A GUERRA DO PADRE COCO

ESTE CORDEL FOI ELABORADO BASEADO EM UMA HISTÓRIA VERÍDICA OCORRIDA EM UMA VILA DA MINHA CIDADE NATAL, CUPIRA - PERNAMBUCO. ELABOREI-O DEPOIS DE MUITAS PESQUISAS E MUITAS ENTREVISTAS COM PESSOAS DA ÉPOCA, POR ISSO FOI MUITO DIFÍCIL ESCREVÊ-LO. LEIA-O COM CARINHO! OBRIGADO PELA VISITA!

QUE DEUS TE ABENÇOE!

A GUERRA DO “PADRE COCO” NA CIDADE DE CUPIRA

Quando Cupira era Vila

Pertencente a Panelas

Aconteceu uma guerra

Que causou muita novela

Foi em mil e novecentos

E trinta e seis foi a década.

A guerra do “Padre Coco”

Como ficou conhecida

Foi uma revolta armada

Por causa dos comunistas

E do primeiro avião

Que passou lá em Cupira.

Vinte e cinco de janeiro

Começou essa história

No ano de trinta e seis

Quando em uma certa hora

Um trabalhador rural

Adoeceu sem demora.

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JOÃO CÍCERO AMARO

23 anos de idade

Lá do Sítio Serra Verde

Um jovem na mocidade

Do Distrito de Cupira

De Panelas a cidade.

Ficando febricitante

Com uma infecção

Quando por aquelas bandas

Viu o primeiro avião

O João tomou um susto

Que quase caiu no chão.

Com a zoada e o susto

Feitos pelo aeroplano

Seu estado de saúde

Foi cada vez piorando

Ele quase ficou louco

Pirético e delirando.

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Sua mãe que era devota

Do Padre Ciço Romão

Do Juazeiro do Norte

Fez promessas de montão

Para o filho ficar bom

E receber sua benção.

Vendo o filho sem melhoras

Dona China achou por bem

Incutir no filho insano

Uma história do além

Que ele estava possuído

Pelo espírito do bem.

O espírito referido

Era o do Padre Cícero

Por isso seu filho foi

Aconselhar seus amigos

E todos os seus vizinhos

Com frases do “Padim Ciço”.

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Imitando o “Padim Ciço”

João Cícero pregava

Dizendo: -“Meus amiguinhos

Não bebam, não fumem nada

Não joguem, também não pequem

Que Jesus logo te salva”.

Tendo o pai de João Cícero

Profissão de fogueteiro

E sendo muito católico

Era muito noveneiro

Rezava terço e fazia

Promessas o dia inteiro.

Aumentando sua prática

Começou chegar romeiros

Dizendo: -“O João Cícero

Tem alma de curandeiro

E faz bastantes milagres

É o Padre do Juazeiro”.

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Num ambiente inculto

Naquela Zona rural

Cheia de analfabeto

Numa loucura total

O João se transformou

Num vidente emocional.

Já tido como um fanático,

E com problemas psíquicos

Apoiado pelos pais,

Parentes, vizinhos, amigos

Passou a desempenhar

O papel de um grande mito.

O papel de um mito tipo

O Antônio Conselheiro,

Com rezas miraculosas,

Frases feitas e conselhos

E as pessoas inocentes

Tinham fé no boateiro.

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Logo a notícia verbal

Se espalhou na região

Dizendo que João Cícero

Fazia um bom sermão

E que curava os doentes

Com poder da oração.

Proprietários rurais

E pessoas influentes

Começaram a apoiar

Esse fato, e de repente,

Começaram as romarias

Pra casa desse vidente.

Muitas fitas coloridas

Passaram a ser penduradas

No pescoço de João Cícero

E eram seqüenciadas

Com beijos em suas mãos

Pelas graças alcançadas.

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À espera dessas graças

E de curas e milagres

Todos tocavam seu corpo

Em busca dessa bondade

E diziam que o João

Era uma divindade.

O Avô de João Cícero

Era chamado de “Côco”

Sua avó era a “Côca”

E num devaneio louco

Apelidaram o fanático

Pelo nome “PADRE COCO”.

Por isso o João Cícero

Assim foi sendo chamado.

A partir desse apelido:

“Padre Coco”, o fanático;

O fanatismo cresceu,

Se espalhou por todo lado.

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Depois disso o “Padre Coco”

Começou “celebrar missa”,

E receber donativos

Foi grande sua conquista

Recebia oferendas,

E romaria bonita.

Tudo isso motivou

Ele ser denunciado

Pelo Seu Luiz Bernardo,

Que achou que era errado

E aquela profanação

Era um grande desagrado.

Dando continuidade

As suas atividades,

O “Padre Coco" passou

A exigir com vontade

Dos seus fiéis seguidores

O voto de lealdade.

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Exigiu deles também

Que as cabeças raspassem

Pois não permitia que

Seus fiéis participassem

Dos “atos religiosos”

Com os quais se interessassem.

Com os cabelos compridos,

Naquela época, chamado

De “cabelo de cangote”

Ninguém era consagrado

E pelo então “Padre Coco”

Era logo despresado.

O José Martiniano

Inspetor da região

Procurou Cícero Amaro

Do “Padre Coco”, paizão

Pra findar o fanatismo

E também a extorsão.

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Lá no sítio Serra Verde,

Cícero Amaro retrucou

Dizendo: – “Martiniano,

A Deus não tem mais temor?

- Seus olhos são urupembas,

Mas a Deus não enchergou”.

E José Martiniano

Replicou essa ofença

– “Se for para enxergar Deus

Desse jeito, não compensa;

Eu não quero ter mais vista,

Fique aí com sua crença”.

Depois dessa discussão

Um amigo do inspetor

Chamado José Soares

Homem bom e de valor

Pediu a Martiniano,

- Vá embora, por favor.

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Pediu que ele fosse embora

Da casa de Ciço Amaro,

Pois havia muita gente

Ali querendo “pegá-lo”,

Considerado um herege

Todos queriam matá-lo.

Logo o dito inspetor

Contou todos esses fatos

À polícia de Panelas

Que recebeu um recado

Do Seu Coronel Melinho,

Um político afamado.

Coronel Melinho disse

Que era só para tomar

As providências cabíveis

Depois de realizar

O pleito municipal

Pra eleição não estragar.

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Adeptos do “Padre Coco”

Soltaram cem foguetões

Detonaram armas de fogo

Soltaram também balões

Dia 23 de maio

No festejo das missões.

Dois dias logo depois

Dessa grave ocorrência,

Os seguidores do “Padre”

Resolveram em audiência

Tomar à força alguns rifles

Daqueles homens sem crença.

Por fim, chega o “Dia D”:

28 do mês maio

No ano de trinta e seis

O Senhor João Inácio,

Grande amigo e adepto

do “Padre Coco” falado.

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Chega à vila de Cupira,

Conduzindo um bacamarte

Prum ferreiro consertar,

E, diante dessa arte

O povo fica assustado

Com medo de um desastre.

O comissário local

Senhor José Semeão

Prendeu o João Inácio,

Começando a confusão

Tomando-lhe o bacamarte

Que carregava na mão.

Alguns momentos depois,

Chegavam àquela Vila

Dois conhecidos senhores

João Bezerra da Silva

João Daniel de Santana

Declarando à Polícia:

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Que tiveram bacamartes

Tomados por seguidores

Do fanático “Padre Coco”,

Todos loucos brigadores

E que queriam a prisão

Daqueles saqueadores.

Vestindo apenas cueca

O suplente comissário

Do Sítio Gravatá-Açu,

Chega em Cupira cansado,

Seu Abílio Maciel

Disse ter sido assaltado.

Depois desse acontecido

O Sargento Cleodon

Foi relatar ao Juiz

Naquela triste manhã

- Gravatá-Açu tá em pânico,

Tomar providência é bom.

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Dr. Felismino Guedes,

De Panelas, o juiz

Ciente das ocorrências

Não ficou nada feliz

Resolveu pedir ajuda

Isso o povo é quem diz.

Resolveu pedir urgente

Providências ao Governo

Com falsas informações

E bastante exagero

Enviou um telegrama

Contando todo segredo.

Ao solicitar reforço

O juiz se precipita

Dizendo que eram 500

Revoltosos comunistas,

Armados até os dentes

Verdadeiros anarquistas.

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Acontece que no ano

Trinta e cinco tinha havido

A Revolta Comunista

Com mortes e alarido

Três Estados brasileiros

Sofreram com vandalismo.

Antes de qualquer medida

Pelo Governo, tomada

Forças do destacamento

Da Polícia, bem armadas

Foram até o conflito

Resolver essa parada.

Essas forças que vieram

Lá de Lagoa dos Gatos,

De Panelas, de Altinho

Foram para o povoado

Chamado Gravatá-Açu

Onde acontecia o fato.

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Quando a polícia chegou

Foi recebida à bala

Por seguidores do “Padre”

Que o mesmo comandava

Cujo seu maior reduto

Na Capela se encontrava.

Capela São Sebastião

Padroeiro do lugar

Onde aconteceu a guerra

Balas voavam no ar

O povo todo assustado

Não conseguia falar.

Primeira morte ocorrida

Nesse encontro desumano

Foi do Inspetor Antônio

Ferreira de Melo quando

Os soldados o encontraram

Sob a cama se ocultando.

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Ele era um dos adeptos

Do “Padre Coco” citado

Não querendo ou não podendo

Sair de imediato

Para ser apreendido

Soldados o fuzilaram.

Logo após o assassinato

Do inspetor Tonho Ferreira

Os partidários do “Padre”

Saíram em toda carreira

Balearam um Soldado

Foi grande a bagaceira.

O soldado Alonso era

Filho de um Capitão

Chamado José Alvino,

Mais brabo do que o Cão

Por isso que o tiroteio

Se espalhou na região.

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Prosseguiu por toda à tarde

Do dia vinte e oito

Na tarde do mesmo dia,

Chegara um grande reforço

Vindo de Caruaru

Foi grande o alvoroço.

Composto de 25

Soldados bastante armados

Já não encontraram mais

Resistência dos fanáticos,

Os quais já se encontravam

Totalmente dizimados.

Nessa grande confusão

O “Padre Coco” fugira

A Polícia dominou

Os rebeldes e partira

Fazendo a remoção

Dos corpos para Cupira.

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Na guerra do “Padre Coco”

Morreram cinco pessoas:

O JOÃO GOMES DA SILVA

Também JOÃO DE CABOCLA

Morreu JOÃO MARCAÇÃO

Por uma guerra à-toa.

AMARO JÚLIO DELMIRO

Assassinado morreu

JOÃO BATISTA CARLOTA

No combate padeceu

Outros ficaram feridos

Depois que o fim se deu.

João Batista Carlota

Foi morto pela Polícia

No recinto da Capela

Gritando e dando vivas

Para São Sebastião,

Padroeiro lá da vila.

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Por ordens do Comandante

De Polícia ali presente,

O coveiro “Bico de Fogo”,

Sepultou os combatentes

Mortos, numa cova rasa

Em meio a muita gente.

No dia seguinte aos fatos

Da grande rebelião

Chegava lá de Recife,

Um enorme caminhão

Muito cheio de soldados

Com armas e munição.

Quando chegaram ao local

Tudo havia acabado

Os informes eram falsos

Ou muito exagerados,

Pois não eram comunistas

Como fora propagado.

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Se tratavam de uns pobres

Fanáticos religiosos,

Os militares voltaram

Tristes, com muito remorso

Por ver aquela tragédia

Com tantos homens devotos.

Quem seguia o “Padre Coco”

Respondeu preso a processo

Na cadeia de Panelas,

Foi grande o retrocesso

Alguns foram assassinados

Num castigo mais severo.

Outros quando do trajeto

De Cupira a Panelas,

Dizem que foram sangrados

Mas isso é só conversa

Outros adeptos, soltos

Pelo júri das Panelas.

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Segundo Martiliano

Sobrevivente da “Guerra”,

“Padre Coco” (Ciço Amaro),

Fugiu para outra esfera

No Estado de Alagoas

Comprou dois sítios e terras.

Hoje, Gravatá-Açu é

Todo eletrificado,

Possui boas residências

Comércio pra todo lado

Nem parece aquela vila

Do massacre relatado.

Sua histórica Capela

Do mártir São Sebastião

Apresenta ainda marcas

Daquela rebelião

São os buracos de bala

Expostos no seu portão.

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A Vila Gravatá-Açu

Tem um povo muito ordeiro

E também trabalhador,

Não é povo desordeiro

Se você for lá um dia

Comprovará esse enredo.

Dizem que o “Padre Coco”

Ainda hoje está vivo

Foi um grande mulherengo

Teve mais de 30 filhos

Morou com 11 mulheres

Disso, nem mesmo eu duvido.

Atualmente reside

Com três mulheres a seu lado

No Sítio Ubiruçu

Município de Calçado

Mas quem tiver doido o chame

De “Padre Coco” o fanático.

Terminando esse cordel

Deixo aqui o meu conselho

Não brigue por coisa à-toa

Pra evitar exageiro

Pois o homem, meu amigo,

Paga por todos seus erros.