O ELEITOR QUE VOTOU POR UM PAR DE BOTAS

(Cícero Manoel)

Neste cordel vou contar

Pra toda a população,

O que chegou se passar

Num tempo de eleição.

Na cidade dos maus tratos

Surgiram dois candidatos

Brigando pelo poder,

Mentindo e enganando

Pelas ruas abraçando

Quem não tinha o que comer.

Os candidatos, leitor,

Vou descrevê-los fiel.

Um se chamava Doutor

E o outro Coronel.

Nessa eleição pra prefeito

Compraram voto de eito

Até por quinze reais.

Deram telha, dentadura,

Pano pra fazer costura,

Pote e botijão de gás.

Na Rua do Cururu

Morava Mané Pilão,

Natural de Mundaú,

Um honesto cidadão.

Esposo de Mariquinha,

Pai da moça Terezinha

De quinze anos de idade.

Um homem muito decente,

Trabalhava de servente

Naquela humilde cidade.

A eleição caminhava

Numa bagunça do Cão,

Mané indeciso estava

Com um mês de eleição,

Mas o tempo foi passando

Depois Mané foi gostando

Do que o Doutor dizia,

Esse certo candidato

Falava tudo exato

Do jeito que ele queria.

Um dia Mané falou:

— Ele é o meu prefeito!

Seu adesivo botou

Colado em cima do peito,

Passou a ir animado

Nos comícios do danado

Se fazendo de palhaço,

Dele só ganhou então,

Somente aperto de mão

Tapa nas costas e abraço.

Mané um dia saiu,

Foi com o Doutor falar.

Pediu-lhe um par de botas

Pra no dia a dia usar.

O candidato pensou

E no momento falou

Sentado numa cadeira:

— Olhe, meu grande amigo,

Venha aqui falar comigo

Na próxima Quarta-feira!

Na Quarta-feira animado

Mané foi lhe procurar,

E na casa do danado

Lhe esperou pra conversar.

Mas lhe disse uma mulher:

— Amigo o que você quer?

O candidato saiu!

O pobre se retirou,

No outro dia voltou

E a mesma coisa ouviu.

Na casa do candidato

Mané Pilão não foi mais,

O adesivo no mato

Jogou e disse: — Caifás!

Condenado! Beste fera!

Perdeu meu voto “Misera”!

Covarde! Filho do Cão!

No bater de uma pestana

Chegou então a semana

Do dia da eleição.

Mané alisava um gato

Na sua porta sentado,

Quando o outro candidato

Apareceu animado.

A sua mão apertou,

Na casa dele entrou,

Bebeu café e sorriu.

Depois em um reservado

O par de botas sonhado

Mané então lhe pediu.

O candidato falou:

— Eu vou lhe dar companheiro!

Um assistente chamou,

Mandou ele ir ligeiro

Até a Loja Pelotas

Comprar logo o par de botas

Pra dar a Mané Pilão.

Quinze minutos nem deu

E o moço apareceu

Com o par de botas na mão.

Mané Pilão animado

Pegou as botas calçou

Lhe disse: — Muito obrigado!

Meu voto o senhor ganhou!

O candidato então,

Pegou-lhe outra vez na mão

Cheio de felicidade,

E chegou a lhe dizer:

— Vote em mim que eu vou fazer

Muito por essa cidade.

No dia da votação

Mané Pilão se acordou,

Cheio de satisfação

As botas logo calçou,

Na Escola Dom Rafael

Confirmou no Coronel

Com prazer dentro do peito.

Quando veio o resultado

O Doutor foi derrotado

E o Coronel foi eleito.

Mané Pilão ao saber

Deu um pulo de alegria,

E disse cheio de prazer

Pra velha Dona Maria:

— Sei que não votei errado,

Ele é um homem honrado

E muito vai trabalhar!

Com prazer eu votei nele,

Tenho certeza que ele

O povo vai ajudar!

Um dia a sua casinha

Mané pegou reformar,

E o cimento não tinha,

Pois precisava comprar.

Aí falou satisfeito:

— Vou falar com o prefeito

Faço isso num momento!

Ligeiro o procurou

E quando o encontrou

Pediu então o cimento.

Sínico como o Capeta

O homem chegou falar:

— Mané a coisa está preta

Não posso lhe ajudar.

Quando as botas eu lhe dei

O seu voto eu comprei

Naquela ocasião.

Posso lhe dar o cimento,

Mas só em outro momento,

Na próxima eleição.

Pra casa Mané voltou

Xingando o condenado,

Em casa as botas queimou

Com raiva do desgraçado.

Na mão do peste comeu,

Por quatro anos sofreu

Sem saúde e educação.

Por coisas materiais

Seu voto não trocou mais

E aprendeu a lição.

(Santana do Mundaú-AL, 4 de março de 2016)

Cícero Manoel (Cordelista)
Enviado por Cícero Manoel (Cordelista) em 17/04/2019
Código do texto: T6625609
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2019. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.