A ESTRADA MAL ASSOMBRADA - UMA LENDA BRASILEIRA

Nem todo mundo acredita

Em alma ou assombração

Dizem que história de espírito

É só imaginação,

Mas vou contar um enredo

Que me arrepiou de medo

Dessa minha narração.

Um chofer de caminhão

Do tipo muito afamado

Desses que nada pra ele

Lhe deixava enrascado

Era um cabra destemido

Só andava prevenido

Temendo ser assaltado.

Andava sempre isolado

Nunca quis um ajudante

Só vivia viajando

Não parava um só instante

Sabia muito segredo

Mas de nada tinha medo

Quando estava no volante.

Certo dia o viajante

Passando uma travessia

O carro deu um defeito

No cabo da bateria

Fazendo o sinal da cruz

Ele disse, - Oh, meu Jesus,

Se ao menos fosse dia!

O carro se debatia

Sem ter força no motor

Era soltando pipoco

Sujo no carburador

Ele engatou a primeira

Porém no pé da ladeira

O carro velho estancou.

Quando o caminhão parou

A uma da madrugada

Nessa famosa ladeira

Que era mal assombrada

Era um local escondido

Onde já tinha morrido

Muita gente de virada.

Estórias de alma penada

De movimento bizarro

Caveiras se requebrando

Outras fumando cigarro

Eram causos que existia

Quem uma dessas coisas via

Metia a cara no barro.

O chofer desceu do carro

E levantou o capuz

Soprou no carburador

Buliu nos cabos de luz

Mas não achava o defeito

E um carro desse jeito

Carga nenhuma conduz.

Chamou logo por Jesus

Na hora que foi lembrando

Que daqueles cafundós

O povo vive falando

E fixou em sua mente:

- Não tenho medo de gente,

Quanto mais de alma penando!

Enquanto estava pensando

Um rapaz lhe apareceu

E foi logo perguntando:

- O que foi que aconteceu?

- Carro velho é que nem moça,

Faltou luz e faltou força.

O chofer lhe respondeu.

O rapaz lhe disse: - Eu

Quero também pelejar,

A dez anos sou mecânico

E pretendo lhe ajudar

Vou usar meus artifícios,

Se não for muito difícil

Eu desenrasco jajá.

Mexeu pra lá e pra cá

Do ofício fazendo jus

Abriu o radiador

Alguma coisa introduz

As mãos brancas como cera

Que era ver mão de caveira

Mostrando seus ossos nus.

Fechou e abriu o capuz

Deu um sopro no motor

Buliu nos fios da luz

Depois tirou o rotor

E deu uns dois solavancos,

Quando ele deu no arranco

O carro funcionou.

O chofer lhe perguntou:

- Para onde o senhor vai?

«Eu vou cortando camim

Que vou fazendo um atai,

Antes de raiá o dia

Quero estar na companhia

De mamãe e de papai.»

O chofer, - pois vai,

Pegue aí na direção

Já venho muito cansado

Estou sem disposição

Pelo que eu já dei fé

Parece que você é

Bom chofer de caminhão.

O outro pega a direção

E começa dirigindo

Motorista pouco a pouco

Um arrepio foi sentindo

O carro em toda embalada

E nas curvas da estrada

Parecia estar sumindo.

O carro ia zunindo

Chofer já desconfiava

O rapaz muito sisudo

Nem pro motorista olhava

Continuava em disparada,

Quanto mais ruim a estrada

Mais a carreira aumentava.

Motorista reclamava

Sem o rapaz perceber

O outro grita: - Rapaz

Não queira se aborrecer,

Este carro está cansado,

Você tem o pé pesado

E gosta muito de correr!

Por isso peço a voce

Com um pedido de amigo,

Maneire mais o seu pé

Que aqui não tem inimigo,

Se coce continuar

O carro vai se quebrar

E é maior nosso castigo.

O rapaz: disse: «Amigo,

Eu já fui chofer ativo

Dei uma grande virada

Hoje sou um fugitivo.

Por brincadeira eu virava

E carreira grande eu dava

No tempo que eu era vivo.»

Disse isso e deu um silvo

O chofer estremeceu

Deu um pequeno desmaio

Nem viu o que aconteceu,

E aquela alma reinante

Naquele mesmo instante

Dali desapareceu.

Quando o dia amanheceu

Se foi o claro da lua

Chofer descobriu que estava

Com a pele seminua

Na boléia desmaiado

E o carro estacionado

Bem no aceiro da rua.

Até hoje continua

Viajando nas estradas

Mas só viaja de dia

Não duvida mais de nada

Nunca mais ele fez hora

Quando alguém lhe conta estória

De espirito e alma penada.

SÉRIE LENDAS BRASILEIRAS - VOLUME 35

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 11/02/2012
Reeditado em 20/11/2022
Código do texto: T3493756
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