Ao Deus desconhecido

Há um Deus desconhecido

Nisso é fácil acreditar

Não precisa ser sabido

E nem muito pesquisar

Não é ter sexto sentido

É coragem pra pensar.

Nenhum Deus que eu conheço

Foi capaz de esclarecer

Se eu tenho o que mereço

Por que tanto padecer?

Se dinheiro eu ofereço

Vou pro céu sem merecer.

Se eu furto um simples pão

Já virei um condenado

Mas se furto um avião

Pra levar algo furtado

Sou honrado cidadão

Não posso ser processado.

Na igreja eu sou olhado

Como sendo um fariseu

A ninguém sou vinculado

Mas desejam o que é meu

Em geral sou explorando

Por pastor, padre e ateu.

Sou deveras cabeçudo

Não entendo a pregação

Entro quieto e saiu mudo

Sem fazer indagação

Se eu quero saber tudo

Alguém diz ser tentação.

Se eu peço ao orador

Pra dar uma explicação

De modo provocador

Ele faz demonstração

Diz que sou agitador

Meu lugar é no portão.

Se eu peço pra orar

Num momento de alegria

Logo alguém vem me falar

Pra não fazer anarquia

E se não me comportar

Será o último dia.

Se precisar de ajuda

E alguém for procurar

Pra que eu não desiluda

Dizem pra eu ir orar

Entretanto nada muda

A tendência é piorar.

Se eu prego a minha fé

Dizem que fiz algo errado

Quando não frequento a Sé

Dizem que sou desviado

Ninguém pode orar de pé

Eu não posso orar sentado.

A mulher do meu vizinho

Diz que sou um depravado

Só porque falei baixinho

Talvez no momento errado

Eu falei no meu cantinho:

É um bando de tapados.

Pra fazer alguma prece

O elogio é uma regra

Mesmo se ninguém conhece

Homem santo é o que prega

Se o elogio esquece

É ao Senhor que renega.

Na saída da igreja

Há sorrisos e abraços

Porém sem que ninguém veja

Ali há muitos fracassos

Sempre há um que deseja

Desatar antigos laços.

Nos retiros programados

Há modelos de condutas

Muitos vão interessados

Em vencer antigas lutas

São antigos namorados

Que perderam as disputas.

Nos encontros de casais

Que acontecem normalmente

É comum ver alguns pais

Sorrindo alegremente

Fingem ser casais normais

Mas no lar são combatentes.

O meu Deus desconhecido

Não precisa de favores

Mesmo não compreendido

Dispensa festa e louvores

Não é Deus pra ser comido

Também não provoca dores.

É um deus que não conheço

Entretanto eu acredito

Dele vem o que mereço

Mesmo sufocando o grito

Nesse Deus eu reconheço

O meu eu no seu conflito.

Não é Deus imaginário

E não é de carne e osso

Foge ao confessionário

Não está em sal insosso

Não está em campanário

Ou estátua de colosso.

Ele é Deus, somente isso,

Nada mais há pra dizer

Vou cuidar do meu serviço

Para ter como viver

E honrando o compromisso

Vê-lo-ei quando morrer.

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 19/04/2019
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