O Operário e o Agregado
                                                                   Patativa do Assaré

Sou matuto do Nordeste,
Criado dentro da mata.
Caboclo cabra da peste,
Poeta cabeça-chata.
Por ser poeta roceiro,
Eu sempre fui companheiro
Da dor, da mágoa e do pranto.
Por isso, por minha vez,
Vou falar para vocês
O que é que eu sou e o que eu canto:

Sou poeta agricultor,
Do interior do Ceará.
A desdita, o pranto e a dor,
Canto aqui e canto acolá.
Sou amigo do operário
Que ganha um pobre salário,
E do mendigo indigente.
E canto com emoção
O meu querido sertão
E a vida de sua gente.

Procurando resolver
Um espinhoso problema,
Eu procuro defender,
No meu modesto poema,
Que a santa verdade encerra,
Os camponeses sem terá
Que os céus desse Brasil cobre,
E as famílias da cidade
Que sofrem necessidade,
Morando no bairro pobre.

Vão no mesmo itinerário,
Sofrendo a mesma opressão.
Na cidade, o operário;
E o camponês, no sertão.
Embora, um do outro ausente,
O que um sente, o outro sente.
Se queimam na mesma brasa
E vivem na mesma guerra:
Os agregados, sem terra;
E os operários, sem casa.

Operário da cidade,
Se você sofre bastante,
A mesma necessidade
Sofre o seu irmão distante.
Sem direito de carteira,
Levando vida grosseira,
Seu fracasso continua.
É grande martírio aquele
A sua sorte é a dele
E a sorte dele é a sua!

Disso, eu já vivo ciente:
Se, na cidade, o operário
Trabalha constantemente
Por um pequeno salário,
Lá no campo, o agregado
Se encontra subordinado
Sob o jugo do patrão,
Padecendo vida amarga,
Tal qual o burro de carga,
Debaixo da sujeição.

Camponeses, meus irmãos,
E operários da cidade,
É preciso dar as mãos
E gritar por liberdade.
Em favor de cada um,
Formar um corpo comum,
Operário e camponês!
Pois, só com essa aliança,
A estrela da bonança
Brilhará para vocês!

Uns com os outros se entendendo,
Esclarecendo as razões.
E todos, juntos, fazendo
Suas reivindicações!
Por uma Democracia
De direito e garantia
Lutando, de mais a mais!
São estes os belos planos,
Pois, nos Direitos Humanos,
Nós todos somos iguais!


 ***


Patativa do Assaré,
85 Anos de Luz e Poesia.


Autores: Geraldo Amâncio, Ivanildo Vilanova, Oliveira de Panelas e Otacílio Batista.


Mote:

Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!



Fenômeno do Ceará,
Da Cultura, chama viva,
O vulgo de Patativa,
Nun canto de sabiá!
A idade, o tempo dá,
Hora, mês, semana e dia
O poema, ele é quem cria,
Com emoção e vontade.
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


Ninguém pode se igualar
Ao genial Patativa,
A maior expressão viva
Da Cultura Popular.
Devia, em todo lugar,
Ter sua fotografia
Como honra e cortesia,
Seu busto em toda cidade.
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


O sol abriu os proscênios,
Louvando o grande poeta,
Que, felizmente, completa
Seus oito e meio decênios.
Na galeria dos gênios,
Tem foto e biografia,
Caminho, ramal e guia
De justiça e liberdade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


“Triste Partida” ainda está
Sendo a maior obra sua,
Disse ao poeta da rua:
“Cante lá que eu canto cá”.
“Vaca Estrela e Boi Fubá”
Tudo é de sua autoria.
Enquanto Nanã morria,
Viu, da fome, a crueldade.
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


Ex-cantador, violeiro,
E glosador ainda é,
Não é só do Assaré,
Que hoje é do mundo inteiro.
Casado, sem ter herdeiro,
Pra tanta sabedoria,
Filho nenhum herdaria
Tamanha capacidade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


Sei que o tempo tudo estraga,
Mas ele está preservado.
Por ser imortalizado
Por Fagner e Luiz Gonzaga.
Sua estrela não se apaga,
Não morre a sua energia
Deus é Seu Pai e Seu Guia,
Lhe deu a Imortalidade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


Não sendo proprietário
De ouro, prata nem zinco,
Já rasgou oitenta cinco
Folhinhas num calendário.
Alcançar o Centenário
É a sua fantasia,
Mais livros escreveria,
Mais sonhos, mais novidade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


Escreve, prestando pleito
Ao campônio pobre e triste,
Também descobriu que existe
Prefeitura sem prefeito!
Vê a tragédia do eito,
Clama, grita e denuncia.
Luta contra a hipocrisia
Descaso de autoridade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


Belinha embeleza o ninho
A quem Patativa ama,
Com ela divide a fama,
A idade e o carinho!
Pena Branca e Xavantinho,
Que cantam com maestria,
Regravaram melodia
Da sua propriedade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


O seu verso é sua tenda,
Onde escreve na escala,
Do jeito que o povo fala,
Para que o roceiro entenda!
Anel, diploma, comenda,
Pra ele, não tem valia.
Ele mesmo é a Academia,
A escola e a faculdade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!


A sua escola não é
A mesma de Ariano,
José Lins, Graciliano,
João Cabral, José Condé!
Patativa do Assaré
Não imita, não copia,
Não burla, não parodia,
Tem a própria identidade!
Oitenta cinco de idade,
De luz e de poesia!



Ouça este texto, na íntegra, na Seção "Ádios - Voz"


Fraterno abraço,

                            


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