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Pau de Arara
Pompílio Diniz

 
 
Êh, Meus Cumpade, Minhas Cumade, meus cumpanherin, hoje eu tô feliz dimais da conta! É qui num é nem meu aniversáro, e eu já cumecei o dia ganhano um presentão!

Minha Comadre Leda Castro, lá de Espera Feliz, aqui no Istado de Minas Gerais, trouxe pra mim um livro que é uma autêntica raridade! Eu num  sei como ela  conseguiu esse livro, que eu procuro há muitos anos, sem encontrar.
 
Nada mais nada menos do que um exemplar autografado do livro Mané Gonçalo, do poeta paraibano Pompílio Diniz, que foi lançado em 1949, pela Editora Itatiaia! Uma verdadeira preciosidade, para qualquer pesquisador ou colecionador!
 
Minha Comade, muito obrigado!
 
E desse livro, que é recheado de poemas belíssimos, na sua simplicidade cabocla, eu escolhi o poema “Pau-de-Arara”, que eu vou declamar, dedicando a declamação à Minha Comadre Leda, pela gentileza do presente!
 
Antão, procês tudo, e especialmente pra Minha Comadre, o poema Pau de Arara de autoria de Pompílio Diniz,


Lá vem vindo os pau-de-arara
Num caminhão Fê-Nê-Mê
Desses, que, quando para,
Suspira pra gente vê!
Lá vem vindo os pau-de-arara,
E o só, bateno na cara,
Fazeno os póbe sofrê.
 
Fê-Nê-Mê é caminhão
Das Fábrica Nacioná
De Motô, qui dá insprusão
E custa muntho a pegá.
Fê-Nê-Mê tem nome inzato,
É Fome no Norte é Mato,
Assim diz o pessoá!
 
Vem todo mundo lá drento,
Uns de cóca, ôtos de pé,
Naquela farta de assento,
Se arrume lá quem pudé!
A gente tem impressão
Qui o peste do caminhão
Virô barca de Noé!
 
Suó, catinga, puêra,
Fadiga, fome, cansaço,
Dô de cabeça, tontêra,
Molêza e dô no ispinhaço!
Tudo isso o cabra sente,
No meio daquela gente,
Além dos ôto imbaraço!
 
É quando grita um de lá:
- Qui farta de inducação!
Tu num pudia isperá
Qui parasse o caminhão?
Apelando pra saúde,
Diz o ôto: - Fiz o qui pude,
Mar num hôve jeito não!
 
As istrada?... É uma disgraça,
Só tem buraco e disvio!
Quando passa o caminhão
Pu riba dos catabio,
Quem tá lá dent dá pinote,
Qui inté parece os caçote,
Na ribancêra do rio!
 
Isso, porém, num é nada
Pus cabôco do Sertão!
As istrada insburacada,
As farta de inducação,
Nada disso se cumpara
Cum o sofrê dos pau-de-arara,
Quando quebra o caminhão!
 
Intonce, grita o chofé:
- Muitha atenção, pessoá!
In riba fica as mulé,
Os home tem qui apiá!
O caminhão trôxe ocêis,
Agora, chegô a vêiz
De nóis tomém li levá!
 
E vamicê num imagina
O qui é um caminhão
Quebrado nas travessia
Das istrada do Sertão!
É cansaço, sêde, fome,
E o home qui num fô home
Num arrizéste, nhôr, não!
 
E assim chêga os pau-de-arara,
Impurrano um Fê-Nê-Mê!
O só, bateno na cara,
Fazeno os póbe sofrê!
Coitado dos pau-de-arara,
A sorte nunca lhe ampara,
Nem os Guvêrno lis vê!
 
Eitha! Essa era a dura realidade dos retirantes nordestinos daquela época. Isso, quando eles vinham de pau-de-arara! Porque tinha muitos que vinha mesmo é de a-pé!
 
Eu quero mandar o meu abraço carinhoso, sincero, fraterno e respeitoso para Minha Comadre Leda Castro e também pro  esposo dela, o Meu Compadre Flávio, lá em Espera Feliz!

Olha  que nome  bonito de cidade: Espera Feliz! Pois é!...

Um abração procês, muito obrigado pelo presente, que eu vou guardar a vida inteira, e ainda vou deixar pra alguém, se Deus quiser!
 
E procês, fica o meu convite de sempre: amanhã, cês vorta! Mas vorta mês, porque amanhã... tem mais!


 

 
Fraterno abraço,
Compadre Lemos.

Próximo Causo:
Compadre Lemos
Enviado por Compadre Lemos em 21/10/2011
Reeditado em 02/11/2011
Código do texto: T3290355
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