Dom Juan do sertão

Vendo ao preço que comprei

Este causo que escutei

Hoje à tarde no boteco.

História de Nhá Jorgina

Mulher de todo ladina

Casada com sô Maneco.

Sô Maneco cabra arretado

De feitio desmesurado

Com fama de matadô.

Na verdade um bonachão

Mas das rusgas do sertão

A sua fama ficô.

Segundo quem me contô,

Na cidade tinha um doutô

De pouco tempo na praça.

Com fama de Dom Juan

Não deixava pra amanhã

Ganhava as mulhé na raça.

Dr. Dom Juan, o terrível,

Se orgulhava do seu nível,

Não conhecia o ditado

Que roda por estes monte:

Pote tanto vai à fonte

Que um dia volta quebrado.

Pra encurtar o enredo

Quebrou-se o pote e foi cedo,

Do doutô da medicina.

E um dia sem mais tardar

Ele cismou de engraçar

Com a honesta Nhá Jorgina.

Ele disse assim pra ela:

Como pode ser tão bela

Uma simples aldeã?

Sei que um dia vai ser minha,

Pois anda atrás de galinha

Este galo Dom Juan.

Ela respondeu na hora:

_Então há de ser agora

Que Maneco não está

Te espero hoje à noitinha

Vai saber o que é galinha

Quando lá em casa chegá.

O doutô era otimista,

Não perdia uma conquista,

Duas vezes não pensou.

E antes do sol entrar,

Com medo de se atrasar

Na casa humilde chegou.

Foi pisando de mansinho,

Ajeitou o colarinho

E bateu palmas no portão.

Mas quando este se abriu

Foi com surpresa que viu

Maneco estendendo a mão.

_ Seu Doutô, mas que alegria!

A que devo a regalia

De ter em casa tal visita?

E, pra dentro: _ Nhá Jorgina,

É o Doutô da Medicina

Que está aqui, vê se acredita.

Ela veio. Sorriso puro,

Ver o médico em apuro

Assustado e suarento

E a mão grande do Maneco

No ombro do seu jaleco

O empurrando para dentro.

_Eu havia me esquecido,

Seu Doutô, do seu pedido.

Que cabeça esta minha!

_Não há de ver, meu marido,

Que o Doutô tá resolvido

A comprar nossas galinha?

E o melhor eu nem te falo

Quer a todas e até ao galo

Tanta sorte eu nem mereço.

Se a proposta ele sustenta

Vai levar mais de duzentas

E paga o dobro do preço.

E foi assim que o doutor

Se tornou um criador

Começando seu plantel

E a fama do Maneco

Continua no boteco

Já virou até cordel.

Carlinhos Colé
Enviado por Carlinhos Colé em 29/12/2011
Reeditado em 29/12/2011
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