CIDADÃO SEM PÁTRIA.

Venho através do cordel,

Trazer o meu desabafo,

De uma vida miserável,

Vivendo engolindo sapo,

Cansado das burocracias,

Que vejo todos os dias,

Como grande desacato.

Sou trabalhador honrado,

E sustento essa nação,

Trabalho de sol a sol,

Em precárias condição,

Tenho trabalho informal,

Nas praças vendo jornal,

Pra granjear o meu pão.

De que adianta honras,

Se falta a dignidade,

Se o meu único direito,

É me calar na verdade,

Além do pobre viver mal,

Se reclamar leva pau,

Onde está a liberdade?

Sou quase analfabeto,

Não tive oportunidade,

Esmero-me no trabalho,

Desde a menor idade,

E o meu jeito acanhado,

E um tanto mal trajado,

Devido às desigualdades.

Aprendi assinar o nome,

Graças a um professor,

Que pra ensinar-me a ler,

Algum tempo dedicou,

E os primeiros rabiscos,

Foi com muito sacrifício,

Mas alguns dias levou.

Eu já tinha trinta anos,

Quando entrei na escola,

No meu tempo de garoto,

Nem aprendi jogar bola,

Vida de cão na infância,

E não me sai da lembrança,

Por esse mundão a fora.

Ainda pequeno menino,

Quando fui abandonado,

A viver peregrinando,

Por esse mundo jogado,

Não tinha noite e nem dia,

Por toda aquela freguesia,

Todos viam meu estado.

Um filho de Pernambuco,

Matuto por natureza,

Criado com leite de cabras,

O mais forte com certeza,

Que o caboclo nordestino,

Usa pra dar a seus meninos,

Que tomam que é uma beleza.

Viemos para são Paulo,

Num famoso pau de arara,

Assim nossa família inteira,

Só com a coragem e a cara,

Vim menino do agreste,

Do meu amado nordeste,

Morar em Araraquara.

Num barraco bem simples,

Morando naquela cidade,

Uma dupla de pivetes,

Com tamanha crueldade,

Por míseros trinta reais,

Matou mamãe e papai,

Terrível fatalidade.

Escapei por um milagre,

Embaixo da cama escondido,

Nunca me sai da lembrança,

Ver meu pai e mãe feridos,

Com oito anos de idade,

Nos subúrbios da cidade,

Fiquei como um cão perdido.

Levaram pro hospital,

Os meus únicos parentes,

Então nunca mais os vi,

Tudo ficou diferente,

Depois soube da noticia,

Que pela própria polícia,

Sepultados por indigentes.

Ai eu enfrentei a vida,

Morando pelas calçadas,

Dormindo pelo relento,

Comendo sobras deixadas,

As ruas eram o meu lar,

Serviam pra me abrigar,

Construções abandonadas.

Logo não demorou muito,

Para a droga me achar,

Pelos becos escondido,

Vivendo a me camuflar,

Nas ruas perambulando,

A um e outro mendigando,

No vício a me acabar.

Lá se foi minha saúde,

Pelos vícios consumida,

E aquele negro robusto,

Ficou magro igual lombriga,

Até que um belo dia,

Uma caridosa família,

Passou a me dar comida.

Passaram-se alguns anos,

Hoje estou recuperado,

Sou um cidadão sem pátria,

Por esse mundo jogado,

Porém o que mais me dói,

Uma dor que me corrói,

É ter vida de um favelado.

Fico aqui me perguntando,

Onde estão as autoridades,

Que vivem em condomínios,

Cheios de comodidades,

Que não nos dão o direito,

Nem o devido respeito,

Vendo tais calamidades.

Vejo aqui tantas crianças,

Que deviam está na escola,

Metido com os traficantes,

E outra pedindo esmolas,

E suas mães desiludidas,

Choram como desvalidas,

E seus filhos mundo a fora.

Já estou velho inválido,

Vivo apenas de lembranças,

Mas peço as autoridades,

A lutarem pelas crianças,

Pois são elas meus irmãos,

O futuro dessa nação,

A nossa única esperanças.

Cosme B Araujo.

26/05/2013.

CBPOESIAS
Enviado por CBPOESIAS em 27/05/2013
Reeditado em 29/05/2013
Código do texto: T4311311
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