VELÓRIO DE UM PINGUÇO
Escrito e postado por:
Roberto Ribeiro(Roberto Sales)
Escrito em: 18 / 06 / 2008
Nas brenhas do meu Nordeste
Tem umas estórias sofridas,
Destaco aqui no repente
Conflitos de muitas vidas,
Tentando sobreviver
Nas terras secas e ardidas.
Pois é no sítio mocambo
Que chamarei “Barriguda”,
Eu encontrei um sujeito
Com sua cara papuda,
De tomar pinga com força
Mais uma negra rabuda.
O tira gosto era “língua”!
Por que dinheiro não tinha,
As refeições que tomavam
Era cuscuz de farinha,
Regada à água do pote
Quando das farras ele vinha.
Chegava cambaleando
Topando em ponta de toco,
Um olho roxo azulado
Fruto de tapa e de soco.
O dedo grande sangrando
Pois era grande o sufoco,
Acompanhado da negra
Sua fiel companheira,
Seu nome tenho em sigilo
E nunca faço a besteira,
De me expor no presente
Com coisa bem verdadeira.
Em pouco tempo ele morre
Duma cirrose hepática,
O seu velório um presépio!
Nunca esqueço a temática,
Regada à cana brejeira
Com tripa seca de vaca.
Acompanhando o velório
Muitos bebinhos assistia,
São nomes bem engraçados
Que vindo da freguesia,
Vou relatar alguns nomes
Que o velório assistia.
Genário o cabeça branca
Conhecido por cocada,
Caboclo bem fedorento
Com sua calça rasgada,
Falava alto e cuspia
Depois de uma “lapada”.
José de Zuza outro “pato”
Que no velório estava,
Foi companheiro de pinga
Com muito drama falava,
O nosso amigo se foi!
O outro logo chorava.
Nêgo e Geraldo de Dora
Outra duplinha da pinga,
Ficavam ao lado do corpo
E respirava a catinga,
Que o defunto exalava
Vindo de baixo e de cima.
Garapa, o filho do morto
Pinguço de carterinha,
Trazia cana de graça
E logo enchia a latinha,
Oferecia aos pinguços
Com tripa assada e farinha.
A velha Chica Portela
Velha de barba e bigode,
Passava o dia no mato
Com um cabrito e um bode,
Fedia a “pai de chiqueiro”
Da sua roupa é que sobe.
O velho Antonio Rufino
Que era tio do defunto,
Bebia cana à vontade
E não saia de junto,
Olhava a cara do morto
E não mudava o assunto.
Depois das três da manhã
Muitos pinguços caídos,
O velho Chico sentado
Com pena do ocorrido,
Pois lamentava sozinho
Sentindo um pouco sofrido.
Nêgo irmão de Geraldo
Primo do morto pinguço,
Levou à mão a barriga
Dizendo a coisa ta russo,
Soltou um peido estrondoso
Com um roncar de um urso.
Dona Joaquina Bandeira
Que conviveu com o morto,
Tinha o cabelo assanhado
E seu dedão era torto,
Vítima de uma topada
Na casa do velho Zé Porto.
E o defunto ta lá,
Bem no meinho da sala,
Só escutando as visitas
Por que defunto não fala,
Só esperando o momento
De se levar para a vala.
Segundo a minha historinha
Que retirei do velório,
Contada do jeito que vi
Como dizia Tenório,
Com testemunha e tudo
Que registrei no cartório.
As dez e meia do dia
Hora de o corpo sair,
Levado por uns biriteiros
Bêbado de quase cair,
E o caixão balançava
Fazendo o povo sorrir.
E foi seguindo o cortejo
Acompanhado por muitos,
A velha Chica cantava
A ladainha ao defunto,
Com um corinho afinado
De todos cantando junto.
A caminhada é sofrida
E um sol quente abrasante,
O povo todo cansado
O cemitério distante,
E o defunto é levado
A passos lento e constante.
Grudada a alça direita
Seguia o velho cocada,
Cansado e mal humorado
Pois já sofrera topada,
Deixando o dedão do pé
Com uma unha arrancada.
Mas não desgruda da alça
Nem que lhe paguem dinheiro,
O seu prazer é seguir
Com o seu bom companheiro,
Lembrando as farras que teve
Em um adeus derradeiro.
Vou encerrar por aqui
Depois eu conto o restante,
Como se deu no enterro
Com atropelos constate,
A choradeira foi grande
Um verdadeiro rompante.