertaram nele o desejo de encarar com maior intensidade o seu tratamento, buscando meios de desvendar o mistério que havia tomado conta da sua existência. Não podia mais viver naquela incerteza. Sem compreender direito o que se passara, estava, agora, procurando a ajuda de especialistas.

Havia planejado uma vingança, pois Daniela, sua ex esposa, a qual, por motivos ignorados, tomou uma série de atitudes, atrapalhando a sua vida, causando-lhe mais estragos do que já havia feito durante a convivência a dois. Parecia uma forte campanha de difamação, assim como algumas outras já promovidas por ela anteriormente.

Manifestações de repúdio injustificadas, pois sempre pautou sua conduta no casamento dentro do padrão da regularidade, podendo ser considerado um marido exemplar, honrado de bons costumes, fiel, companheiro e dedicado a toda a família. Entendia ele que essa rejeição estava sendo promovida por puro ódio, despeito e vingança causados pela decisão de Nelcyr de querer a separação. Provocações, entre outros tipos de atitudes levadas a efeito por ressentimentos.

Declarava, Daniela, ter sido Nelcyr o pior homem que ela já havia conhecido e que suas atitudes deixaram muito a desejar. Como marido era um fracasso. Todas essas declarações foram motivadas por inveja e por vingança.

Nelcyr havia optado pela separação, quando desanimou de tentar um relacionamento verdadeiro, sem subterfúgios, mas Daniela insistia em promover o desentendimento, humilhando e desfazendo de seu marido, atitude impensada e muito inoportuna, já que só poderia levá-lo a uma atitude como a que tomou.

Esse comportamento dela era muito prejudicial para a imagem de Nelcyr que acabou perdendo credibilidade entre amigos, conhecidos e clientes, deixando-o em um estado muito constrangedor e deprimente.

Sofrendo muito, desenvolveu um certo tipo de trauma que afetou a sua saúde mental.

Após um longo planejamento, em um momento muito conturbado da sua existência, ele planejou e executou uma vingança de consequências extremas. Segundo o que consta, revelado por ele próprio, houve uma chacina. Dizimou toda a família num ato de grande confusão mental, revolta e desequilíbrio. Após a imaginada chacina, volta para a sua casa, onde se esconde de tudo e todos. Não recebia ninguém, permaneceu longo período sem se alimentar adequadamente, pensando seriamente em se matar.

Desenvolveu uma forte crise de pânico que o fazia ficar trancado, com cadeados nas janelas e escoras nas portas de sua casa. Não ousava sair à rua em hipótese nenhuma. Só após alguns dias começou a receber uma pessoa da família, que levava alimentação para ele.

Segundo consta, lá permaneceu confinado meses e não tinha nenhuma notícia externa.

Quando recebeu alta, lembrou do ato que havia praticado e abateu-se, novamente, pela depressão aguda e isolou-se de tudo, durante muito tempo.

Sempre na mesma casa, confinado e com medo de tudo, a depressão tomou conta de Nelcyr.

Enfim, após muitos meses, recebendo a visita de um filho e de outra pessoa que o ajudava, resolveu que tinha que sair de dentro de casa e começar a caminhar e ver movimento. Ficou um bom tempo praticando exercícios e alimentando-se normalmente.

Certo dia um fato estranho e curioso lhe aconteceu. Em uma das caminhadas, ao atravessar uma rua, foi atropelado por um carro dirigido por uma mulher. Esta o socorreu, levando-o ao hospital mais próximo. Lá foi atendido, mas uma coisa o intrigou. A pessoa que o havia atropelado era a sua vítima e ex esposa ou então se parecia muito com ela.

Muito confuso, chegou a confidenciar ao médico que o atendia que aquela mulher parecia com uma que havia morrido há mais de ano. A reação do médico tentando acalmá-lo, dizendo que podia ser outra pessoa, pois não seria possível que um fantasma o houvesse atropelado. Assim, Nelcyr deixou de pensar, pois tinha medo de que pudesse despertar alguma suspeita que o deixaria em uma situação complicada. Imaginou que se insistisse que a mulher estava morta, poderia ser transferido para um hospital psiquiátrico, o que era a última coisa que esperava que lhe acontecesse, após aquele misterioso atropelamento.

Não desejando que nenhuma suspeita recaísse sobre ele, desistiu e concordou com o médico de plantão, dizendo:

- Acho que o Senhor tem razão, um fantasma não pode atropelar ninguém. Além disso é apenas uma pessoa parecida não é possível afirmar que seja ela, já se passaram anos e já nem me lembro bem de sua fisionomia.

Após o atendimento, a atropeladora o levou de volta para casa e coincidentemente, foi nesta ocasião que ele teria retornado para a sua antiga cidade.

Os seus pensamentos, sempre voltados para o ocorrido, não o deixava em paz. Não conseguia entender como alguém que viu morrer aparecer, atropelá-lo e fazer questão de socorrê-lo, inclusive reconhecendo-o e chamando-o pelo nome.

Ficou aquela dúvida inquietante. O que de fato poderia ter acontecido?

Teria os assassinatos sido imaginação de sua mente doente ou após meses ter encontrado o espírito da sua vítima que fazia questão de aparecer para ele, para perturbá-lo mais ou simplesmente não deixar que se recuperasse da doença mental?

O planejamento daqueles assassinatos, a sua execução, fase por fase, foram reais?

Poderia ter sido a mente de Nelcyr capaz de construir toda aquela trama dando-lhe a impressão de concretizado, sem que na realidade ele o tivesse feito?

Uma mente doente é capaz de imaginar coisas incríveis, mas todos os detalhes que não saía da memória de Nelcyr, poderiam ser sito uma alucinação? Um delírio provocado pelo seu estado emocional, enquanto enfrentava aquelas dificuldades com o seu desequilíbrio mental e sua depressão aguda?

Foram anos com aquelas imagens gravadas em sua memória que o fizeram tomar a iniciativa, mesmo contra a vontade de seus parentes, de investigar, para descobrir e desvendar esse mistério que o consumia.

Isso, na verdade, fazia parte da sua terapia. Procurar encontrar a verdade, para então saber e tentar compreender o que teria havido.

Naturalmente não foi um processo simples. Ele ficou meses na dúvida, com esse pensamento incomodando até que tomou a decisão de concluir a investigação.

Começou investigando pela internet. Procurava por todos os títulos nos sites de busca, títulos como: crimes bárbaros; chacinas, tragédias e todos os recursos que imaginava, buscava, mas não encontrava nada que fizesse referência ao que imaginou.

Procurou em site de revistas especializadas, jornais da época que eram mantidos à disposição para consultas, entre outros tipos de pesquisas que seja possível imaginar.

Enquanto isso, não interrompeu seu tratamento. Conversou muito com o seu terapeuta e até este chegou à essa conclusão: Enquanto esse mistério não estivesse definitivamente desvendado, sua cura ficaria com aquela pendência, não se completando, pois sua mente por mais sadia que estivesse, não deixava de pensar naquela ocorrência que lhe trazia a dúvida cruel.

Até que ponto a nossa mente seria capaz de tomar o controle de nossos atos, de fazer, ou imaginar, ter feito coisas que deixariam dúvidas?

Por sugestão do psicólogo, imaginou recorrer à ajuda de algum amigo antigo que pudesse fazer uma pesquisa mais detalhada para ele. Mas como ele mesmo admitiu, não tinha nenhum amigo naquela cidade e também não tinha uma pessoa que fosse capaz de se dispor a desenvolver uma empreitada tão minuciosa que pudesse trazer-lhe tanta dedicação e trabalho.

Não havia outra opção, senão voltar ao local do crime e verificar com seus próprios recursos o que poderia ter acontecido.

Para isso, seria indispensável traçar um plano para proporcionar à sua investigação uma discrição que não se revelasse ou incriminasse, caso houvesse algum acontecimento concreto. Uma vez tendo havido o crime, não poderia ele estar fazendo perguntas e pesquisando sem levantar alguma suspeita.

Uma vez que não houvesse passado de imaginação, tinha receio de ser mal interpretado. Esses fatos eram, realmente, uma situação constrangedora e até perigosa.

Qualquer hipótese o assustava. Se esteve doente, mentalmente, naquele período a ponto de imaginar com a riqueza de detalhes uma operação de assassinato, como poderia confiar, daí em diante em si próprio ou em suas atitudes. Despertava nele o medo de si próprio.

Se tivesse sido consumado, o assassinato, naturalmente ele estava ainda sobre investigação e qualquer que fosse seu interesse levantaria suspeitas. Nesse caso se responsabilizaria? Teria condição de se apresentar à polícia e fazer uma confissão, mesmo exigindo um exame apurado de sua insanidade, o que seria uma hipótese difícil de ser apurada com exatidão pelo tempo decorrido do fato e a sua condição atual.

Portanto, antes de decidir, ele teria que pensar com muita segurança qual seria sua atitude diante do resultado de sua investigação.

Qualquer resultado lhe traria prejuízos que seria danoso ou talvez pudesse lhe devolver a certeza de estar completamente curado.

Mas como ter a certeza de que alguém que enfrentara uma situação tão delicada como aquela pudesse voltar ao normal, independente do que viesse a descobrir em suas investigações.

Dúvidas de toda natureza tornava a vida de Nelcyr um inferno. Quando imaginava curado da sua insanidade surge essa questão que o coloca em xeque. Como sair bem de uma situação como essa?

Segundo seu terapeuta, deveria haver, antes um período de preparação, com exame detalhado de todas as possibilidades. Para que o próprio paciente pudesse tomar uma decisão acertada, que não lhe trouxesse nenhuma outra enfermidade e tivesse que partir do ponto zero, mais uma vez.

Nelcyr, então inicia, mentalmente, seu retorno ao local da ocorrência, na esperança de reproduzir em sua mente os fatos que o atormentavam.

Examinava, detalhadamente, cada possibilidade, tentando lembrar cada detalhe minuciosamente.

Seu terapeuta, foi uma espécie de parceiro e ao mesmo tempo um coautor na trama, para tentar ajudar ao seu paciente tornar-se firme na hora de decidir o mais apropriado para ele.

Eram milhares de perguntas, com tantos detalhes que Nelcyr já havia apagado de sua mente e, de novo, tentava reproduzir, mentalmente, cada um daqueles pequenos detalhes.

Por que o misterioso atropelamento promove o encontro dos dois? Mero acaso?

Ao afirmar, convictamente, ter estado presente em seu enterro. Isso é um fato também questionável. Houve a despedida o choro, o beijo de despedida, a descrição do caixão sendo coberto com terra. Por que ele teria chorado tanto a sua morte se não tivesse a certeza de vê-la dentro daquele caixão sendo enterrada?

Nenhuma de suas dúvidas podem ser resolvidas e ele não tem certeza de nada não há a menor convicção de ter realizado o que imaginava.

Por que, após atropelá-lo, sua suposta vítima fez questão de levá-lo ao hospital, permanecer ao seu lado e depois transportá-lo de volta à sua casa? Por que não lhe perguntou mais nada se havia mais de ano que não se viam, supondo-se que não tinham notícias um do outro, o natural seriam algumas perguntas e nenhum dos dois se interessou por esses questionamentos. Ela própria não demonstrou interesse nem mesmo qualquer indício de conhecer a situação e de como vivia Nelcyr. Nada comentou nada quis saber sobre ele durante todo esse tempo.

Não teve mais notícias dela. Não a viu mais em lugar nenhum.

E se tudo aconteceu e ele viu um fantasma?

Será que o fato de ter retornado a sua cidade prejudicou a possibilidade de saber notícias dela?

Mas ele não procurou saber se ela estava viva ou morta.

Afinal a matou? Será que, realmente, a viu ser enterrada? O atropelamento aconteceu?

Estranho. Muito estranho esse comportamento e ainda muito mais os fatos na ordem que ocorreram.

Planejamentos que são reais. Dias de pesquisas de campanas, ingresso em sua casa, as mortes. Como explicar tudo isso?

Esteve ele, temporariamente louco e imaginando todo o acontecimento? Ou estava, definitivamente, louco e agora se recuperando?

Se tiver vontade esclarecer e buscar notícias, terá que retornar à cena do crime, assim como fazem todos os criminosos, mesmo que ele, sem saber não seja um.

Questiona Nelcyr: Como conseguirei responder a tantas perguntas se eu não consigo me lembrar de nada que de fato aconteceu? Só sobraram as dúvidas, mas eu devo me esforçar para respondê-las, pois não estou louco e, certamente, procurando em algum lugar as respostas surgirão de alguma forma.

Se estou disposto a descobrir, tenho que começar a investigar de alguma forma, pensou ele.

Deixei muito tempo passar, com a intenção de esquecer, de não sofrer, mas agora isso vai acontecer se buscar a verdade ou não.

Será que nunca terá fim?

Cheio de perguntas e receios, parte Nelcyr rumo ao local do, até então, suposto crime, com a finalidade de responder a todas elas.

Foram dias percorrendo as imediações em busca de esclarecimentos. Uma discreta e despretensiosa pergunta a um, uma menção a suposto crime nas proximidades e nada. Ninguém tinha ouvido qualquer comentário a respeito.

A cada resposta que recebia mais aliviado e com coragem se sentia.

Munido dessa coragem, passou em frente à casa onde ocorrera o crime, mas não viu ninguém. Já começava a se preocupar com a falta das respostas que tanto buscava, quando, repentinamente, uma pessoa abre o portão e sai para a rua. Estava um pouco distante, para identificar a pessoa, mas a seguiu, mesmo à distância e a viu entrar em um comércio. Não desejando ser identificado, procurou uma posição discreta e ficou esperando que essa pessoa retornasse.

Uma emoção muito forte se apossou de Nelcyr, quando identificou a pessoa como sendo uma de suas vítimas. Ou seja: suposta vítima.

Eufórico, voltou para a pousada, onde havia se hospedado com a certeza de que não havia assassinado aquela pessoa. Começou a fortalecer sua crença de que não teria havido crime nenhum. Essa era a segunda pessoa que imaginava haver assassinado que via andando normalmente pela rua. A sua ex mulher que o atropelara e seu filho, esse que via agora.

A necessidade de confirmação o encorajou a se expor mais. Assim as possibilidades de encontrar a sua principal vítima poderia ser maior.

No dia seguinte, muito cedo já estava de plantão nas proximidades da casa, esperando mais algum sinal de outras pessoas. Mais uma vez abriu-se o portão e desta vez sai um carro com duas pessoas. Não foi possível reconhecer, pois além do vidro ser escuro, a distância em nada ajudou.

À noite, viu, novamente o carro voltando. Esses acontecimentos o deixaram mais eufórico e já não lhe restava dúvida de que as pessoas estavam vivas.

No dia seguinte, no mesmo horário do anterior, foi para a esquina e ficou a observar e esperar a saída do carro. Desta vez havia contratado um táxi, que ficaria ali aguardando o misterioso carro passar para segui-lo.

Novamente o portão abriu e do interior da residência sai o mesmo carro, que ao passar por ele foi seguido. Foi uma longa corrida até que o carro perseguido parou na beira da calçada e de lá saiu um casal que começou a retirar alguns objetos do porta malas. Convencido de que ali seria o destino final do misterioso carro, dispensou o táxi e ficou observando.

Tratava-se de um casão de artesãos que transportaram e organizavam sua mercadoria para expô-la aos possíveis compradores.

Aproximou-se um pouco, mas não reconheceu ninguém. A mulher usava umas saias compridas e o homem com um lenço amarrado na cabeça, não parecia conhecido de Nelcyr.

Aproximou-se bem mais e seu coração disparou. A mulher era ela. Agora tinha certeza. Um pouco diferente pelas roupas desalinhadas e aparentemente muito surradas, contando, agora, com mais idade, cabelos mal cuidados, deixando aparecer as raízes brancas, unhas sujas e, também descuidadas, mas não havia dúvida. Era ela.

Nelcyr, um pouco tonto pela emoção, sentou-se no meio fio e respirando fundo, tentava acalmar-se. Quando se viu recuperado e encorajado pela sua descoberta, aproximou-se e começou a examinar as peças, sem se interessar pelos vendedores. Perguntou o preço e foi ela que veio atender. Olho no olho, vendedor e comprador e a revelação:

Daniela levou tanto susto quanto ele.

- Você? Há quanto tempo não o vejo. Ele respondeu:

- É você! Pois é. Passaram-se alguns anos.

- Ouvi dizer que tinha ido embora.

- Realmente eu fui. Estou passeando e revendo lugares e coisas. Você me parece muito bem.

- Que bom ver você, respondeu ela.

Que alívio, pensou ele. Ela está viva. Tudo está esclarecido. Nada mais tenho que temer.

Volta-se para ela e diz:

- Foi bom encontrar você. Desejo-lhe sorte.

- Foi bom para mim também, responde ela. Boa sorte.

Volta, então, Nelcyr, sentindo-se um novo homem, com a certeza de estar definitivamente curado.