O Sertão sem inverno * Autor Damião Metamorfose.

*

Para os que são da terrinha

E àqueles que não são.

Eu faço mais um Cordel

Real e com emoção...

Convido o caro leitor

Pra lê e ver o terror

Que é a seca no Sertão...

*

Acordar sem ver a chão

Molhado e a água empoçada.

O mato todo morrendo

Por não ter terra molhada.

E o pasto a bem nem nasceu

Com o calor do sol morreu

Junto com ele, a boiada!

*

A terra ainda ondulada

Das marcas de um arado.

De um trator que passou

Arando o ano passado.

E os animais que restaram

Comem os restos que sobraram

Do capim espezinhado!

*

Falta leite, morre o gado,

Não tem poço e nem girino.

Seca a barragem e o açude

Com o vento e o sol a pino.

Sofre os animais e a gente,

Jovem, adulto, inocente,

Com esse triste destino!

*

Todo o solo nordestino

Dessa vez foi afetado.

Pela malvada da seca

Não sobrou nenhum Estado.

Do jeito que vai, não brinco,

Vai murchar folha de zinco

E o solo ficar rachado!

*

Sertão seco ou ressecado,

Pra muitos é o recomeço.

Tem gente que vende a casa

E muda de endereço.

Já os mais exploradores

Aproveitam-se das dores

E aumenta tudo o que é preço!

*

Feijão morrendo é o começo,

Milho secando o pendão.

Arroz já nem plantam mais

Porque vem do Maranhão.

Mas dessa vez não vem nada

A seca foi declarada

Em todo o nosso Sertão...

*

Grilo canta o seu bordão

Escondido atrás de uma porta.

Na caatinga a cigarra

Cantava, mas está morta.

E o camponês tanto olhou

Para as nuvens que ficou

Com a sua coluna torta!

*

Na seca ninguém suporta,

A tristeza é geral.

Sofre-se de fome e sede

E o desemprego é brutal.

O homem ainda resiste,

Já com os animais é triste,

Morrem urrando no curral!

*

O sol ardente infernal

Castigando gente e gado...

Dá quarenta graus na sobra,

Cinquenta ou mais no serrado.

O que não se movimenta

Ma hora que o sol esquenta

Morre tudo esturricado!

*

O oportunista avisado

Quando é seca no Sertão.

Compra tudo que é vazante

Planta o sorgo pra ração.

Quando é na hora do corte

Vende pela hora da morte

Sem dó da situação!

*

Sem chuva e sem condição

De encher açude e barragem...

Tem lugar que está tão seco

Que nem cresceu a pastagem.

Sem chuva o suficiente,

Sofre a mata, o bicho, a gente...

E a morte pede passagem!

*

Nordeste mesmo em estiagem

Tem um subsolo rico.

Petróleo, minério e água...

E a água do velho Chico.

Mas a tal transposição

É pra outra geração

Acho que num é pro meu bico!

*

Vejo tudo e triste eu fico

Com o céu azul cinzento

Com a fumaça do fogo

Poluindo o firmamento.

Solo limpo, sol vermelho

Límpido igual um espelho,

Cheiro de morte no vento!

*

A seca traz sofrimento

Para o povo do lugar.

O alimento é tão caro

Que ninguém pode comprar.

Sem as frentes de emergência,

Vai ser grande a inadimplência

Só Deus pode nos salvar!

*

Janeiro sem trovejar,

Sem relâmpago em Fevereiro,

Março, Abril e Maio secos

Junho e Julho nem o cheiro...

É seca no meu Sertão,

Peste, miséria, inflação...

No Nordeste brasileiro!

*

Sol mata até formigueiro

Sem sombra para ficar.

Não escapa nem a sombra

De quem se aventurar

Ficar muito tempo exposto...

Mas no inverno dá gosto

Ir pra roça trabalhar!

*

Sem chuva para molhar

A terra e mudar o clima.

A semente não germina

Com a terra seca encima.

Quando germina não cresce,

Quando cresce não floresce...

Morre a planta e a alta estima!

*

Sem a chuva esquenta o clima,

Sem água não tem fartura.

A cana vira capim,

Morre e não dá rapadura.

O Nordeste sem inverno

Esquenta, parece o inferno,

O clima é uma brasa pura!

*

Conheço o que é a secura

De uma seca e nesse teste.

Pois sou um sobrevivente

De uma que foi a peste.

Setenta que já fez bodas...

Mas essa é a maior de todas,

Porque é em todo o Nordeste!

*

O céu de cinza se veste,

A roça no abandono.

A caatinga esturricada,

Março com clima de outono.

E um cachorro abandonado

Magro, feio, arrepiado

Ainda espera o seu dono!

*

O céu parece um carbono

Com poucas nuvens espaças.

Quando ameaça chover

Fica só nas ameaças.

As frutas que tem são pecas

E a mata com folhas secas

Não esconde as poucas caças!

*

É das piores desgraças

A falta de um bom inverno.

As nuvens mudam de cor,

A mata muda de terno.

E o calor exagerado

Deixa tudo esturricado,

A seca é o pior inferno!

*

Só mesmo o pai eterno

E a santa mãe natureza.

Podem fazer algo que

Evite essa malvadeza.

Que é ver o gado morrendo

E a raça humana sofrendo

Sem ter água e o pão na mesa...

*

A seca traz a incerteza

E a fome assola o Sertão.

Pois seca o reservatório,

Rio, cacimba e cacimbão...

O sol já nasce aquecido

E o solo acaba exaurido

Sem vida e sem compaixão...

*

Falta milho, arroz, feijão,

Óleo, sabão, sal e alho...

Falta de tudo em casa,

Lá fora falta trabalho.

Mas as contas que aparecem

Não diminuem, só crescem,

Como pagar sem cascalho?

*

Sem inverno tudo é falho

Falta tudo sem chover.

Falta animo, falta a força

E a vontade de viver.

Na seca o clima é pesado,

O calmo fica estressado

Por não ter o que comer!

*

Seca o poço de beber

E da cisterna também.

Quem crê em Deus chora e reza,

Com os olhos fixos no além.

Pedindo a Deus pai eterno

Pra mandar um bom inverno

Já para o ano que vem...

*

Além de tudo inda tem

Cadáver em todo o lugar.

A caatinga sem ter sombra

Pra um “cibito” descansar.

O roceiro se amargura,

Por ver que de agricultura

Não dá mais pra escapar!

*

As aves tendem a migrar

Por não ter mais alimento

Voam para bem distante

Pra se livrar do tormento.

O homem não pode ir...

Fica e é o jeito sentir

Cheiro de morte no vento!

*

Falo do meu sofrimento

E de outros que vi passar.

Vi seca quando criança,

Jovem, e posso afirmar

Guardo-as na mente e de cor

Sei que essa vai ser pior

Num todo e vai piorar...

*

E a promessa de irrigar,

Foi promessa e nada mais.

Que iludiu meus avôs,

Meus bisavôs e meus pais,

Eu também já me iludi,

Só que depois descobri,

“São armas eleitorais”!

*

Nordeste sofre demais

Com a ausência do inverno.

Mas não se entrega a tristeza

Nem blasfemam o pai eterno.

Por isso é que o nosso povo,

Tanto faz o velho ou novo

Tem humor e é fraterno!

*

Sem inverno é um inferno,

Mas com relâmpago e trovão.

Sou feliz igual criança

Quando a chuva molha o chão.

Chuva à noite, sol ao dia,

Essa é a boa parceria

Para a boa “plantação”

*

Quando eu vejo o Sertão

Sem o verde da caatinga.

Vestindo o cinza da seca

Que mata até a restinga.

Fico pensativo e triste

Por que onde ela persiste

Nem o mandacaru vinga!

*

Com estiagem o homem xinga

Mas há possibilidade

De uma boa colheita

Mesmo com a dificuldade.

Mas com seca declarada

A barra fica pesada

E o estado é, calamidade!

*

A seca traz castidade

Pra qualquer espécie viva.

Vaqueiro perde o emprego,

Sem ganho fica a deriva.

E o patrão perde o seu gado

Perde a roça e o empregado...

Com a seca destrutiva!

*

A seca é pejorativa

Deixa tudo decadente.

Em tudo tem escassez

Não tem cristão que aguente.

E além da fome e o calor

Tem agiota e explorador

Pra sugar o mais carente!

*

Peço ao Deus onipotente

Que para o ano que vem

Ele mande um bom inverno,

Nos próximos anos também.

Com fartura pra essa gente...

Bom inverno, não enchente

E que os anjos digam: amém!

*

Fim.

Damião Metamorfose
Enviado por Damião Metamorfose em 27/06/2012
Código do texto: T3748115
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