A FIANDEIRA

Nas redondezas de Creta
vivia certa família
com conforto e bem seleta,
um fiandeiro e a filha...
Trabalhavam para o rei
e eram muito felizes,
o tempo corria e, sei,
das palavras que já dizes:

"- Seguiam os seus misteres,
não há nada que estranhar,
mas aguarda, se puderes
pra poderes avaliar..."
Prepararam a bagagem
e, com tudo programado,
num barco, fez-se a viagem:
o rei havia chamado.

Atenderam, sem rodeios;
foi assim que eles partiram,
pelos mares, sem receios,
mas tragédias se seguiram.
Uma grande tempestade
provocou naufrágio sério.
Por grande infelicidade
perece o velho e, mistério,

a garota chega, salva
à famosa Alexandria.
Antes da primeira alva,
antes de romper o dia,
um casal de tecelões
achou aquela menina.
Apesar das confusões
superou-se a triste sina.

Foi aceita como filha
pelo casal, vejam só,
mais ainda, maravilha,
desfazendo qualquer nó,
aprende o ofício dos pais,
encontra a felicidade,
pensa que a vida lhe traz,
de novo, oportunidade.

Porém, há nova mudança,
pois eram tempos antigos
e assim a pobre criança
passou por outros perigos.
Sua aldeia é invadida
pelos bárbaros, à espada,
e Fátima, é agredida
e por eles seqüestrada.

Foi transportada ao mercado
como escrava a ser vendida,
mas serralheiro abastado,
envolvido em sua lida,
notou que a menina era
diferente, sentiu pena
e comprou-a, na quimera
de uma vida mais serena

para a sua companheira;
pensou fazê-la criada,
mas a falência se abeira...
Havia sido roubado:
(sua frota e) sua carga,
de mastros para navios
e, de novo a sorte amarga,
trouxe a ela desafios.

Ali na ilha de Java,
começaram nova vida
e Fátima trabalhava
com esforço e destemida.
Como prêmio conquistou
o direito à liberdade;
pouco a pouco, retornou
a sentir felicidade.

Da Índia, longe, distante,
um pedido inusitado,
era uma entrega importante:
à garota é confiado
o encargo de viajar
levando o carregamento.
De novo, sem esperar,
eis que o mar lhe traz tormento.

Lamentando a sua sorte,
a garota assim pensou:
"-Pra mim não existe um norte,
toda vez que bem estou,
minha sorte se revira.
Não consigo ser feliz,
mas embora assim me fira,
inda escapei, por um triz."

E prossegue, vai adiante,
caminhando sem destino
chega a uma aldeia chinesa,
em sua busca constante.
A novidade é que havia
uma história, algo no ar,
uma antiga profecia,
de um dia ali chegar

a mulher que era capaz
de construir uma tenda
para o imperador e, mais
não demorou, a contenda...
Ela logo foi chamada
e, com esforço, trabalha
a garota preparada
pela vida, na batalha,

vencendo a adversidade,
sabia o que precisava,
encontrou sua verdade.
Eis que a corda ela fiava,
como aprendera bem cedo
e tecido resistente
produziu, sem erro ou medo,
trabalhando, bem contente.

Para erguer a tenda, os mastros,
ela soube tornear
e, sob um manto de astros,
escolheu um bom lugar,
para o trabalho final.
O imperador tão feliz,
nunca vira nada igual,
olha pra Fátima e diz:

"-Pede-me o que desejas,
pois cumpriste a profecia,
se alguma coisa almejas,
eu, qualquer outra faria
pra atender o teu desejo!"
"-Só quero viver aqui,
é o que ela lhe diz, sem pejo,
no lugar onde aprendi

que não posso reclamar
das tristezas que vivi.
Sempre há algo pra guardar,
sei, de tudo que sofri.
Em tudo que a vida traz,
há do bom e do ruim."
Se cada um de nós faz
o melhor que pode, ao fim,

descobre a razão de tudo,
dos males por que passamos.
E aqui deixo, sobretudo,
entre os sonhos que sonhamos,
a mensagem de esperança
dessa história que, sim, tem
casamento e aliança;
um final como convém...


Este conto é popular em especial na Grécia, mas lhe atribuem também origem budista e sufi. É relatado com algumas variações, mas essencialmente o conteúdo é o mesmo.