Ôh peste, essa Conceição!

Minha gente não se engane

Com a reza de Conceição

Essa mulher tá na rua

Me acusando sem razão

Cuidado que essa é daquelas

Que faz suco de mazelas

Pra acabar com o cidadão

Aguentei tudo que pude

Era tortura. Alcatraz!

Essa jagunça zambeta

Dilacerou minha paz

Fez meu peito em picadinho

E agora digo e é certinho:

Esse besta?... Nunca mais!!

Ôxe que fiquei foi tempo

Iludido e com razão

Porque essa gota, essa peste

Mente mais que o cramunhão

Que político safado,

Que cornudo conformado

Que advogado e ladrão

E fui assim me envolvendo

Me enganando com a leveza

Sem perceber que o veneno

Tava no mel da beleza

Quando vi, já era tarde

Estava pronto pro abate

Servido mesmo à francesa

Ela era uma margarida

Quando avistei distraído

Era assim tão prestativa

Tão meiga e de olhar sofrido

E eu que não perco tempo

Mas sou pior que jumento

Não percebi o perigo

Quando menos esperei

Tava de terno e gravata

Cum sorriso mêi insosso

Comprando galinha e vaca

Trabalhando condenado

Dia e noite no serrado

Sem perceber a burrada

Ela só no salto e jóia

No salão de Dona Bete

Na garupa de Riobaldo

Mais parecia um chiclete

E quando eu perguntava

Me mentia a condenada:

- O pobre tem diabetes!

-Está tão doente o bichinho

Precisando de cuidado

A mãe do moço morreu

Ele está desconsolado

Homi, abra o coração

Mostre ser um bom cristão

Deixe eu cuidar do coitado!

Outra coisa era de praxe

E me tirava do sério

Era o tanto de dinheiro

Para pagar o necrotério

Todo mês era um parente

Que ela enterrava, a serpente

Sem pisar no cemitério

Passava a noite todinha

Velando o suposto morto

Só chegava no outro dia

Cansada, era só desgosto

E eu num via ninguém

Sequer pra dizer amém

Pra fazer subir o corpo

E nessa história ditada

Na rede que não se apressa

O que era tudo pra mim

Pra ela era fim de festa

E quanto mais se fazia

Ainda mais se pedia

Se contentar? Nem com reza!

Era uma angustia danada

E aos poucos fui me inquietando

Com os pés já calejados

Eu seguia trabalhando

Mas dela, que só sugava,

Não se ouvia um obrigada

Nem mesmo assim, sussurrando

Aí, um dia eu me arretei

Botei as cartas na mesa

Tirei as botas dos pés

Decidi ser realeza

Fiz questão de ser tratado

Que nem bode premiado

Vôte!! Foi uma beleza!

Passava o dia todinho

Me balançando na rede

Pedia era muita água

Que se vingar dá é sede!

Almoçava era ali mesmo

A vida passava a esmo

E eu no chamado: no... “-Quêde?”

Agora eu que dava as ordens:

- Corre ali! Cuida acolá!

Tira o leite na Mimosa!

Chega aqui pra me coçar!

Era tanta a serventia

Que perguntei certo dia

- O céu mudou-se pra cá?

Mas a danada, assustada

Com medo da arrumação

Não demorou foi nadinha

Pra por o pé no estradão

Deixou até travesseiro

Correu foi logo, ligeiro

Não acenou nem com a mão

Foi pelo punho da rede

Que vi toda a macacada

E enquanto ela corria

Eu dava era gargalhada

Era riso atrás de riso

E aí, zombava comigo:

- Nem trouxe minha limonada?!

-Já vai é tarde, esse traste!

E agradeci ao Senhor

Depois puxei um assento

Chamei cumpadi Canô

E assim num bom proseado

Nós fomos jogar buraco

Festejando com licor

- Fim -